Igreja é multada por degradação ambiental na Serra da Piedade
Secretaria de Meio Ambiente constatou disposição inadequada de esgoto, captação de água sem autorização e desgaste da vegetação local
Minas Gerais|Pablo Nascimento e Lucas Pavanelli, do R7
O Governo de Minas Gerais multou o Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade em R$ 51.030,55 por degradação ambiental em áreas da Serra da Piedade, em Caeté, na região metropolitana de Belo Horizonte.
O local recebe, em média, 500 mil fieis por ano, que sobem os 1.740 metros de altitude da Serra para contemplar o conjunto paisagístico tombado como Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais.
Em junho, técnicos da Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) realizaram uma vistoria no local e, dos 17 pontos analisados, constataram que sete apresentaram irregularidades.
De acordo com a secretaria, as falhas têm relação com “disposição inadequada de efluentes sanitários, intervenções em recursos hídricos e intervenções florestais realizadas de forma irregular”.
Entre as irregularidades constatadas, estão:
• Retirada de pedras e disposição de madeiras que impedem a regeneração da mata próxima a um estacionamento;
• Despejo da água de uma lavanderia em meio à vegetação nativa, mesmo havendo fossa séptica instalada no local;
• Esgoto não tratado vazando devido a um encanamento rompido;
• Captação de água para abastecer as construção do alto da serra, sem autorização dos órgãos ambientais.
Serra da Piedade
A Serra da Piedade fica na divisa das cidades de Sabará e Caeté, na Grande BH, a 50 km de Belo Horizonte. A montanha tem 1.746 metros de altitude e é destino frequente de turistas para caminhadas, trilhas e atividades ao ar livre. O turismo religioso também é marca do local há séculos.
Conforme a Semad, a expansão de um estacionamento resultou na devastação de "modo irregular" de uma área de 7 mil m², o que equivale ao tamanho do estádio do Mineirão.
"A irregularidade constatada foi a de desenvolver atividades que dificultem ou impeçam a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação", diz a secretaria, em nota.
Por essa irregularidade, o Santuário deverá pagar multa e até mesmo suspender as atividades no local.
Membro titular do Copam (Conselho Estadual de Política Ambiental), Ronaldo Vasconcellos, lembra que, para é preciso de autorização para fazer ações como esta.
— Para você fazer a supressão de qualquer tipo de vegetação, de árvores, você precisa de autorização do IEF, o Instituto Estadual de Florestas. O terreno está prejudicado e não tem recuperação do ponto de vista da engenharia florestal, vamos aceitar o fato como consumado. Mas há maneira de compensar: planta-se outras árvores, arranja-se outra área ali perto.
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Em nota, a administração do Santuário nega que houve retirada de vegetação para construção de um estacionamento.
"A área em questão é caracterizada pela predominância de rochas e de uma vegetação rasteira, comprometida por um incêndio que ocorreu em 2015", responde a Administração do Santuário.
No entanto, para a advogada especializada em Direito Ambiental, Maria Cláudia Pinto, a retirada da vegetação nativa motivou a autuação por parte do Governo de Minas.
"A região onde o Santuário está instalado é uma região que a gente chama de campo cerrado. É uma vegetação rasteira, que muitas pessoas não atribuem riqueza ambiental, mas que tem, sim, seu valor", explica a advogada.
Estudo evidencia danos
Um artigo apresentado no 9º Simpósio Brasileiro de Engenharia Ambiental, em Belo Horizonte, indica que a presença de turistas na serra sem controle e conscientização ambiental, provoca degradações em vários pontos da montanha.
O estudo avaliou a situação de três trilhas que levam ao topo da serra. Nos caminhos percorridos, os pesquisadores constataram que flores são arracandas por turistas, que também jogam lixo nas matas. Outra constatação feita é sobre queimadas, sendo algumas delas intencionais.
O texto também aponta destruição no topo da serra. "Nesta porção, a degradação é contínua devido a proximidade e acessibilidade proporcionada pela construção do Santuário, para o qual os romeiros se dirigem durante todo o ano e principalmente na Festa da Padroeira", indica o estudo.
A pesquisa foi feita em 2017. Á época, dos 5 km de estrada que dão acesso ao cume da montanha, havia lixeira apenas em dois pontos.
De acordo com a Semad, além da multa de R$ 51.030,55, o Santuário tem até esta quarta-feira, dia 11 de setembro para regularizar a captação indevida de água.
O que diz o Santuário
Procurada pela reportagem, a administração do Santuário Basílica de Nossa Senhora da Piedade diz que "em toda a sua história de quase três séculos de peregrinação, jamais recebeu qualquer tipo de autuação".
Segundo a entidade, os três autos de infração "ainda estão sob análise" após defesa apresentada pelo Santuário e acredita que não será multada, mesmo após confirmação da aplicação da multa pela Semad.
"Todas as obras realizadas no conjunto arquitetônico são previamente comunicadas às instâncias do poder público, pois o Santuário é protegido por diferentes legislações, nas esferas municipal, estadual e federal", diz a administração, em nota encaminhada à reportagem.
Sobre o despejo de esgoto não tratado, a entidade diz que o problema já foi corrigido.
Já com relação à captação de água de forma irregular, o Santuário diz que já solicitou a outorga de uso da água há três anos ao Igam (Instituto Mineiro de Gestão de Águas).
Confira a nota na íntegra
"A administração do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade esclarece que, em toda a sua história de quase três séculos de peregrinação, jamais recebeu qualquer tipo de autuação. Todas as obras realizadas no conjunto arquitetônico são previamente comunicadas às instâncias do poder público, pois o Santuário é protegido por diferentes legislações, nas esferas municipal, estadual e federal. Os três autos de infração elaborados por fiscais da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável ainda estão sob análise, a partir de defesa apresentada pelo Santuário.
1) Diferentemente do que foi relatado, “não existe supressão de vegetação nativa para a ampliação de estacionamento.” A área em questão é caracterizada pela predominância de rochas e de uma vegetação rasteira, comprometida por um incêndio que ocorreu em 2015. Essa área não é destinada a veículos, diferentemente do que foi relatado.
2) Em relação ao pequeno fluxo de rejeitos, já foi completamente corrigido, obedecendo a todos os parâmetros estabelecidos pela legislação estadual.
3) Sobre o uso da água, destinada aos peregrinos e de modo gratuito, o Santuário já solicitou há quase três anos (dezembro de 2016) a outorga ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas.
Importante sublinhar que, por sua conduta exemplar no respeito ao meio ambiente, o Santuário nunca recebeu uma autuação e, por isso mesmo, diante do que determina a legislação vigente, não deverá ser multado.
Administração do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade"