Quais são as condições para que Rússia e Ucrânia cheguem a um acordo de cessar-fogo?
Putin e Zelenski defendem os interesses de seus países enquanto o Ocidente tenta pressionar Moscou para o fim da guerra
Internacional|Letícia Sepúlveda, do R7
A guerra entre Rússia e Ucrânia completou um mês nesta semana, e os planos do presidente Vladimir Putin de que seria uma ofensiva rápida e certeira não se concretizaram. A população e o Exército ucraniano resistem desde o dia 24 de fevereiro e estão conseguindo evitar que as tropas inimigas ocupem a capital, Kiev. Nesse cenário, entre os constantes ataques russos e uma série de sanções do Ocidente contra Moscou, qual seria o caminho para um acordo de cessar-fogo?
Para Igor Lucena, especialista da Universidade de Lisboa e membro do Royal Institute of International Affairs, o primeiro mês do conflito foi marcado por pressões internas e externas nos dois países e exigências radicais que impedem o sucesso das negociações.
“Vemos uma pressão na Ucrânia do ponto de vista militar e, do outro lado, a Rússia vê as sanções econômicas derrubarem sua economia. As negociações se tornam frequentes, mas não há acordo porque não há concessões”, explica.
Rússia
Após o isolamento político e econômico da Rússia, o especialista acredita que Putin quer encontrar uma saída só por meio de uma vitória. “Isso traria uma justificativa para a retirada das tropas, já que ele também se interessa pelo fim da guerra. Mas, para isso, precisa haver ganhos.”
“A Rússia quer conseguir todo tipo de concessão da Ucrânia e não vai desistir agora, essa saída seria muito ruim para a imagem de Putin. Além disso, sem nenhuma vitória, o país sofreria um baque político muito forte, para além de todas as sanções.”
Apesar de o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, declarar que a Ucrânia “tem de aceitar que não se tornará membro da Otan”, essa ainda é a principal justificativa russa para a ofensiva militar persistir.
Além da questão da entrada na aliança militar, a Rússia exige o reconhecimento da independência da península da Crimeia, anexada em 2014, e das regiões separatistas de Donetsk e Lugansk, pontos sensíveis da unidade territorial da Ucrânia e uma das questões mais difíceis de serem negociadas, segundo Lucena.
Para o especialista, a concessão por parte da Rússia poderia ser aceitar a entrada da Ucrânia na União Europeia, mas sem que Moscou interfira na autonomia do país vizinho.
Ucrânia
Ao longo das últimas semanas, 1.035 civis morreram na Ucrânia, de acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas). Além disso, o Acnur (Alto-Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) divulgou que mais de 3,6 milhões de pessoas deixaram o país, além dos mais de 10 milhões que perderam sua casa. Nesse contexto, Lucena diz que a pressão interna aumentou sobre o presidente ucraniano.
“Zelenski vê a diminuição do suporte político e também parte da população já se questiona até que ponto podem aguentar essa situação”, diz.
“O país, porém, não pode seguir na linha de concessões à Rússia para conseguir o fim do conflito, porque haveria praticamente uma anexação indireta de todo o Estado ao interesse russo. A Ucrânia ficaria perdida como nação independente e iria ratificar o poder da Rússia de invadir outra nação com qualquer pretexto para forçá-la a obedecer a suas vontades."
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O especialista explica que um acordo de cessar-fogo do ponto de vista ucraniano é importante para proteger quem segue no país lutando ou resistindo contra as tropas inimigas. Hoje, a proteção do território é garantida tanto por militares profissionais quanto por civis que se mobilizaram para combater.
“É muito importante que os ucranianos cheguem a um acordo para que as pessoas que estão morrendo pela preservação da nação não morram em vão”, completa Lucena
A busca pela paz
Os países do Ocidente buscam caminhos diplomáticos para que o conflito chegue ao fim e um acordo seja aceito pelos dois lados. A outra estratégia é usar as sanções contra a Rússia para causar prejuízos e tentar inviabilizar economicamente o conflito.
Já a Otan passou a se mobilizar para proteger seus membros no Leste Europeu, mas sem uma atuação efetiva na guerra. Na quinta-feira (24), o secretário-geral da aliança, Jens Stoltenberg, anunciou que vai aumentar as tropas na região e confirmou um suporte para a autodefesa da Ucrânia.
A aliança é pressionada por Zelenski e pela população ucraniana para fechar o espaço aéreo da Ucrânia e, assim, evitar os bombardeios russos que estão destruindo cidades e matando civis inocentes, mas não houve avanços nesse sentido.
“Os ataques só vão parar quando houver algum tipo de concessão para um acordo. Faz parte da pressão russa a estratégia de atacar, mas ao mesmo tempo sentar à mesa de negociações", conclui Lucena.