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Presença de neonazistas na Ucrânia não justifica invasão russa, dizem especialistas

Presidente Putin usou um argumento frágil para justificar a guerra por ignorar a atuação de radicais também na Rússia

Internacional|Lucas Ferreira, do R7


Vladimir Putin é retratado com bigode do líder nazista Adolf Hitler em cartaz
Vladimir Putin é retratado com bigode do líder nazista Adolf Hitler em cartaz

Desde o início da invasão russa da Ucrânia, no final de fevereiro, o presidente Vladimir Putin usa como justificativa a presença de células neonazistas no outro lado da fronteira. O mandatário da Rússia chegou a comentar a participação de fascistas em diferentes níveis hierárquicos no governo de Volodmir Zelenski.

O R7 ouviu especialistas que classificaram esse argumento de Putin de "hipócrita", já que o governo russo tem traços fascistas, como leis que atacam minorias e privam a imprensa de exercer um trabalho livre.

O professor do Instituto de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo) Kai Enni Lehmann destaca que Zelenski é judeu e o mundo “nem deve dar ouvidos” aos argumentos de Putin para justificar a invasão da Ucrânia.

“Putin está mentindo o tempo todo, basicamente. É verdade que existem grupos neonazistas na Ucrânia, como existem na Rússia também. Então, isso é mentira, e pronto. Zelenski é judeu, perdeu parentes durante o Holocausto. A gente nem deve dar ouvidos a isso.”

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O historiador e professor de relações internacionais da PUC-Rio João Daniel segue a mesma linha de raciocínio de Lehmann e explica o frágil argumento do presidente russo para a guerra.

“Existe, sim, um grupo neofascista forte na Ucrânia, não é uma mentira absoluta do Putin. Porém, isso é uma hipocrisia porque também existe na Rússia. [...] Dizer que há fascismo ou nazismo na Ucrânia é não olhar para o próprio umbigo.”

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Lehmann afirma que é difícil cravar o grau de força que grupos neofascistas têm tanto na Rússia como na Ucrânia. O professor da USP ressalta o importante papel da imprensa na construção das histórias para atingir de maneira negativa a reputação dos seguidores de Putin ou Zelenski.

“O grau de força que os neonazistas têm em ambos os países é muito discutido. O que está público nesse sentido, que temos de informação neste momento, é pouco confiável, a meu ver. Depende de quem está lendo o quê e de quem quer acreditar em qual fonte.”

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Euromaidan e o distanciamento entre os dois países

Milhões protestaram em manifestações que ficaram conhecidas como Euromaidan
Milhões protestaram em manifestações que ficaram conhecidas como Euromaidan

Entre os anos 2013 e 2014, a Ucrânia passou por uma série de protestos de cunho político chamados de Euromaidan ou Primavera Ucraniana. Os manifestantes nas ruas pediam a saída do presidente Viktor Yanukóvytch, que tinha ligações estreitas com o governo de Putin.

Os confrontos entre forças de segurança pública e manifestantes eram comuns, o que trouxe de volta à luz grupos neofascistas dispostos a ficar na linha de frente dos protestos para lutar, literalmente, contra os policiais ucranianos.

Para o historiador João Daniel, os indivíduos que confrontavam as forças de segurança gostavam da violência, andavam armados e tinham um histórico em brigas entre torcidas organizadas.

“Uma parte significativa desse pessoal é neonazista. E eles ganharam muita moral, muito prestígio. O pessoal do Dynamo Kiev, que é um time de futebol, ganhou muita popularidade. A partir daí, esses grupos começaram a ganhar força, começaram a se armar, começaram a ganhar popularidade. Viraram, inclusive, batalhões paramilitarizados.”

A ação desses grupos com características neofascistas inspirou o deputado federal Daniel Silveira, acusado em 2021 pelo STF (Supremo Tribunal Federal) de atos antidemocráticos. O parlamentar usou sua extinta conta no Twitter para dizer que era necessário “ucranizar” o Brasil, em alusão aos movimentos políticos que sucederam ao Euromaidan.

Nos anos seguintes, figuras relevantes da história da União Soviética, como Lenin, tiveram estátuas e outros símbolos atacados por grupos neofascistas ucranianos.

Após a queda de Yanukóvytch, em 2014, Petro Poroshenko foi eleito presidente pelo povo ucraniano e teve um governo que se afastou ao máximo da Rússia e de símbolos ligados à União Soviética ou ao comunismo.

Neonazistas lutam pelos russos e ucranianos?

Batalhão de Azov é considerado grupo terrorista pelos Estados Unidos
Batalhão de Azov é considerado grupo terrorista pelos Estados Unidos

Os protestos populares que forçaram a queda de Yanukóvytch e o afastamento político da Rússia e da Ucrânia também iniciaram um processo de distanciamento entre russos e ucranianos. Apesar de vizinhos e de dividirem boa parte de sua história, células de ódio nos dois países começaram a se formar.

Na Ucrânia, neofascistas criaram o conhecido Batalhão de Azov — grupo paramilitar que atua, em sua maioria, nos territórios separatistas de Donestk e Lugansk, próximo à fronteira com a Rússia. Esse núcleo extremista, inclusive, possui um partido político, chamado Corpo Nacional.

Entretanto, essas figuras neofascistas e neonazistas não se encontram só do lado ucraniano, mas também do lado russo. O professor da PUC-Rio alerta para o símbolo Z, um dos símbolos da invasão russa da Ucrânia e que identificam veículos, aeronaves e equipamentos do Exército da Rússia.

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“Não há mentira, mas as coisas não são claras. Putin usa isso como propaganda ideológica para invadir [a Ucrânia] sem olhar que na Rússia, hoje em dia, as pessoas que usam o Z também são fascistas, defendem o fascismo.”

O professor Lehmann ressalta ainda a gravidade da presença de grupos extremistas na Europa. Entretanto, não acredita que a existência de neofascistas em um país justificaria sua invasão.

“Temos neonazistas lutando na Ucrânia contra a Rússia? Temos. Sem a menor dúvida. Temos neofascistas russos lutando contra a Ucrânia? Sem dúvida, temos. Então não vejo isso como uma excepcionalidade. Evidentemente preocupante, como a existência de grupos neonazistas em qualquer país é muito preocupante e deve ser enfrentado. Isso em nenhuma circunstância, hipótese, justifica uma invasão”, conclui Lehmann.

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