Presidente e ministra da Defesa da Espanha foram espionados pelo Pegasus
Programa israelense foi usado para invadir aparelhos celulares de diversas autoridades do mundo e coletar seus dados
Internacional|Do R7
O caso de espionagem cibernética que abala a política espanhola há semanas ganhou uma nova dimensão nesta segunda-feira (2), depois de o governo anunciar que o presidente do Executivo, Pedro Sánchez, e sua ministra da Defesa, Margarita Robles, foram espionados pelo programa israelense Pegasus.
Em coletiva de imprensa convocada com urgência em Madri, em um dia de feriado na região, o ministro da Presidência, Félix Bolaños, informou que os celulares de Sánchez e de Margarita foram invadidos no ano passado por esse programa de espionagem, criado pela empresa israelense NSO, alvo de inúmeras investigações no mundo todo.
"Estamos relatando fatos comprovados e que são confiáveis. Não são suposições", frisou Bolaños, que considera de "enorme gravidade" essas intervenções "ilícitas e externas". Ele não mencionou se haveria outro país envolvido.
"Temos a absoluta certeza de um ataque externo [...] porque, na Espanha, em uma democracia como a nossa, todas as intervenções acontecem por meio de organismos oficiais e com autorização judicial", insistiu o ministro. Ele acrescentou que, "neste caso, nenhuma das duas circunstâncias ocorreu".
"Por isso, temos a certeza [...] de que se trata de uma intervenção externa", completou Bolaños.
O governo apresentou hoje uma denúncia à Audiência Nacional, a jurisdição encarregada dos casos de importância nacional, ou internacional, como os de terrorismo, para "conhecer toda a verdade", anunciou.
De acordo com Bolaños, foram detectadas "duas invasões" do celular de Sánchez, em maio de 2021, e uma do aparelho de Margarita, no mês seguinte.
Em ambos os casos, as intervenções permitiram retirar "um determinado volume de dados dos dois telefones celulares", acrescentou, sem revelar a quantidade.
Segundo o jornal El País, os hackers extraíram 2,6 gigas de dados do celular do chefe de governo na primeira invasão e 130 megabytes na segunda, além de 9 megas de conteúdo do celular de Margarita.
O governo ainda não sabe que tipo de informação foi retirado e qual é seu nível de sensibilidade. Nos dois casos, trata-se de telefones oficiais, fornecidos pelo Estado, e não de celulares pessoais.
As revelações acontecem em meio a uma tempestade política na Espanha. O governo central do socialista Sánchez enfrenta um momento de tensão com os separatistas da Catalunha, que acusam o Centro Nacional de Inteligência (CNI) de espionagem.
O caso explodiu em 18 de abril passado, com a divulgação de um relatório do Citizen Lab, um projeto de cibersegurança da Universidade de Toronto. No documento, são identificadas mais de 60 pessoas do movimento independentista catalão que teriam tido seus telefones celulares infectados, entre 2017 e 2020, pelo software Pegasus.
'Dois pesos e duas medidas'
Na semana passada, diante das acusações, e sem afirmar se houve espionagem por parte dos serviços secretos do Estado, Sánchez anunciou a abertura de uma investigação interna no CNI.
A resposta do Executivo foi considerada insuficiente pelos separatistas catalães, que voltaram a pedir, nesta segunda-feira (2), medidas mais contundentes em relação ao caso.
"Quando a espionagem em massa é contra as instituições catalãs e o separatismo, silêncio e desculpas. Hoje, é tudo às pressas. É preciso assumir as responsabilidades já", declarou o presidente do governo regional catalão, Pere Aragonès, em sua conta no Twitter.
"O critério de dois pesos e duas medidas é evidente. Contra o separatismo, vale tudo", acrescentou.
Essa crise tem uma dimensão muito séria para o governo minoritário de esquerda de Sánchez, que precisa do apoio do partido de Aragonés no Parlamento, de modo a se manter no poder até o término da legislatura atual, no fim de 2023.
"O que está claro é que o governo espanhol é o único responsável por esse caso de espionagem, seja por ação, seja por omissão", criticou a porta-voz do Executivo regional catalão, Patricia Plaja, que voltou a exigir que medidas sejam tomadas o mais rápido possível.
"É preciso uma comissão de investigação imediatamente, e que vá até o fim", frisou.
Criado pela empresa israelense NSO, o Pegasus permite acessar os serviços de mensagens e os dados tão logo instalado em um celular, além de ativar o dispositivo de maneira remota para captar som e imagens.
A NSO sempre afirmou que vende o software apenas a Estados e que as operações devem receber a autorização prévia das autoridades de Israel.
A ONG Anistia Internacional afirma que o software pode ter sido utilizado para invadir até 50 mil telefones celulares no mundo.