App faz carta de ações para entregadores; sindicatos rechaçam
Propostas são de curto e médio prazo. Entidades criticam ausência de autoridades públicas e demais lideranças em fórum da empresa
São Paulo|Guilherme Padin, do R7
O aplicativo iFood se reuniu com 23 entregadores de aplicativo de 14 cidades brasileiras, escolhidos pela companhia, nos últimos dias 13, 14 e 15, no chamado 1º Fórum de Entregadores do Brasil, e assinou uma carta de compromisso com melhorias para a categoria.
As ações prometidas, de curto e médio prazo, envolvem maior transparência sobre os bloqueios das contas de entregadores, migração entre os dois modelos de trabalho e a garantia de novos fóruns regionais entre os profissionais.
Segundo entregadores e sindicatos ouvidos pela reportagem, porém, os compromissos firmados não atendem a duas demandas predominantes que os trabalhadores sobre duas rodas têm levado às ruas em protestos desde junho do ano passado: o aumento da tarifa mínima por viagem e o fim dos bloqueios. Em contato com o R7, a empresa considerou que a carta de compromisso contempla os dois temas.
Em relação aos valores pagos aos entregadores, a carta indica somente a “possibilidade de revisão da tarifa mínima” e informa que, até março próximo, vai “avaliar a possibilidade de implantação do reajuste anual”.
Acerca dos bloqueios, em que os trabalhadores alegam ter as contas suspensas sem informações sobre o motivo nem possibilidade de defesa, os compromissos são mudanças sobretudo em relação à transparência nessas ações.
A companhia se comprometeu a, entre janeiro e março, dar mais transparência sobre o motivo dos alertas e suspensões temporárias e sobre a desativação de contas, realizar uma campanha informativa sobre o que pode causar os bloqueios e abrir a possibilidade de os entregadores contestarem as desativações uma vez mais.
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À reportagem, Gilberto Almeida, presidente do SindimotoSP (Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Mototaxistas Intermunicipal do Estado de São Paulo) e da Febramoto (Federação Brasileira dos Motociclistas Profissionais), se colocou contra a ação do iFood.
Em sua avaliação, a empresa não trouxe propostas concretas para aumentar o valor da tarifa de entrega, para não bloquear mais os trabalhadores indevidamente e sem explicações plausíveis e para efetivar a taxa de espera no restaurante. “Essa carta não serve para nada e não tem valor jurídico nenhum. É tapar o sol com a peneira”, disse Almeida.
Sindicatos rechaçam ausência de outras entidades no fórum
Em notas publicadas nos seus sites, sindicatos da categoria rechaçaram o fórum realizado pelo iFood por não tê-los convidado ou ao MPT (Ministério Público do Trabalho). Eles questionam o fato de o evento ter sido fechado e contar apenas com a presença de entregadores escolhidos pela empresa de aplicativo.
“Questionamos a legitimidade do evento por não ter sequer uma liderança sindical presente. Não fomos convidados. E olhem só: seria uma oportunidade incrível de debater assuntos delicados como o aumento de tarifa, fim de bloqueios indevidos, entre outros relevantes. Mas do que adianta debatê-los em um evento vazio de autoridades públicas e sindicatos?”, escreve o SindimotoSP em nota publicada na última quinta-feira (16).
Para Almeida, do SindimotoSP, “o iFood deixou de fora outras autoridades e todas as representações sindicais, que são quem detêm a representatividade e o poder de discussão”.
A Febramoto, que reúne sindicatos da categoria em todo o país, também divulgou uma posição com a mesma crítica.
“No fórum realizado pelo iFood, os participantes convidados apenas apresentaram reivindicações dos entregadores que já chegaram ao Ministério Público do Trabalho e Ministério do Trabalho e Previdência em denúncias do SindimotoSP e Febramoto. Vale ressaltar que todas estas instituições citadas não foram chamadas para o evento, o que comprometeu a legitimidade dele, escreveu a federação, que também destacou a falta de propostas concretas para o aumento da tarifa e o fim dos bloqueios indevidos e sem explicações.
