Relatório expõe abusos sofridos por jovens norte-coreanas na China
Refugiadas são submetidas à prostituição e ao casamento forçado. Pesquisa de ONG entrevistou 45 sobreviventes em período de dois anos
Internacional|Ana Luísa Vieira, do R7
Divulgado na última terça-feira (20), um relatório do Korea Future Initiative — ONG sediada em Londres que resgata norte-coreanos em perigo e publica estudos sobre abusos dos direitos humanos sofridos por essa população — revela que milhares de mulheres e meninas da Coreia do Norte são traficadas para a China e forçadas ao casamento e à prostituição.
Para a pesquisa, foram entrevistadas mais de 45 sobreviventes em um período de dois anos. O levantamento aponta que a maioria das vítimas tem idades entre 12 e 29 anos. Frequentemente, são jovens que fogem de seu país e depois são coagidas, vendidas ou sequestradas na China; outras vezes, elas são traficadas desde dentro da Coreia do Norte.
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O texto ainda ressalta que muitas das mulheres e meninas são vendidas mais de uma vez e forçadas a pelo menos uma forma de abuso sexual em menos de um ano após deixar a nação governada por Kim Jong-un.
Vale lembrar que a ONU (Organização das Nações Unidas) estima que, até 2014, mais de 200.000 norte-coreanos tenham se deslocado para a China fugindo de violações de direitos humanos como fome e escravidão.
Dinheiro clandestino
O mercado de exploração de norte-coreanas, segundo o relatório, gera lucros de 105.000 dólares americanos (cerca de R$ 428.000,00) que circulam clandestinamente na economia chinesa: a prostituição forçada é a primeira das causas pelas quais as garotas — com idades entre 15 e 25 anos — são vendidas, seguida pelo casamento forçado.
Cerca de 60% de todas as meninas e mulheres são obrigadas a se prostituir por valores que partem de 30 iuanes (aproximadamente 4 dólares), ao passo que 50% são vendidas por cerca de 1.000 iuanes (146 dólares). Perto de 30% delas têm sua imagem explorada em páginas de sexo virtual para um público de diversos países.
O estudo também aponta que, enquanto a prostituição forçada se dá predominantemente em cidades-satélites e áreas próximas a metrópoles no norte da China, o casamento forçado se concentra em zonas rurais.
No relatório da Korea Future Initiative, também são apresentados depoimentos como o da norte-coreana identificada como Cho, da cidade de Sinp'o — que se situa em uma região portuária na costa do Mar do Japão.
“Quando fugi, no final dos anos 90, a maioria das mulheres era vendida para o casamento forçado. Hoje, elas são traficadas para a prostituição. A mãe de minha amiga escapou da província de Heilongjiang e, quando chegou a Yanji, na China, viu meninas norte-coreanas sendo colocadas em alojamentos onde eram alimentadas e depois forçados a fazer sexo com homens todas as noites”, disse a sobrevivente.
Origens das vítimas
De acordo com o Korea Future Initiative, cerca de 52% das vítimas são da província norte-coreana de Hamgyong Norte, que fica no nordeste do país e faz fronteira com a China. A menor parte — aproximadamente 2% — vem Pyongan Sul, província cuja capital fica situada a pouco mais de 80 km de Pyongyang.
Ao menos 41% das mulheres são norte-coreanas que fogem para a China em condições precárias — atravessando os rios Yalu ou Tumen a nado, por exemplo — e, chegando no país vizinho, são coagidas a entrar no submundo da prostituição ou do casamento forçado.
Outras 18% são sequestradas em território chinês e 16% são constrangidas e violentadas por traficantes desde dentro da Coreia do Norte. As demais são vendidas por cidadãos comuns da China, traficadas pela própria polícia ou por agentes intermediários.
A norte-coreana identificada como Paek contou à ONG que foi capturada por agentes de segurança na fronteira com ao China: “Eu chorei e disse a eles que era norte-coreana, implorei para me deixarem viajar até a Tailândia — onde pessoas do meu país podem pedir asilo. Eles me prenderam por dez horas, depois me colocaram em um carro e me levaram para o interior, até um ‘corretor’ de casamentos”.
Perspectivas sombrias
A Korea Future Initiative lamenta que as perspectivas para qualquer norte-coreana traficada para a China sejam sempre sombrias: muitas das vítimas morrem, à medida que uma pequena parte é resgatada por organizações de missionários cristãos.
A ONG conclui que “ações urgentes e imediatas, contrárias à política predominante do diálogo intercoreano, são necessárias para salvar as vidas de inúmeras refugiadas norte-coreanas na China”.