Extremistas atacam mulheres que buscam mais liberdade no Iraque
Em menos de 2 meses, quatro mulheres que simbolizavam a luta por uma sociedade mais igualitária foram mortas; Miss Iraque 2015 fugiu por ameaças
Internacional|Fábio Fleury, do R7
A morte de uma modelo e celebridade de internet no Iraque, no fim de setembro, expôs uma onda de perseguição contra mulheres de tendências liberais no país. Tara Fares, 22, morreu no último dia 27, após ser baleada enquanto dirigia por uma viela na capital, Bagdá.
Fares foi a quarta mulher de destaque a ser assassinada no Iraque desde meados de agosto. Em comum, todas defendiam uma sociedade mais aberta e com maior participação feminina, lutavam pelos direitos das mulheres e muitas eram nomes conhecidos na indústria da beleza.
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Tara Fares era uma das principais instagrammers e influenciadoras digitais do Iraque, com quase 3 milhões de seguidores, e já era alvo de extremistas há meses.
No início do ano, ela se mudou de Bagdá para Erbil, fugindo de ameaças que recebia pela internet. Entretanto, costumava voltar à capital frequentemente, e foi assassinada durante uma dessas visitas.
Onda de mortes
Dois dias antes da morte de Fares, a ativista Suad al-Ali foi morta a tiros em plena luz do dia perto do mercado de rua de Basra, segunda maior cidade do Iraque. Ela era líder de uma ONG de direitos humanos que participava de diversos protestos contra o governo.
Em 17 de agosto, outra figura de sucesso no Instagram, Rafeef al-Yasiri, 32, foi encontrada morta em sua casa. Ela era cirurgiã plástica, tinha programas públicos de saúde e era conhecida como a “Barbie do Iraque”.
Uma semana depois, Rasha al-Hassan, dona de um dos principais salões de beleza de Bagdá, também foi achada morta em casa. Poucas informações sobre os dois crimes foram divulgadas ao público, e a polícia até o momento não localizou nenhum dos criminosos.
Fuga do Iraque
A modelo Shimaa Qasim Abdulrahman, que foi eleita Miss Iraque em 2015 — na primeira vez que o concurso foi realizado desde a década de 1970 —, preferiu deixar o país após a morte de Tara Fares. Ela vinha recebendo ameaças há anos, e se mudou para a Jordânia poucos dias depois do assassinato.
“Nos últimos dias que estive em Bagdá, não tinha coragem nem para sair de casa. Lá dentro eu já estava com medo. Qual é a diferença entre uma ameaça séria e apenas dar um susto em alguém? Já mataram muitas pessoas em plena luz do dia, não queria esperar para ser morta”, explicou a modelo ao portal curdo Rudaw.
Ela afirmou que entrou em contato com as forças de segurança iraquianas diversas vezes, mas que os autores das ameaças jamais foram identificados. “Fui ameaçada, minha vida corria perigo. Por isso vim para a Jordânia”, disse.
Alvos preferenciais
Em um dos países mais rígidos do mundo com as mulheres, tentativas de mudança de comportamento frequentemente são punidas com crimes brutais. Para Hanaa Edwar, ativista e fundadora da Rede de Mulheres Iraquianas, os recentes assassinatos colocam em risco o futuro de uma sociedade mais justa no país.
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“Acreditamos que estão visando as mulheres para prejudicar a vida em sociedade no Iraque. Digo isso porque os trabalhos delas eram de civilidade, humanitários. Portanto com essas mortes querem parar a transição do extremismo e isolamento social para um horizonte aberto, onde as mulheres possam efetivamente participar da vida em sociedade”, explicou Hama Edward, em entrevista à agência Reuters.
Para a ativista, uma frase que Tara Fares publicou em seu perfil no Instagram resume a atitude que os criminosos querem que acabe entre as mulheres iraquianas: “Quero viver minha vida como eu quiser e não como outros tentam me impor.”