Ex-funcionária do Facebook diz que rede 'enfraquece democracia'
Frances Haugen prestou depoimento por cerca de quatro horas a uma comissão do Senado dos Estados Unidos
Internacional|Da Ansa
A ex-gerente de produtos do Facebook Frances Haugen prestou depoimento por cerca de quatro horas nesta terça-feira (5) a uma comissão do Senado dos Estados Unidos e afirmou que a rede social "enfraquece a democracia".
"Estou aqui porque acredito que os produtos do Facebook prejudicam os adolescentes, semeiam divisões e enfraquecem a nossa democracia. A liderança da empresa sabe como tornar o Facebook e o Instagram mais seguros, mas não querem fazer as mudanças necessárias porque colocaram os seus lucros astronômicos acima das pessoas e escolheram crescer a qualquer custo", disse Haugen ao abrir seu depoimento.
Ao longo de toda a participação, a ex-gerente foi questionada sobre diversos assuntos e sobre os documentos que ela vazou para o jornal Wall Street Journal sobre as práticas adotadas pela rede fundada por Mark Zuckerberg.
Entre elas, os danos causados às imagens de crianças e adolescentes por causa da dependência e da formação provocadas pelo Instagram. Segundo Haugen, a plataforma sabe que menores de 13 anos entram na rede social e não atua para combater esses acessos.
Além disso, uma pesquisa interna mostrou que 6% dos usuários menores de idade admitem que a rede social "danifica materialmente" a sua saúde e o seu rendimento nas escolas — o que Haugen acredita ser um número ainda maior na vida real.
Entre os danos citados, estão os distúrbios alimentares provocados pelas imagens editadas no Instagram, depressão, anorexia e graves danos à saúde causados por produtos de emagrecimento que têm propaganda veiculada na rede social .
Os senadores ainda revelaram outras pesquisas que mostram que os adolescentes, especialmente as meninas, se sentem mal com seus corpos e que o "Instagram as faz sentir pior".
Sobre as eleições, Haugen confirmou o que havia dito à CBS News, que o Facebook desativou um sistema que havia criado para enfrentar o período das eleições norte-americanas em novembro do ano passado. E que o Facebook não remove conteúdos com desinformação porque isso acaba gerando mais engajamento e mais interações entre as pessoas.
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Conforme a ex-gerente, os "algoritmos continuarão a ser perigosos a não ser que sejam quebrados". Nos EUA, muitos políticos acusam a rede de Zuckerberg de não ter atuado para impedir a disseminação de notícias falsas no pós-período eleitoral.
Em 6 de janeiro deste ano, um grupo de apoiadores do então presidente Donald Trump que acreditava que as eleições foram fraudadas invadiu o Capitólio para tentar impedir a promulgação dos resultados. Ao todo, cinco pessoas morreram no local.
Reforçando que os funcionários do Facebook "não são pessoas malvadas", Haugen ressaltou que todas as decisões cruciais passam pelo crivo de Zuckerberg.
"Não há ninguém no momento que pode assumir a responsabilidade a não ser o próprio Mark Zuckerberg", afirmou, dizendo que o fundador da rede social tem um controle "desproporcional" de todas a ações. Haugen ainda ressaltou que um dos motivos que a fizeram denunciar é que "ninguém" que está fora da rede social sabe o que realmente ocorre ali.
No entanto, ao ser questionada se desejava que o Facebook fosse desativado completamente, a ex-gerente de produtos disse que não e que a plataforma vem investindo em programas de segurança "mais do que qualquer outra", mas que é preciso criar uma regulamentação para as grandes empresas do tipo.
Países estrangeiros — Outro ponto abordado pelos senadores, e que teve consenso entre democratas e republicanos, foi se há potências estrangeiras se aproveitando do Facebook para "expandir" suas visões dentro dos EUA.
A ex-gerente afirmou que "trabalhou diretamente no rastreamento da participação chinesa dentro da plataforma" assim como sobre a espionagem do governo do Irã e que isso é uma "coisa que está acontecendo".
"Eu acredito que a consistente falta de pessoal nas operações de informação de contraespionagem e de equipes no contraterrorismo é uma questão de segurança nacional. Tenho fortes preocupações com segurança nacional sobre a forma que o Facebook opera atualmente", disse Haugen.
Ela ainda acrescentou que a rede social "está muito ciente" que tudo isso está acontecendo.
Assim como ocorreu nas matérias do Wall Street Journal e da CBS News, o Facebook se manifestou por nota assinada por sua diretora de comunicações, Lena Pietsch, e atacou Haugen, negando as acusações.
"Hoje, um subcomitê de Comércio do Senado ouviu uma ex-gerente de produtos do Facebook que trabalhou na empresa por menos de dois anos, não tem relações diretas, nunca foi a um encontro de decisão com executivos C-level e testemunhou mais de seis vezes sobre não trabalhar com o objeto em questão", cita Pietsch.
"Nós não concordamos com a caracterização de muitos problemas que ela testemunhou. Apesar de tudo isso, nós concordamos em uma coisa: é hora de começar a criar regras-padrão para a internet.
São 25 anos desde que as regras para a internet foram atualizadas, e em vez de esperar que a indústria tome decisões que devem ser dos legisladores, é hora de o Congresso agir", diz o comunicado.