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Reino Unido: antimonarquistas expõem decepção com realeza

Enquanto rainha celebra 65 anos de sua coroação, grupos questionam papel político da monarca e afirmam que querem eleger chefe de Estado

Internacional|Ana Luísa Vieira, do R7

Rainha Elizabeth comemora 65 anos de coroação em 2 de junho
Rainha Elizabeth comemora 65 anos de coroação em 2 de junho

A rainha Elizabeth II, do Reino Unido, comemora os 65 anos de sua coroação neste sábado (2) — pouco mais de 20 dias após seu neto, o príncipe Harry, casar-se com a atriz norte-americana Meghan Markle.

O clima parece ser de celebração entre os britânicos, mas nem todos estão felizes com a monarquia ou apoiam fervorosamente os eventos envolvendo seus membros. É o que diz Emily Robinson, especialista em política do Instituto Europeu da Universidade de Sussex, na Inglaterra.

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“Eu não diria que grande parte do público apoia a monarquia. Eu acho que há dois extremos: pessoas que firmemente apoiam e pessoas que firmemente rejeitam a família real. E no meio desses extremos está a maioria da população — que, de certa forma, aceita passivamente a existência da realeza”, afirma.

O lado de quem defende o fim da coroa é hoje capitaneado por grupos como o Republic — que, em seu site, declara querer que “a monarquia seja abolida e que a rainha seja substituída, democraticamente, por um chefe de Estado eleito”.


Os motivos elencados pela campanha — além do fato de o Reino Unido não poder eleger seu próprio presidente — incluem, por exemplo, os custos gerados pela família real aos pagadores de impostos: pelas contas do Republic, “cada membro da realeza ganha, anualmente, 670 vezes mais que o trabalhador médio do Reino Unido”.

O movimento ainda questiona o papel político de Elizabeth declarando que, embora o senso comum sugira que a monarca não possa tomar decisões importantes, a rainha “certamente tem poderes — incluindo os de assinar tratados internacionais e enviar tropas britânicas para o exterior”.


Anti-monarquistas passaram a se organizar
Anti-monarquistas passaram a se organizar

A professora de Sussex pondera: “Obviamente, a monarquia é uma instituição política e ocupa um papel dentro da Constituição. Mas ela não tem tanta legitimidade, o que quer dizer que ela não pode executar completamente seu papel político. Por exemplo: em um contexto como o do Brexit, num país que tivesse um presidente, ele provavelmente se manifestaria e tomaria alguma posição após o referendo. A rainha não pode fazer isso aqui”.

Grupos organizados


Segundo Emily, embora os grupos antimonarquistas não sejam exatamente novidade na história da Inglaterra, somente agora eles vêm se pronunciando de forma mais organizada.

“Mesmo no século 19, os antimonarquistas já existiam, mas não de um jeito tão coordenado como vemos hoje. No início do século 20, eles meio que desapareceram para ressurgir em 1977 — mas na forma de cultura pop e punk, em músicas do Sex Pistols e etc. Foi na época do jubileu de prata de Elizabeth II. Sempre sem grande organização, eram pequenos. Atualmente, o grupo Republic em particular cresceu de uma forma mais profissional, com equipes e campanhas organizadas. Eles têm um perfil mais midiático e começaram a se apresentar nos meios de comunicação de massa”, descreve.

Para o casamento do príncipe Harry com Meghan Markle, por exemplo, o Republic conseguiu reunir 32 mil nomes em um abaixo-assinado contra o uso de dinheiro público na cerimônia — incluindo os gastos com segurança e policiamento.

Chefe de Estado eleito

O professor Stephen Basdeo, de 33 anos, que vive na cidade de Leeds e leciona literatura na Universidade Internacional de Richmond, conta que passou a se definir como um antimonarquista aos 16 anos — assim que começou a se interessar por política.

