O conflito entre Rússia e Ucrânia pode dar início à Terceira Guerra Mundial?
Especialistas não acreditam que haja elementos neste momento para tal alarde, mas ressaltam instabilidade entre potências
Internacional|Lucas Ferreira, do R7
O conflito entre Rússia e Ucrânia é o principal assunto dos noticiários em todos os lugares. Apesar de as batalhas estarem concentradas no Leste Europeu, o medo de uma grande guerra generalizada que envolva outras potências assusta boa parte do mundo.
O R7 conversou com quatro especialistas que não acreditam na possibilidade de uma Terceira Guerra Mundial. Apesar da grave disputa no território ucraniano, ainda não existem elementos que indiquem uma batalha militar similar aos confrontos que ocorreram no início e em meados do século 20.
O economista e doutor em relações internacionais Igor Lucena diz que apesar de autoridades europeias e norte-americanas tocarem no assunto de uma guerra mundial, a ideia de um confronto nesses moldes ainda é ousada.
“Acho muito ousado a gente falar de Terceira Guerra Mundial hoje. O que encontramos é um conflito militar na Europa, o mais sério desde o fim da Segunda Guerra Mundial e da Guerra Fria. Entretanto, essa visão de Terceira Guerra Mundial é um pouco exacerbada.”
A professora de relações internacionais da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) Miriam Saraiva, por sua vez, ressalta que guerras costumam ter desenvolvimentos surpreendentes e cita como exemplo a própria invasão da Ucrânia.
“Guerra sempre tem um desenvolvimento que pode ser surpreendente. E pelo visto, a própria invasão da Ucrânia, por si só, já foi surpreendente, pois ninguém pensava que ela poderia chegar a esse nível. Se acharia eventualmente que ele [Putin] poderia entrar em Donbass, mas não tanto. Agora, acho que daí para uma guerra mundial está longe.”
O docente da Facamp (Faculdades de Campinas) James Onnig adianta que uma hipotética Terceira Guerra Mundial nos moldes do que ocorreu quando do embate contra o nazismo e o fascismo, nas décadas de 1930 e 1940, não acontecerá. Para o especialista, ainda assim, estamos caminhando em direção a um grande conflito.
“Certamente não nos moldes da Segunda Guerra Mundial, ou seja, avanço e recuo de tropas, combates frente a frente, isso no atual momento creio que não. Mas vem se desenhando um teatro de que realmente estamos a caminho de um confronto de proporções inimagináveis.”
O historiador Rodrigo Ianhez, especialista em Rússia, explica que não dá para dizer que uma Terceira Guerra Mundial seja provável neste momento. Ele acredita que todos os envolvidos farão tudo para evitar um conflito dessa magnitude.
“Que é possível, é. Mas ainda não dá para dizer que é provável. A gente vai precisar ver os desenvolvimentos e é evidente que isso é algo que todas as partes vão querer evitar de todas as maneiras.”
Nesta quinta-feira (3), o presidente francês, Emmanuel Macron, disse que o “pior ainda estava por vir” na Ucrânia, após uma conversa telefônica com Vladimir Putin. Ao mesmo tempo, o presidente russo se mostra irredutível e afirma que suas exigências aos ucranianos devem ser aceitas para alcançar um tratado de cessar-fogo.
Um dos principais pedidos de Putin é que a Ucrânia não entre na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), aliança que envolve algumas das maiores potências militares do mundo, como Estados Unidos e França.
“Era justamente a demanda da Rússia — criar uma situação de insegurança nas suas fronteiras. Uma possível entrada da Ucrânia na Otan era uma ameaça à segurança da Rússia, o que na visão dos russos levaria a um possível conflito com a Otan”, explica Ianhez.
O artigo 5 da Aliança do Atlântico aponta para uma defesa imediata de todos os signatários do acordo caso um dos Estados-membros seja atacado. Nesse caso, se a Ucrânia fizesse parte da Otan no momento da ofensiva russa, os Estados Unidos e todos os outros 29 países teriam que enfrentar militarmente a Rússia.
“A partir do momento que o envolvimento direto das duas maiores potências bélicas, Rússia e EUA, está cada vez mais acirrado, eu acredito sim que estamos caminhando para um confronto mundial. Eu não chamaria de Terceira Guerra, mas um conflito de escala mundial por hegemonia”, afirma Onnig.
Leia também
“De maneira prática, uma Terceira Guerra Mundial só vai existir quando a Otan estiver em confronto militar com a Rússia”, ressalta Lucena. “Você estaria colocando as principais potências da Europa e os Estados Unidos contra outra potência. Aí você estaria envolvendo, pelo menos, seis nações com capacidade atômica.”
Apesar de um conflito nos moldes da Terceira Guerra Mundial ter sido descartado pelos especialistas, um período de tensão não visto desde a Guerra Fria pode estar se iniciando.
“O que acho que vai acontecer é abrir um período de tensão. [...] Não acho que seja o primeiro passo para a Terceira Guerra Mundial, mas é um primeiro passo para deixar os países mais tensos e começando a querer se armar, pensando em defesa, o que por si só é ruim”, conclui Saraiva.