Itália controla até ida a mercado e multa quem descumprir em R$ 1.150
Quarentena devido ao novo coronavírus obriga habitantes a ter documento para explicar motivo de deslocamento, explica brasileira que vive no país
Internacional|Patrícia Araújo, especial para o R7 em Angri (Itália)
Os últimos negócios a serem fechados foram bares, cafés e restaurantes. Na última quinta-feira (12), o governo da Itália ampliou ainda mais a já extensa lista de estabelecimentos comerciais e espaços públicos que devem trancar as portas durante o período de quarentena no país.
Porém, bem antes da determinação oficial, o cotidiano de muitos italianos já tinha deixado de incluir esses lugares. O medo da difusão do coronavírus restringiu a rotina às atividades essenciais.
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Em Angri, cidadezinha de 34 mil habitantes no sul da Itália — a 250 km de Roma e 33 km de Nápoles —, o primeiro caso de contaminação pelo covid-19 foi registrado na noite do domingo (15).
Um homem de 47 anos está internado no hospital Cotugno, em Nápoles, o centro de referência para o coronavírus na região.
Mas já há uma semana as restrições de movimento impostas aos habitantes da cidade são pesadas. A maioria passou a poder sair de casa só para ir ao trabalho, para comprar comida nos supermercados, açougues e quitandas, ou remédios nas farmácias.
A movimentação é permitida somente com uma autocertificação na qual se garante por escrito a necessidade e o motivo do deslocamento. Mentir é crime passível à multa de 206 euros — o equivalente a R$ 1.150 — e pena de reclusão de até três meses.
Para garantir que a lei seja cumprida, o governador da região e o prefeito da cidade solicitaram à polícia a realização de patrulhas e blitze. O controle é feito, ao longo de todo o dia, entre motoristas e pedestres. Mas o número de pessoas que atualmente precisam sair de casa para trabalhar é bastante reduzido, limitando-se praticamente aos empregados de fábricas e setores considerados essenciais à sociedade.
Muitas empresas e instituições passaram a adotar a modalidade home office, pedindo a seus funcionários de permanecerem em casa. Outras fecharam temporariamente e seus trabalhadores entraram em um período de licença forçada.
A Defesa Civil municipal também passou a realizar ações pontuais para organizar as filas em frente a farmácias e supermercados da pequena cidade medieval. É preciso respeitar a distância de um metro entre as pessoas e somente um número limitado de clientes entra por vez nos estabelecimentos. Mesmo sendo severas, as medidas têm sido respeitadas.
No final de semana, as filas em frente a alguns supermercados chegaram a durar mais de uma hora. Apesar da demanda crescente, não falta mercadoria. Pelo contrário, a reposição dos produtos é feita rapidamente e é comum encontrar supermercados com prateleiras abarrotadas. Já nas farmácias, tem sido cada vez mais difícil achar máscaras de proteção e álcool em gel.
Carros de som da prefeitura com auto-falantes circulam pelas ruas reforçando a determinação de ficar em casa o máximo possível. “Município de Angri, o prefeito adverte os cidadãos de restarem [permanecerem] em casa e saírem só em caso de real exigência, que será verificada. Ficarão abertas lojas alimentares de primeira necessidade e farmácias”, diz o aviso que sai das caixas de som. Bancos e bancas de revista também permanecem abertos.
Fechamento voluntário
Embora o executivo nacional autorize ainda o funcionamento de algumas outras atividades locais, como oficinas mecânicas e hidráulicas, postos de gasolina e pequenos pontos para o pagamento de boletos e venda de cigarros, a maior parte dos proprietários decidiu fechar as portas por conta própria. Outros tipos de comércio passaram a funcionar somente com pedidos por telefone e entrega em domicílio.
Apesar de não existir também nenhum decreto nacional que determine o fechamento de parques públicos, o prefeito, por segurança, proibiu o acesso ao principal espaço de lazer da cidade. A “vila”, como os angreses chamam o parque municipal, era o ponto de encontro das famílias, onde as crianças brincavam e os adolescentes e adultos jogavam conversa fora. Em tempos de pandemia, segundo a administração municipal, o espaço poderia se transformar em foco de contaminação. As grades devem seguir fechadas até 3 abril, data marcada para o fim da quarentena em todo o país.
Angri, na realidade, é um retrato do que tem acontecido em toda a península. Desde o dia 10 de março, quando o governo publicou o decreto que ampliou o estado de emergência para todo o território nacional, a Itália passou a ser um país de cidades desertas.
Psicologia e solidariedade
Uma mudança tão brutal no cotidiano impôs também uma preocupação com o aspecto emocional e psicológico da população. Na imprensa e redes sociais, multiplicam-se as campanhas de conscientização sobre a necessidade da quarentena e a importância da união de todos.
Também se espalham as ações virtuais espontâneas para ajudar os italianos a passar o tempo em casa. São cursos gratuitos de culinária, artesanato, desenho, pintura; concertos ao vivo de músicos também em quarentena; visitas virtuais a museus; leitura de livros e contos para crianças; e inúmeros flash mobs nas varandas.
Quase todos os dias, em Angri, os moradores saem nos terraços e janelas para entoar o hino nacional, bater um minuto de palmas em homenagem aos funcionários do sistema de saúde, tocar um instrumento. São ações de encorajamento, mas crescem também as ações de ajuda prática.
Dezenas de voluntários da cidade tem se mobilizado para socorrer idosos e pessoas com limitações de movimento. Levam as compras de comida e remédios e fazem pequenos serviços, como trocar uma lâmpada ou ajustar um equipamento. Na pequena cidade aos pés do vulcão Vesúvio, a restrição à liberdade individual reforçou a solidariedade.
A Itália registrou 627 mortes em 24 horas em decorrência do novo coronavírus, atingindo um total de 4.032 desde o primeiro caso, segundo divulgou na sexta-feira (20) a Defesa Civil do país.
Além disso, o número de pessoas que foram infectadas pelo vírus aumentou 4.670 e chegou a 45.705. Até o momento, de acordo com o órgão oficial, 5.129 pessoas receberam alta.