Pandemia reaproxima líderes e pode fortalecer o Mercosul
As medidas econômicas tomadas por países parceiros do bloco, como União Europeia, EUA e China, mostraram a relevância do comércio regional
Internacional|Do R7
O Mercosul (Mercado Comum do Sul) tem um grande desafio para enfrentar nos próximos meses: além de uma crise sanitária e econômica sem precedentes, ajustar as relações diplomáticas. A pandemia do coronavírus fragilizou ainda mais a economia de países que já estavam em queda, mas as divisões no bloco ficaram menos evidentes no último encontro dos líderes.
Esta é a avaliação do professor do Ibmec-MG e doutor em ciências políticas pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Christopher Mendonça. A reunião virtual do dia 2 de julho foi marcada pela chegada do uruguaio Luis Lacalle Pou à presidência do bloco, que chegou reforçando o pedido de empenho dos líderes para o acordo com a União Europeia.
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"A preocupação com os destinos econômicos dos seus respectivos países foi crucial para a mudança de tom no discurso dos presidentes que já demonstram uma maior consonância. O discurso do novo presidente do bloco é de intensificação dos trabalhos, o que pode sim apresentar um novo fôlego à relação entre os países", diz o professor.
Segundo Mendonça, os reflexos das quedas bruscas na economias dos Estados Unidos, China e da União Europeia deverão ser sentidos também pelos países da América do Sul, o que de certa forma tornou parceiros comerciais próximos mais atraentes e reaproximou antigos "amigos".
"As trocas comerciais entre os países que compõem o Mercosul são fundamentais para o fechamento superavitário de suas balanças comerciais, neste momento de crise que assola os principais centros econômicos do mundo", destaca o especialista.
Falta de protagonismo
O Brasil, dada a importância econômica para a região, sempre liderou as relações com os países do bloco, conforme explica o professor Mendonça. Mas, nos últimos anos, apresentou uma atuação diplomática cada vez mais apagada.
Essa falta de protagonismo é um dos pontos que enfraqueceu o Mercosul, além das divergências políticas do presidente Jair Bolsonaro e Alberto Fernandez, da Argentina.
A falta de diálogo já esteve em momentos mais delicados, como quando Bolsonaro chegou a ameaçar deixar o bloco e não compareceu à posse de Fernandez. No entanto, os desafios do presente parecem ter tocado os líderes e antigos parceiros comerciais.
"A reunião mais recente foi positiva no sentido de que houve um arrefecimento destas tensões. Embora não tenham dialogado de forma direta, Fernández e Bolsonaro reafirmaram a visão de que o Mercosul seja a janela da América do Sul para o mundo, sobretudo em questões comerciais", aponta Mendonça.
Acordo com a União Europeia
Uma das grandes promessas do bloco é o acordo comercial com a União Europeia, que já está sendo discutido e negociado há 20 anos. Contudo, para que o acordo seja bom para a região, será necessária uma maior união entre os diferentes líderes.
Para o professor Mendonça, quanto menos arestas nas relações, mais chances de negociação. "Não restam dúvidas de que um bloco regional coeso tenha melhores condições de se projetar no cenário internacional, principalmente em um momento de importante relacionamento com a União Europeia", aponta.
Uma das grandes diferenças entre as políticas de Fernandez e Bolsonaro está justamente nas medidas econômicas, que poderão resultar em mais um entrave para as negociações. Enquanto Fernandez aposta na defesa de setores produtivos em seu país, Bolsonaro defende uma maior abertura comercial.
Mas Mendonça destaca que o novo presidente uruguaio também deverá abordar estas divergências. "O presidente Lacalle Pou chama a atenção não apenas para o esforço de aceleração das negociações com a União Europeia como, também, para uma necessária ampliação da habilidade diplomática que garanta o equilíbrio nos termos do acordo no sentido de fortalecer o bloco", lembrou.
Para o especialista, "um bloco dividido tem menores chances de prosperar".
Pandemia e diplomacia
Para Christopher Mendonça, o Brasil precisa rever sua atuação diplomática, o que ficou ainda mais evidente durante a pandemia. Mendonça classificou como uma "paralisia" a política de relações exteriores e a falta de capacidade de manter a liderança histórica na região durante a crise sanitária.
"O próprio gabinete do presidente Bolsonaro tem demonstrado a sua preocupação com a imagem exterior do país", ressalta. Durante a reunião do dia 2, o presidente afirmou que irá ampliar a política externa e ainda disse que a imagem do país está sendo distorcida no exterior.
"A diplomacia brasileira, se mais eficiente, seria crucial para o enfrentamento conjunto do vírus, mas ainda precisa de ajustes importantes para se lançar nesta seara", finaliza.