Talibã obriga mulheres a casarem com seus membros e bate nas que usam calças, diz refugiada afegã
No Afeganistão, desde o retorno do grupo radical ao poder, em agosto de 2021, há inúmeras violações aos direitos humanos
Internacional|Letícia Sepúlveda, do R7
Sara Razi, afegã de 23 anos, estava em Bangladesh quando viu pela televisão seu país cair sob o domínio do grupo Talibã pela segunda vez – ele permaneceu no poder entre 1996 e 2001. Naquele 15 de agosto de 2021, ela ligou desesperada para a família à procura de notícias. Antes da retomada do grupo, Sara havia decidido deixar o Afeganistão para começar a graduação em economia, devido ao medo do avanço dos talibãs.
“Minha família está espalhada pelo mundo. Uma de minhas irmãs está nos Estados Unidos, a outra foi para a Nova Zelândia, e meu irmão também deixou o país depois de ser ameaçado inúmeras vezes pelo Talibã. Depois do novo governo, apenas minha mãe permaneceu em Cabul”, conta em entrevista exclusiva ao R7. Outro irmão de Sara foi morto pelo grupo radical, e seu pai morreu de Covid-19.
“Quando falo com minhas amigas, elas choram muito porque não conseguiram terminar seus estudos. O Talibã deixou as universidades abertas para ter apoio internacional, mas na realidade muitos professores saíram do país e as alunas apenas aprendem valores islâmicos”, completa.
Segundo Sara, uma pequena parcela das mulheres afegãs consegue sair do país com bolsas de estudos internacionais. Muitas pessoas preferem enfrentar vários riscos a permanecer no Afeganistão. Os refugiados procuram entrar em países próximos como o Paquistão e o Irã.
A Anistia Internacional realizou uma pesquisa sobre a situação de mulheres e meninas afegãs sob o domínio do Talibã de setembro de 2021 a junho de 2022. O levantamento foi publicado em julho deste ano e revela que o governo radical impediu que a grande maioria das meninas do ensino médio retornasse à escola. Nas universidade, o assédio do Talibã às estudantes é tanto que elas pararam de frequentar as aulas ou decidiram não se matricular nos cursos.
Entre tantas restrições, as mulheres foram expulsas da maioria dos postos de trabalho e retiradas de cargos públicos. Além disso, estão proibidas de percorrer mais de 70 km sem um homem da família e são obrigadas a usar a burca em ambientes públicos, com o corpo e o rosto totalmente cobertos.
“Quando vejo os noticiários internacionais, é muito difícil de acreditar no que está acontecendo. O Talibã obriga várias mulheres a se casarem com seus soldados, batem nas que saem às ruas usando calça e prendem as que não obedecem às suas ordens”, conta Sara Razi. “As mulheres nunca estarão seguras sob esse governo.”
Assim como ela, o documento da Anistia Internacional denuncia o casamento forçado de meninas com membros do Talibã. Famílias afegãs casam suas filhas por não terem condições de sustentá-las devido à grave crise econômica que tomou conta do país.
Relatos de prisões também estão presentes na pesquisa. ”De acordo com quatro indivíduos que trabalhavam em centros de detenção administrados pelo Talibã, o grupo prende mulheres e meninas por violarem suas políticas discriminatórias, como as regras contra aparecer em público sem um homem da família.”
“As afegãs detidas arbitrariamente por suposta ’corrupção moral’ ou por fugirem de abusos não têm acesso a aconselhamento jurídico, são submetidas a torturas, bem como a condições desumanas de detenção”, conclui o texto.
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Em meio a tantas violações, Sara acredita que órgãos internacionais poderiam fazer mais pelo seu país, assim como os países aliados. Para ela, está claro que países como a China e a Rússia, que apoiam o governo do Talibã, não se importam com os direitos perdidos pela população afegã. Indignada com os abusos do governo e com a falta de ações diplomáticas, ela não tem ideia de quando voltará ao seu país ou verá sua família novamente.