Reino Unido enviará imigrantes ilegais para Ruanda
Medida proposta pelo primeiro-ministro Boris Johnson foi criticada pela oposição e por organizações de defesa a refugiados
Internacional|Do R7
O Reino Unido anunciou na quinta-feira (14) um plano controverso para controlar a migração clandestina, que inclui o envio de requerentes de asilo para Ruanda, país africano a 7.000 km de distância, e confiar à Marinha o monitoramento de chegadas ilegais por mar.
"A partir de hoje, a Marinha Real assumirá o comando operacional no Canal da Mancha [...] para garantir que nenhum navio chegue ao Reino Unido sem ser detectado", anunciou o primeiro-ministro Boris Johnson durante uma visita a Dover, na costa do sul da Inglaterra, por onde um número crescente de barcos de migrantes chegaram nos últimos meses.
O executivo vai dedicar 50 milhões de libras (R$ 306 milhões) a mais pessoal e material novo como helicópteros, aviões e drones, disse.
Paralelamente, chegou a um acordo com as autoridades ruandesas para enviar ao país africano, com um "lamentável histórico em termos de direitos humanos", segundo a Anistia Internacional, pessoas que entrem ilegalmente no Reino Unido.
A Ministra do Interior, Priti Patel, viajou a Kigali para fechar este acordo multimilionário, que provocou a indignação de ONGs como a Anistia Internacional, que denunciou "uma ideia chocantemente mal concebida" que "vai causar sofrimento e desperdiçar enormes somas de dinheiro dinheiro publico".
Ruanda receberá inicialmente 120 milhões de libras (R$ 736 milhões) "para acolher requerentes de asilo e migrantes e dar-lhes um caminho legal para a residência" e para "se estabelecer permanentemente, se assim o desejarem". Reino Unido, informou seu Ministro de Relações Exteriores, Vincent Biruta.
Este projeto do Reino Unido provocou reações iradas de ONGs e "forte oposição" do Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados).
"Pessoas que fogem de guerras, conflitos e perseguições merecem compaixão e empatia. Elas não devem ser comercializadas como mercadorias e transportadas para o exterior para serem processadas", disse Gillian Triggs, vice-alta comissária do Acnur para a Proteção Internacional.
Desviar a atenção
O regime pode ser aplicado a todos os migrantes ou refugiados que chegaram clandestinamente ao Reino Unido, independentemente do país ou continente de origem.
A oposição britânica acusou Johnson de tentar desviar a atenção do escândalo sobre festas ilegais em Downing Street durante o confinamento por causa da Covid-19, pelos quais ele foi multado pessoalmente na terça-feira, levantando temores de uma nova crise dentro de seu Partido Conservador.
Nadia Hardman, especialista em proteção de requerentes de asilo e migrantes da ONG Human Rights Watch, alertou para as consequências para refugiados como os sírios.
"Os refugiados sírios estão desesperados para se estabelecer em algum lugar seguro", disse ele à AFP, e "o acordo do Reino Unido com Ruanda só complicará essa busca".
"Eles chegarão esperando ser tratados de acordo com os valores fundamentais que o Reino Unido afirma defender, mas em vez disso serão levados a quilômetros de distância para outro país em um continente totalmente diferente", disse ele.
"Covarde, bárbaro e desumano"
O controle da imigração foi uma das questões-chave durante a campanha do Brexit e Johnson prometeu acabar com as chegadas clandestinas.
Mas os números não param de aumentar: 28.500 pessoas fizeram a perigosa travessia do Canal da Mancha em 2021 em embarcações precárias, uma das rotas marítimas mais movimentadas do mundo, contra 8.466 em 2020 e 299 em 2018, segundo dados do Ministério da Saúde e do Interior.
Nas ruas de Dover, as opiniões estavam divididas sobre os migrantes.
"Eles precisam ser devolvidos porque não é nossa responsabilidade. Nossa responsabilidade é cuidar de nosso próprio povo, o que não estamos fazendo", disse Andy, 68, veterano do Exército britânico, à AFP.
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Mas para Mike Allan, um aposentado de 73 anos, a ideia é "absolutamente ridícula" e "muito mais cara a longo prazo".
O governo britânico também vai criar centros específicos para a entrada de quem chega clandestinamente, semelhantes aos da Grécia, para substituir o atual alojamento hoteleiro.
"Nossa compaixão pode ser infinita, mas nossa capacidade de ajudar as pessoas não é", disse Johnson, ansioso para aumentar sua popularidade antes das eleições municipais de maio, que podem ser cruciais para seu futuro político.
Tim Naor Hilton, diretor geral da ONG Refugee Action, denunciou o novo plano como uma "maneira covarde, bárbara e desumana de tratar as pessoas que fogem da perseguição e da guerra".