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"Existe perigo de fragmentação completa do Reino Unido", afirma especialista

Saída da UE tem tudo para fazer Escócia e, depois, Irlanda do Norte se desligarem do país

Internacional|Eugenio Goussinsky, do R7


População mais envelhecida e os mais pobres optaram pela saída
População mais envelhecida e os mais pobres optaram pela saída

A formação do Reino Unido, a partir da Inglaterra, sempre foi marcada pelo conflito entre inclusão de direitos democráticos e expansão territorial imposta. Tudo começou na Batalha de Hastings, em 1066, quando pela primeira vez o país foi unificado, a partir de uma ilha então dividida por sete reinos locais. Passados 1.150 anos, em um contexto em que não prevalece a selvageria das armas em castelos e descampados, aquilo que se tornou o Reino Unido pode voltar a reviver uma situação de divisão que o leve novamente à sua origem apenas inglesa — ou bretã (povo bárbaro vindo a partir da França da Idade Média).

Com o referendo de quinta-feira (23) no qual 51,9% da população britânica decidiu que o país deve se separar da UE (União Europeia), além do abalo econômico que a escolha poderá causar em todo continente, com perigo de uma recessão interna para o país no início, o sentimento nacionalista que permeou a decisão tem tudo para se espalhar para outros países, principalmente Escócia e Irlanda do Norte. E provocar a saída de ambos do Reino Unido, conforme afirma o professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, o alemão Oliver Stuenkel.

— Os dois países vão fazer isso (deixar o Reino Unido) para viabilizar o ingresso na UE, sobretudo no caso da Escócia. A Irlanda do Norte pode vir a deixar depois, o mais provável é primeiro a Escócia. Mas existe um perigo de uma fragmentação completa do Reino Unido. Isso está ocorrendo em função da decisão histórica pela saída do Reino Unido da UE, e se houver a fragmentação ocorrerá uma reversão da história (do país).

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O especialista fala com segurança sobre uma mais do que provável saída da Escócia em um futuro próximo. Mesmo que, em referendo realizado em setembro de 2014, os eleitores do país, que se uniu à Inglaterra (Grã-Bretanha) em 1707, escolheram permanecer fazendo parte do país.


— Agora se trata de um outro contexto, muitos escoceses votaram na época justamente para ficar na UE, agora que o Reino Unido saiu é bastante provável que haja um novo referendo. Tudo bem que Londres terá que aprovar esse novo referendo, mas, como a maioria da Escócia optou por ficar, acho bastante provavel que a pressão vai fazer com que essa nova votação aconteça.

Globalização e populismo


Formado essencialmente pela Inglaterra, Irlanda do Norte, Escócia e País de Gales, o Reino Unido é reflexo de fenômenos que estão ocorrendo no mundo inteiro neste momento, de acordo com Stuenkel: a rejeição à globalização e o apego ao populismo.

— Esse referendo, no fundo, não tem nada a ver com a Europa, tem a ver com boa parte da população que se sente impotente, achando que as elites não se interessam pelos seus desejos, que a globalização não traz benefícios e sim perigo, imprevisibilidade. As pessoas se sentem como estrangeiras no próprio pais. Não é algo específico da Grã-Bretanha, as pessoas que votam no Trump nos Estados Unidos, entre outros, têm as mesmas angústias.

A disputa ideológica perdeu espaço nesse cenário. Stuenkel lembra, afinal, que nacionalismo não é necessariamente relativo à direita. Conceitos que atacam investimentos estrangeiros e defendem as estatizações também têm um cunho nacionalista. Para ele, quem ganha com a confusão ideológica que prevalece no mundo atual são os candidatos populistas, como o ex-prefeito conservador de Londres, Boris Johnson, que inclusive tem um aspecto excêntrico, com cabelos volumosos, ao estilo de Donald Trump.

— O Johnson, que pessoalmente nem era a favor da saída é quem se beneficiou. Virará primeiro-ministro provavelmente. O candidato típico populista não tem orientação ideológica forte, mas se apresenta como salvador da pátria. Não tem posição clara em nada, vai fazer de acordo com o que a população quer. Se há tendência à xenofobia ele vai virar para esse lado, se for outra coisa ele vai defender.

Também os interesses financeiros, por mais poderosos que fossem, foram derrotados por um nacionalismo popular, diz Stuenkel. Foram "varridos", assim como o atual primeiro-ministro David Cameron, defensor da permanência, que, segundo o especialista da FGV, quis se fortalecer antes da eleição de 2015, em que se consagrou com uma vitória histórica.

— As elites e jovens que faziam universidade queriam ficar na UE. Quem quis sair foram as pessoas velhas e os pobres, que saíram da educação universitária e enxergam a imigração como uma das principais ameaças ao país. Votaram por medo porque, por exemplo, um muçulmano foi eleito prefeito de Londres, a seleção inglesa tem metade de jogadores negros. Eles olham tudo isso e dizem que não tem a ver com o país deles, onde cresceram.

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Isso, porém, segundo o professor, fará desta camada mais pobre a mais prejudicada com a saída do país do bloco europeu.

— São os mais pobres que mais irão perder economicamente com a saída, votaram contra os próprios interesses econômicos. Vai ter mais desemprego na Grã-Bretanha, fortalecimento de partidos radicais, a redução de imigração vai desacelerar a economia, já que, por exemplo, quem trabalha na colheita são poloneses e imigrantes. O inglês não quer mais fazer isso.

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