Rússia x Ucrânia: entenda o que está em jogo com o rompimento da barragem de Kakhovka
Guerra de narrativas entre Kiev e Moscou sobre a responsabilidade pela tragédia tem relação com as consequência da inundação
Internacional|Pablo Marques, do R7
A barragem de Kakhovka, em Kherson, região no sul do território ucraniano que está ocupada pela Rússia, foi parcialmente destruída na última terça-feira (6). Até o momento, nem Moscou nem Kiev assumiu a responsabilidade pelo ocorrido e trocam acusações em uma guerra de porta-vozes.
O internacionalista Rodrigo Reis, do Instituto Global Attitude, explica que os dois países envolvidos diretamente no conflito estão fazendo um "guerra de narrativas" sobre o rompimento e as consequências da inundação.
O Ministério das Relações Exteriores russo divulgou uma nota pedindo à comunidade internacional que "condene as ações criminosas das autoridades ucranianas" que representam uma "grave ameaça à segurança regional e global". A Rússia também disse à Corte Internacional de Justiça (CIJ) que Kiev destruiu a represa com "enormes" ataques de artilharia.
Já as autoridades da Ucrânia acusaram as forças russas de terem explodido a represa para evitar uma contraofensiva das tropas da região no país. O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, pediu que "o mundo reaja" à destruição da represa.
Segundo Rodrigo Reis, a barragem tem fatores estratégicos que justificariam uma ataque à estrutura para os dois lados.
"A Rússia ocupa a cidade na qual a represa está e tem interesse em barrar a ofensiva que está sendo planejada pela ucrânia para a retomada do território. A região do reservatório poderia ser um caminho para o avanço das tropas ucranianas", explica o especialista.
Do lado ucraniano a população civil foi muito afetada pelas inundações. Estima-se que cerca de 40 vilarejos tenham sido prejudicados pela elevação do nível da água do rio Dnipro. Segundo o ministro de Energia ucraniano, German Galushchenko, mais de 20 mil lares ficaram sem eletricidade nesta semana.
Apesar de sofrer as consequências da situação, Kiev também teria motivos para usar o reservatório de água como um forma de afetar Moscou. "Essa represa é responsável pelo abastecimento de água da Crimeia, que foi invadida pela Rússia em 2014. Então, a destruição pode ser interpretada como uma forma de interromper o abastecimento de água de uma região controlada pela Rússia", diz Rodrigo.
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O especialista explica que as Convenções de Genebra proíbem ataque contra infraestruturas, como torres de eletricidade e reservatórios de água, por considerar que é um ataque direto aos civis que estão na zona de guerra.
A Cruz Vermelha disse que participa das operações de evacuação em território ucraniano com cerca de 50 voluntários. A ajuda da ONU recebeu um reforço nesta semana.
Pelo menos quatros pessoas morreram e outras 13 estão desaparecidas devido às inundações. Na parte controlada por Kiev da região de Kherson, 2.412 pessoas foram retiradas de suas casas até agora.
Desastre nuclear
A barragem de Kakhovka fornece água para o resfriamento da central nuclear da usina de Zaporizhzhia, ocupada pela Rússia e localizada a cerca de 150 quilômetros rio acima.
"A água era usada para abastecer a maior usina nuclear da Europa, ou seja, tem uma importância estratégica na questão de resfriamento. Em princípio não coloca em risco nem a infraestrutura nem a região, mas é algo que exige bastante atenção", afirma Rodrigo.
O chefe da operadora ucraniana Ukrhydroenergo, Ihor Syrota, chegou a afirmar que as reservas de água não eram mais suficientes para resfriar os reatores.
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), porém, confirmou à agência de notícia AFP que a usina de Zaporizhzhia continuava recebendo água das reservas da barragem.
Após avaliação, constatou-se que a operação de bombeamento de água "deve poder continuar, mesmo que o nível caia abaixo dos 12,7 metros", declarou essa agência da ONU em um comunicado.
Confira imagens da destruição da barragem da Ucrânia feitas do espaço