Basdeo: 'Príncipe Charles deve enfrentar resistência'
Basdeo: 'Príncipe Charles deve enfrentar resistência'

“Acredito que a monarquia é fundamentalmente antidemocrática. Embora as histórias de reis e rainhas sejam interessantes nos livros, é errado que em 2018 o povo britânico não possa votar para escolher seu chefe de Estado. Nós nos submetemos a uma mulher cuja única qualificação para ser líder de Estado é um acidente de nascimento. Ela nunca teve que submeter seu papel à aprovação do povo”, diz.

Na opinião de Basdeo, o fato de que o estilo de vida luxuoso da rainha e de seus parentes seja mantido com dinheiro dos pagadores de impostos só piora a situação.

“Há enfermeiros que realmente contribuem com algo significativo para a sociedade vivendo na pobreza e tendo que recorrer ao uso de empréstimos para sobreviver. Nosso serviço de saúde está em dificuldades e fortemente endividado, e uma fração da riqueza da rainha recuperaria as contas, mas ela não faz nada. Não podemos construir uma sociedade mais justa e igualitária aqui no Reino Unido enquanto o privilégio existir no coração do nosso sistema político."

Para o professor, a família real britânica deve passar a enfrentar maior resistência após a morte de Elizabeth: “Eu suspeito que, para muitos, o apoio à monarquia tem a ver com um vínculo com a rainha — ela é uma senhora legal, no fim das contas. Mas as pessoas têm muito menos entusiasmo pelo seu filho, o príncipe Charles, ascendendo ao trono. Ele é amplamente desacreditado pelo tratamento que deu à ‘princesa do povo’, Diana”.

Pesquisa do instituto Ipsos divulgada às vésperas do último casamento real mostra que, de fato, enquanto a rainha Elizabeth é preferida por 32% da população na Grã-Bretanha, o príncipe Charles conta com o apoio de apenas 8% do povo. Ele fica atrás de seus filhos, Harry e William, da nora, Kate Middleton, e até mesmo do neto, príncipe George — que tem quatro anos de idade e é citado como membro da realeza preferido por 12% dos entrevistados.

Depois de Elizabeth

A especialista da Universidade de Sussex concorda que a transição de poder após a saída de Elizabeth deve representar tempos difíceis para a família real britânica.

“Eu tenho certeza de que eles [a família real] já estão se preparando para isso. Muitas pessoas justificam seu apoio à monarquia dizendo que ‘a rainha Elizabeth tem sido ótima’, mas esse argumento não vai mais ser válido quando ela não estiver no trono. O príncipe Charles inclusive deve desempenhar um papel político muito mais controverso — ele se mostra muito mais disposto a intervir em questões políticas. Vai ser difícil sustentar essa ideia de que a monarquia está acima da política”, reforça.

Para parte da população, eventos reais renovam celebrações pena unidade
Para parte da população, eventos reais renovam celebrações pena unidade

Mark Johnson, que tem 54 anos e é gerente de desenvolvimento de contas em uma empresa de transporte e logística na cidade de Norwich, gosta de pensar que a monarquia será abolida enquanto estiver vivo: "É uma instituição que reforça as noções de classe e superioridade baseadas no direito de nascimento e não no mérito".

O inglês rechaça a ideia de que a realeza impulsiona celebrações pela unidade britânica: “Eu sugeriria que 70% da população não se interessa. Na minha opinião, as pessoas que dizem celebrar eventos reais por razões patrióticas são as mesmas que se deixam levar pelo fervor nacionalista durante uma guerra ou uma partida de futebol”, rebate.

Emily Robinson conclui: “Eu, pessoalmente, não acho que eventos reais contribuam com a sensação de pertencimento à nação, de forma geral. Além disso, a monarquia é um tema encarado de forma diferente em cada parte do Reino Unido — que inclui a Grã-Bretanha e a Irlanda do Norte. Culturalmente, assumimos que a monarquia representa ‘o jeito que as coisas são’. É parte do cenário. Mas opiniões mudam e eventos tomam rumos completamente diferentes do que imaginamos. É o que vimos recentemente com o Brexit”.

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