Venezuela corta seis zeros da moeda por alta na inflação
País tem a terceira reconversão monetária em 13 anos e o Bolívar Digital entra em vigor a partir de 1ª de outubro
Internacional|Do R7
A partir de outubro, a Venezuela terá menos seis zeros em sua moeda, o bolívar, em meio a uma alta inflação e à forte desvalorização que levou ao uso generalizado do dólar - informou o Banco Central (BCV) do país, anunciando ainda a emissão de nova série de moedas.
Esta é a terceira reconversão na Venezuela em 13 anos. O falecido ex-presidente Hugo Chávez (1999-2013) eliminou três zeros da moeda em 2008. Seu sucessor, Nicolás Maduro, fez o mesmo em agosto de 2018 e suprimiu cinco zeros. No total, 14 zeros foram removidos do bolívar.
"A partir de 1º de outubro de 2021, o Bolívar Digital entrará em vigor, aplicando-se uma escala monetária que elimina 6 (seis) zeros à moeda nacional. Ou seja, todo o valor monetário e tudo o que for expresso em moeda nacional, serão divididos entre um milhão (1.000.000)", informou a entidade bancária em um comunicado. A decisão busca "facilitar" o uso da moeda, levando "a uma escala monetária mais simples".
Nessa data entrará em vigor um novo cone monetário com cinco novas notas de 5, 10, 20, 50 e 100 bolívares e uma moeda de 1, informou o ministro da Comunicação e Informação, Freddy Ñáñez, no Twitter.
Isso ocorre em meio a uma inflação galopante que pulverizou o valor do bolívar. A inflação acumulada entre janeiro e maio foi de 264,8%, segundo o BVC, que costuma apresentar atrasos em seus relatórios econômicos.
O ano de 2020 fechou com 2.959,8% de inflação acumulada e 2019 com 9.585,5%, segundo a própria entidade bancária.
"Decisão esperada"
"O que era uma decisão esperada está sendo executada", disse à AFP o economista César Aristimuño, diretor da Aristimuño Herrera & Asociados. "Por si só, era necessária (...), os processos de faturamento e os processos contábeis das empresas já eram praticamente impossíveis", apontou.
Os valores são tão astronômicos, que nas ruas é comum ouvir falar de "milhares" em vez de "milhões" na hora de comprar.
"A reconversão não acabou com a hiperinflação, ao contrário, acelerou, aprofundou a destruição do bolívar", disse Ángel Alvarado, ex-deputado e membro do Observatório Venezuelano de Finanças (OVF), próximo da oposição.
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O OVF registra uma inflação de 333% entre janeiro e junho deste ano e de 2.616% nos últimos 12 meses. "O problema é a hiperinflação", assegurou Alvarado em um vídeo publicado pelo Twitter.
Na Venezuela, o dinheiro em circulação é escasso e é comum ver longas filas nos bancos. Assim, o bolívar acabou sendo substituído pelo dólar, que se tornou a moeda de fato no país.
É cada vez mais comum que os preços em qualquer comércio sejam refletidos em dólares e os pagamentos sejam feitos em moeda estrangeira. O pagamento em moeda local normalmente é feito por cartão de débito ou transferência bancária.
"Ficar no mesmo"
Apesar do anúncio de uma nova família monetária, o Banco Central acrescentou ao bolívar a qualidade de "digital" como resultado da "transformação da moeda em seu formato digital", segundo o comunicado.
Maduro impulsionou a "digitalização total" dos pagamentos na Venezuela, inclusive o transporte público, atualmente o único setor onde impera o bolívar em cédulas.
Para venezuelanos como Marisela López, vendedora de hortaliças no mercado de Catia, zona popular a oeste de Caracas, a nova reconversão é mais do mesmo.
"Vamos ficar no mesmo. Sobem os zeros, baixam os zeros, é como um jogo, mas a atividade da economia continua igual", contou à AFP López, de 34 anos. Embora "conveniente", sublinhou Aristimuño, não é uma medida milagrosa.
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"Não podemos esperar milagres econômicos dessa decisão levando em consideração que (...) ela vem sem anúncios econômicos de fundo", que por sua vez trazem "uma queda da inflação" e "um crescimento do Produto Interno Bruto", explicou.
A Venezuela está mergulhada na pior crise de sua história recente e atravessa seu oitavo ano consecutivo de recessão.
Em agosto de 2018, o atual cone monetário passou a vigorar depois que o presidente Nicolás Maduro anunciou no mês anterior a eliminação de cinco zeros da moeda local para "facilitar as transações". Esse cone monetário foi alargado pela última vez em março passado.