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Fugindo de guerra e escravidão, mauritano busca nova vida no Brasil

Em seu país natal, o refugiado sofria perseguição das autoridades por ter pele escura e ser casado com uma mulher de Senegal

Internacional|Beatriz Sanz, do R7

Negros do país sofrem com racismo severo e segregação
Negros do país sofrem com racismo severo e segregação

M.T. nasceu na Mauritânia. Por ser negro de pele retinta, sua vida em seu país natal foi extremamente difícil.

Nesse país no norte da África, o racismo é institucionalizado e pode ser comparado com o regime de apartheid, a segregação racial que dominou a África do Sul por quase meio século.

O homem, que já vive no Brasil há dois anos e ainda não possui status de refugiado avaliado pelo Conare, contou um pouco de sua história a alunos de uma universidade em São Paulo.

“Na Mauritânia, para entrar no banco ou usar o transporte público existem duas filas e os brancos sempre têm preferência”, contou.


Além disso, o governo se utiliza de outras práticas para impedir que os negros, que são a maioria da população, avancem dentro da sociedade.

No país, a maioria de cidadãos de pele retinta falam francês fluente. Mas para conseguir uma vaga de trabalho no governo, eles exigem que o candidato fale árabe, idioma usado pela minoria branca.


Permissão para trabalhar ou escravidão

Usando sua própria história como exemplo, M.T. disse que os negros precisam de uma permissão do governo para trabalhar — quando não estão vivendo sob o regime da escravidão.


Mesmo com sua formação como técnico em extração de petróleo, ele não conseguia bons empregos. Na maioria de seus trabalhos, ele atuava como estagiário recebendo um valor equivalente a R$ 500, enquanto pessoas brancas com menos escolaridade podiam receber até R$ 2 mil.

Cansado e frustrado, ele decidiu se mudar para a Líbia, onde poderia exercer sua profissão. Ele trabalhou em empresas petrolíferas na Líbia por 23 anos, onde conseguia faturar pelo menos 2 mil euros por mês e manter um padrão de vida confortável.

Na época, ele conseguiu viajar por diversos países do mundo, inclusive destinos turísticos europeus como Itália e Malta. Nesse mesmo período, M.T. se casou com uma mulher senegalesa.

Os três filhos que M.T. tem ainda não possuem documentos da Mauritânia, assim como sua mulher. Ele contou que sempre ouvia das autoridades o seguinte discurso “seu documento é a cor da sua pele”.

Porém, em 2011 com o início da Guerra da Líbia todos os estrangeiros foram expulsos do país, incluindo M.T. Ele se viu obrigado a voltar para a Mauritânia

Problemas com as autoridades

Tendo retornado ao país, após anos de um trabalho bem remunerado no exterior, M. T. decidiu comprar um carro e trabalhar como taxista. O que ele não esperava era a perseguição das autoridades.

“Mauritanos brancos que têm carro podem furar o sinal e fazer tudo. Os negros, mesmo com a documentação completa e dirigindo com segurança sempre serão parados”, lembra.

Outra situação que lhe causava problemas era sua carteira de motorista ter sido emitida no Senegal. Mesmo que o documento tivesse a validade em outros territórios, isso era sempre motivo para ser parado pela polícia.

Expulsão dos mauritanos negros

Entre o fim da década de 1980 e o início da década de 1990, as tensões entre a Mauritânia e o Senegal eram constantes. Os países são vizinhos mas, conforme os ânimos se acirravam, cidadãos de um país foram agredidos no outro.

Neste ponto, tanto o Senegal quanto a Mauritânia começaram a repatriar seus cidadãos e a expulsar os cidadãos do país vizinho. Assim surgiu a justificativa perfeita para que o governo mauritano pudesse expulsar seus próprios cidadãos de pele escura.

As autoridades disseram na época que não tinham como confirmar se os expulsos eram mauritanos ou senegaleses. Pelo menos 70 mil mauritanos negros foram expulsos do país pelo próprio governo, em um episódio que ficou conhecido como Passif Humanitaire.

Outros 30 mil que integravam as Forças Armadas, foram demitidos.

Em 1992, a fronteira entre os dois países foi reaberta e os mauritanos expulsos puderam retornar. Contudo M.T. explicou que a grande parte desses mauritanos ainda não conseguiu reaver documentos que comprovem sua nacionalidade, mesmo passados 26 anos.

Expectativas no Brasil

M.T. está no Brasil há dois anos. Ele já trabalhou em um restaurante árabe e atualmente trabalha em uma empresa de plásticos na cidade de Guarulhos, na Grande São Paulo.

Uma das coisas que chamam a atenção do refugiado é que no Brasil pessoas negras e brancas podem ocupar os mesmos espaços e trabalharem nas mesmas funções.

Vindo de um país onde as diferenças raciais são tão marcantes, ele parece não ter se adaptado às sutilezas do racismo brasileiro.

Ele afirmou que nunca havia sofrido um episódio de racismo desde que chegou.

Agora, M.T. se reúne com cerca de mais 150 compatriotas mauritanos na missão de construir uma associação para atender aos refugiados que chegam de seu país.

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