Itália vai reconstruir com madeira a arena dos gladiadores do Coliseu
Local de combate terá tecnologia para resfriar ambiente e, quando pronto, público verá legendário anfiteatro sob ótica dos lutadores
Internacional|Ricardo Segura, da EFE
Poucos lugares no mundo são tão mergulhados em história, lenda e sangue como o Coliseu ou o Anfiteatro Flavio em Roma, na Itália, onde - entre outros espetáculos públicos e jogos - os gladiadores lutaram até a vida ou morte uns com os outros ou com as feras diante dos olhares do imperador, dos senadores do Império Romano e de dezenas de milhares de espectadores enlouquecidos.
Construído em concreto romano, madeira, tijolo, calcário, mármore e estuque, este anfiteatro é reconhecido como uma das Sete Novas Maravilhas do Mundo Moderno. Foi inaugurado no século I e utilizado até ao século VI, sendo palco de atividades de caça de animais, execuções, encenações de lutas e peças de teatro de inspiração mitológica.
Em breve, nesta mesma década, a milenar arena oval deste emblemático edifício, declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco, terá um novo piso de madeira.
Os visitantes poderão estar no mesmo lugar onde os "esportes de sangue" aconteceram e onde os gladiadores colocaram suas vidas em jogo, cujos infortúnios foram representados em inúmeros filmes e séries.
Trata-se de “mais um passo na reconstrução da arena, um ambicioso projecto que vai contribuir para a conservação e protecção das estruturas arqueológicas, recuperando a imagem original do Coliseu e restaurando também o seu caráter de complexa máquina cênica”, afirmou o ministro de Cultura da Itália, Dario Franceschini.
O político fez essas declarações após a licitação para o projeto e construção do novo piso da arena do anfiteatro, administrado pelas entidades oficiais Parque Arqueológico do Coliseo e Invitalia.
Os construtores serão um grupo liderado pelo escritório Milan Engenharia e que envolverá o estúdio de arquitetura Labics, o arquiteto Fabio Fumagalli e o professor Heinz-Jürgen Beste, também consultor de aspectos arqueológicos como as empresas Consilium e Croma.
Esta iniciativa teve início em novembro de 2014, quando o ministro relançou a ideia da arqueóloga Daniele Manacorda de devolver a sua arena ao Coliseu. O projeto foi concluído com a definição do projeto, segundo o Ministério da Cultura da Itália.
A nova arena do Anfiteatro Flavio será leve, reversível e sustentável, conforme exige o Documento de Orientação de Projeto (DIP) elaborado pelos arquitetos, arqueólogos, restauradores e estruturalistas do Parque Arqueológico do Coliseu.
Inicia-se agora a fase operacional do projeto que, com técnicas construtivas inovadoras, utilização de materiais adequados e metodologias de análise apuradas, permitirá recuperar a imagem original do monumento e o seu funcionamento como uma complexa máquina cênica, reforçando a sua protecção e conservação, em particular de suas estruturas subterrâneas, de acordo com o ministério italiano.
Madeira especial sobre pedras milenares
O piso será feito de fibra de carbono e Accoya, uma madeira para ambientes externos produzida a partir de coníferas e modificada com um tratamento químico denominado acetilação, que aumenta a durabilidade, estabilidade dimensional e resistência a sal, insetos, fungos e radiação ultravioleta, mantendo a aparência e mecânica características da madeira natural.
Essa madeira é proveniente exclusivamente de florestas certificadas, mantidas por meio de arborização sustentável, onde é planejada a extração de madeira, levando em consideração o reflorestamento.
Algumas partes do futuro pavimento serão construídas com painéis móveis ou ripas, algumas com forma curva e outras retilíneas que, graças aos seus movimentos de rotação e translação, vão garantir a flexibilidade da superfície de madeira e permitirão abrir as estruturas subterrâneas ou embasamento para que, em determinados momentos, sejam visíveis e arejados, ficando expostos à luz natural e aos olhares dos turistas.
Este plano vai proteger as estruturas dos agentes atmosféricos, reduzindo a carga hídrica com um sistema de recolhimento e recuperação das chuvas, o qual vai alimentar os banheiros públicos do monumento, segundo o governo italiano.
A arena restaurada contará com 24 unidades de ventilação mecânica, distribuídas ao longo de seu perímetro, que vão controlar a temperatura e a umidade das salas subterrâneas. Também vão garantir que a troca completa de todo o volume de ar do recinto subterrâneo ocorra em apenas 30 minutos, quando o novo piso estará completamente fechado.
“A intervenção de arquitetura e engenharia vai permitir uma interpretação abrangente do Coliseu Romano por parte do público, que assim poderá compreender plenamente o uso e a função original deste ícone monumental e arqueológico do mundo antigo, também por meio de manifestações culturais das mais altas nível que serão realizadas lá”, informou o escritório de engenharia responsável pela obra.
“O projeto de restauração da arena, cujo interior mede 86 metros por 54 metros, com área de 3.357 metros quadrados, dará lugar à restauração integral do maior anfiteatro do mundo antigo, que se estima ter usado na antiguidade. Tinha capacidade para até 87 mil espectadores”, explicam os engenheiros.
“A nova plataforma será colocada na altura que tinha na época e retomará o traçado da planta original do edifício. As estruturas da plataforma ficarão apoiadas nas paredes existentes, sem âncoras mecânicas ou qualquer impacto invasivo, e serão totalmente reversíveis”, segundo o escritório.
“O novo piso da arena também vai melhorar a conservação e proteção das estruturas arqueológicas localizadas no hipogeu (estrutura subterrânea do anfiteatro) e vai recriar a aparência original do monumento”, afirma.
“Também acrescentará ao Coliseu uma nova funcionalidade compatível com o incalculável valor arqueológico, arquitetônico e social deste edifício”, concluem os responsáveis pela obra.