Notre-Dame: troca de materiais antigos é desafio para reconstrução
Fogo consumiu teto e pináculo de Catedral, erguida há 8 séculos. Especialista diz que próximo passo é estudar estrutura para pensar em reparos
Internacional|Ana Luisa Vieira, do R7
Até esta segunda-feira (15), a Catedral de Notre-Dame, em Paris, na França, era um dos monumentos históricos mais visitados da Europa. Nesta terça (16), contudo, amanheceu fechada para o público por tempo indeterminado, sob os destroços de um incêndio que se estendeu por mais de 14 horas.
O fogo consumiu completamente o teto e fez desmoronar o pináculo da construção, erguida há oito séculos. Em meio a uma onda global de comoção pela tragédia, o presidente Emmanuel Macron foi categórico: "Notre-Dame é nossa história (...) e nós vamos reconstrui-la juntos".
Segundo Antonio Carmona, conselheiro da ABECE (Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural), será uma tarefa complicada — principalmente porque envolve materiais diferentes daqueles utilizados nos dias de hoje: “O concreto e a armadura de construções como a Catedral são antigos e apresentam uma resistência que não é como aquela com a qual estamos acostumados na atualidade”, pontua.
Inspeções iniciais
As primeiras inspeções após o incidente dão conta de que, enquanto o interior da Catedral e sua cobertura foram consumidos pelas chamas, as paredes externas e os campanários — torres dos sinos — permanecem em bom estado.
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Carmona explica que os próximos passos devem incluir o recolhimento de amostras dos materiais de construção do edifício para que se possa conhecer seu verdadeiro estado e como eles podem se comportar depois de resistirem a um incêndio de grandes proporções.
“Uma coisa é o que nós conseguimos ver, outra é a integridade de uma área que, de fora, parece sem danos, mas internamente pode estar degradada. Essas amostras deverão ser levadas para um laboratório e submetidas a testes e ensaios físicos e químicos. Assim, é possível saber qual foi a temperatura a que esses materiais chegaram e definir qual volume deles deve ser retirado do local para substituição”, completa o engenheiro.
O secretário de Estado do Interior da França, Laurent Nuñez, informou em coletiva de imprensa que, à primeira vista, foram identificadas vulnerabilidades "especialmente no nível da abóboda” e em “parte do transepto [porção transversal que se estende para fora da nave central] norte”.
Risco de novos desabamentos
Para Carmona, é improvável que, nos próximos dias ou semanas, haja novos desabamentos das paredes principais que sobraram da Catedral: “É claro que as avaliações de estabilidade são muito importantes, mas um edifício deste tipo geralmente é muito robusto — com mais de um metro de espessura das paredes. Parece difícil que a temperatura elevada cause danos a ponto de oferecer o perigo de uma alvenaria entrar em ruína”.
Terminadas as inspeções e análises, inicia-se o intricado processo de reparação e substituição de tudo o que foi danificado. “A recolocação de materiais é muito complicada e, obviamente, exige profissionais especializados. É claro que existe a observação atenta dos revestimentos, argamassas e pinturas porque os materiais a serem recolocados precisam ser muito próximos daqueles que já existiam anteriormente — ou se perde o sentido da obra”, afirma.
Neste sentido, um desafio é certo: de acordo com Bertrand de Feydeau, presidente da Fundação do Patrimônio da França (Fondation du Patrimoine), que concedeu entrevista à rede de notícias CNN, não há árvores no país que sejam largas o suficiente para substituir toda a madeira consumida pelo fogo em Notre-Dame.
O teto do monumento foi construído há 800 anos com peças de faia muito duras e pesadas. Por ter sido feito usando os troncos de cerca de 5 mil árvores, era quase uma obra à parte, conhecido como "a Floresta".
Causa do fogo e investigações
O fator que desencadeou as chamas que se espalharam tão rapidamente pelas vigas amadeiradas da Catedral ainda é desconhecido — embora se saiba que, no momento do incidente, operários realizavam reformas nos corrimões e gárgulas do edifício. Por ora, a procuradoria de Paris iniciou uma investigação sobre uma "destruição involuntária pelo fogo". O procurador-geral Remy Heitz acredita na hipótese de um incêndio acidental.
Um cronograma para as obras ainda não foi divulgado.