Encontro entre Jill Biden e Olena Zelenska durante guerra retrata papel político das primeiras-damas
Mulheres costumam exercer funções de 'cuidadoras', mas nem sempre são figuras secundárias nos governos dos maridos
Internacional|Letícia Sepúlveda, do R7
O encontro entre a primeira-dama dos Estados Unidos, Jill Biden, com a primeira-dama da Ucrânia, Olena Zelenska, no último domingo (8), gerou uma grande repercussão em um momento em que o mundo voltou seus olhos para a guerra na Ucrânia.
Com sua visita, Jill Biden ressaltou o papel político e diplomático que as primeiras-damas podem exercer para além da figura de “cuidadora”, com a persistência de trabalhos sociais.
As duas se encontraram em uma escola na cidade de Uzhhorod, próxima à fronteira com a Eslováquia, onde muitas famílias procuraram abrigo após o início da invasão russa. Jill Biden presenteou Olena Zelenska com um buquê de flores e aproveitou a ocasião para reforçar o apoio dos Estados Unidos ao povo ucraniano.
A professora Clarissa Forner, do departamento de Relações Internacionais da Universidade São Judas Tadeu, aponta que o conceito de “maternidade” foi colocado como um vínculo que aproximou as duas primeiras-damas, assim como suas respectivas nações.
“Acho bastante significativo que a visita tenha sido realizada durante o Dia das Mães, e que, além de visitar campos de refugiados, os pronunciamentos da Jill Biden tenham reforçado a solidariedade, justamente, em relação às mães ucranianas.”
“Essa questão da maternidade foi articulada como um ativo político e diplomático, usado como forma de construção da ideia de aproximação entre as nações”, conclui.
Apesar do significado político da visita e como consequência do papel materno ressaltado, os estereótipos de gênero, que historicamente acompanham as primeiras-damas, estiveram presentes na ocasião.
As mulheres mais uma vez foram associadas ao modelo exemplar de mãe, esposa e cuidadora do lar, nos vários contextos que a palavra exerce, além de estarem à frente de causas sociais e humanitárias.
As mulheres são associadas ao modelo exemplar de mãe, esposa e cuidadora do lar, nos vários contextos que a palavra exerce, além de estarem à frente de causas sociais e humanitárias que fazem parte do governo de seus maridos.
O conceito primeira-dama
Assim como todas as mulheres, as primeiras-damas estão expostas às pressões estéticas. Muitas vezes espera-se que uma primeira-dama atenda aos padrões de beleza e é comum que seus corpos sejam objetificados.
A aparência da esposa assume um papel importante para a imagem da família tradicional que pode ser um ponto positivo para o marido candidato.
“No caso dos Estados Unidos, principalmente a partir de Jackie Kennedy (1961-1963), houve ainda a adição de uma faceta não declarada que aproxima as primeiras-damas de celebridades, particularmente no que se refere às questões de estilo de vida, moda e estética”, afirma Forner.
Entre as primeiras-damas, a americana Eleanor Roosevelt conseguiu quebrar muitos estereótipos de gênero para alcançar uma grande participação política. Ela foi uma grande defensora dos direitos humanos, continuou sua carreira como a primeira mulher a representar os EUA na ONU e fez parte da elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Hillary Clinton gerenciou grandes projetos durante o governo do marido Bill Clinton e em 2016 foi a primeira mulher a se candidatar por um dos dois grandes partidos dos Estados Unidos à presidência.
Michelle Obama se tornou um ícone de representatividade ao assumir o posto de primeira primeira-dama negra do Estados Unidos em 2009.
Na Argentina, Eva Perón ficou conhecida como “mãe dos pobres” por se envolver intensamente em ações de caridade. Devido a sua grande popularidade, Evita Perón ofuscou o marido.
O primeiro-cavalheiro
Quando as mulheres assumem o mais alto cargo político, é comum que seus maridos não cumpram um papel relevante em seu governo, ao contrário do que se espera da atuação das primeiras-damas.
Joachim Sauer, marido da ex-chanceler alemã Angela Merkel, sempre se manteve longe de qualquer atenção e se recusava a falar com a imprensa. Philip May, marido de Thereza May, ex-primeira-ministra do Reino Unido, também não teve muita participação no governo da esposa.
Para a professora Clarissa Forner, um dos motivos para o afastamento dos companheiros consiste “nas inúmeras pressões para que as mulheres em posição de comando transmitam a imagem de autossuficiência.”
“Na literatura, é comum encontrar discussões a respeito da masculinização de mulheres que assumiram o poder, isso é, a adoção de práticas e trejeitos masculinizados, como forma de angariar maior legitimidade, dentro do governo e na opinião pública.”