Entenda como funciona o parlamentarismo britânico
Sistema político voltou aos holofotes com o escândalo de festas de Boris Johnson e os possíveis caminhos para a queda do premiê
Internacional|Lucas Ferreira, do R7
O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, está no centro das atenções mundiais após uma série de festas durante o lockdown virem a público e chocarem os britânicos. A população, a imprensa, a oposição e até o Partido Conservador pressionam o político, mas não há sinais de que ocorra a renúncia.
O Reino Unido possui o parlamentarismo como sistema político vigente e, portanto, a saída de Johnson não seria possível por um processo de impeachemnt, como ocorreu com Fernando Collor e Dilma Rousseff no Brasil, que é um presidencialismo.
O professor do Instituto de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo) Kai Enni Lehmann, explica que a permanência de Johnson depende da manutenção do apoio da maioria do Parlamento, em especial os membros do seu partido — o Partido Conservador.
“O primeiro-ministro no Reino Unido depende do apoio majoritário do Parlamento para sua permanência no cargo. Em inglês eles dizem comandar uma maioria no Parlamento”, diz Lehmann.
Para que efetivamente haja uma troca de primeiro-ministro, será necessário que 54 parlamentares do Partido Conservador enviem cartas ao membro de uma comissão interna chamada Comissão de 1922. Nese documento deverá constar uma sinalização de que os deputados não confiam mais no premiê.
Caso as 54 cartas cheguem ao presidente da comissão, será aberta uma votação interna no Partido Conservador para saber se a maioria dos parlamentares eleitos de fato não querem mais Johnson como líder do partido no Parlamento.
Se a maioria votar pela destituição do premiê, uma eleição interna será feita no Partido Conservador para eleger um novo líder do partido no Parlamento e, consequentemente, um novo primeiro-ministro, uma vez que o partido possui maioria absoluta de cadeiras na casa.
Como são as eleições parlamentares no Reino Unido?
O Reino Unido possui 650 distritos eleitorais, cada um destes distritos tem um candidato de cada partido. O mais votado, consequentemente, assume uma das cadeiras do Parlamento. Lehmann afirma que a maioria dos britânicos não vota pensando no candidato, mas sim no partido.
“Na prática, a grande maioria das pessoas vota na legenda e não no candidato. Há algumas exceções, mas de modo geral é isso. Você vota no partido e não no candidato do distrito.”
Além dos 650 parlamentares eleitos para o que é chamado de Câmara Baixa, ainda existem 792 membros da Câmara Alta que chegam ao cargo a partir de indicações — incluindo políticos e até bispos.
Atualmente a Câmara Baixa britânica é formada por 363 parlamentares conservadores, 173 trabalhistas e outros 11 grupos que completam os ocupantes das 650 cadeiras.
O parlamentarismo exclui a figura do presidente?
A resposta para a pergunta acima é sim e não. Sim, se pensarmos que o presidente no Brasil é chefe de governo e chefe de Estado, ou seja, controla as principais decisões políticas do país, além de ser a principal imagem da nação.
Na maioria dos países europeus parlamentaristas a figura do primeiro-ministro é vista como o chefe do governo, de liderança política, enquanto o presidente costuma ter poderes cerimoniais, assim como a rainha Elizabeth 2ª possui no Reino Unido.
Esta estrutura não é uma regra e alguns países, como a França e a Polônia invertem essa hierarquia de poder.
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“Nós temos algumas exceções, temos alguns sistemas presidenciais, como na França e na Polônia, onde o presidente, que é o chefe de Estado, tem muito poder. Na grande maioria dos casos europeus o chefe de Estado é cerimonial”, explica Lehmann.
A ideia do presidente no parlamentarismo é dar continuidade e prosperidade ao país, sendo esta figura que geralmente vai à mídia para discursar diante da população.
Ainda há um terceiro arranjo possível de presidente e primeiro-ministro, segundo o professor da USP. “Na Itália o papel do presidente é importantíssimo. Porque sempre tem instabilidade no parlamento italiano. Por isso que o papel do presidente de negociação é muito grande nesse caso”, conclui Lehman.