Alanderson Baião, entregador que esteve entre os 23 profissionais presentes no fórum, afirmou ao R7 que o encontro foi muito produtivo.
“A carta de compromisso que o iFood criou em meio às pautas é resultado de muita luta e anos de batalhas, e por meio do fórum dos entregadores conquistamos com êxito; agora é aguardar o tempo estimado para cada pauta, pois o iFood precisa também de tempo para realizar tudo o que foi pedido pelos entregadores. Não pedimos muito, apenas o necessário para termos uma convivência boa e harmoniosa com o aplicativo”, disse Baião.
O entregador vê com bons olhos as ações propostas, e espera que sejam todas cumpridas. “Espero que o compromisso firmado e assinado por todos os representantes do iFood possa ser cumprido, que não seja a ida de todos nós em vão”, concluiu.
O iFood foi questionado sobre a ausência de outras entidades, como os sindicatos e o MPT, bem como pelo fato de o evento ser fechado, sem abertura a outros profissionais. Acerca disso, não houve resposta.
Em nota enviada pela empresa à reportagem, João Sabino, diretor de políticas públicas e relações governamentais, afirma que “o iFood é a única empresa do setor a criar um encontro perene de escuta com a categoria. Reunimos representantes de diferentes regiões com o intuito de ouvir e buscar soluções conjuntas que atendam, cada vez mais, às necessidades desses trabalhadores no dia a dia. Dialogamos abertamente sobre todas as demandas e vamos continuar nesse processo de melhoria contínua”.
Confira, abaixo, as melhorias divulgadas pela empresa em sua carta de compromisso.
Curto prazo:
Ações que deverão ser realizadas até março de 2022.
Bloqueios
• Dar mais transparência sobre o motivo de alertas e suspensões temporárias nas mensagens. Prazo: 2 de janeiro de 2022.
• Realizar campanha informativa sobre o que pode causar bloqueios na plataforma. Prazo: janeiro de 2022.
• Transparência sobre desativação das contas. Prazo: fevereiro de 2022.
• Será aberta a possibilidade de os entregadores contestarem novamente as desativações, iniciando por aquelas que aconteceram nos últimos seis meses. Prazo: março de 2022.
• Casos de contestação de desativações serão revisados por pessoas, exceto em situações de fraude financeira, uso de conta por terceiros e fraude de cadastro, que configuram desativação permanente de acordo com os termos e condições. Prazo: março de 2022.
• Revisar o processo de contestação de desativação de entregadores OLs. Prazo: março de 2022.
Respeito e valorização
• Campanha nacional de valorização do trabalho exercido pelos entregadores. Prazo: 31 de março de 2022.
• Comunicar melhor o Canal de Denúncias aos entregadores. Prazo: janeiro de 2022.
• Automatização da taxa de espera no restaurante. Prazo: janeiro de 2022.
Migração OL-Nuvem
• Revisão do processo de migração de entregadores OLs para Nuvem para que entregadores tenham mais autonomia para a solicitação e com novas regras. Prazo: fevereiro de 2022.
• Redução no prazo de migração de perfil, para 35 dias sem corridas pelo OL (prazo necessário por causa dos repasses quinzenais). Prazo: janeiro de 2022.
Pontos de apoio
• Pesquisa no aplicativo sobre experiência no ponto de apoio. Prazo: janeiro de 2022.
Tarifas e ganhos
• Avaliar a possibilidade de implantação do reajuste anual. Prazo: março de 2022.
Médio prazo:
Temas que serão priorizados, discutidos pela empresa e debatidos com os entregadores nos próximos fóruns.
Agrupamento e agendamento
• Revisão de operação e usabilidade das ferramentas para garantir melhor experiência e ganhos ao entregador.
Pontos de apoio
• Realização de auditorias e fiscalizações dos pontos de apoio com base nos apontamentos feitos pelos próprios entregadores.
• Ouvir entregadores na decisão sobre a definição de novos locais para implementação de novos modelos de pontos de apoio.
Tarifas e ganhos
• Possibilidade de revisão da tarifa mínima.
Neste evento, também ficou definido que, a partir de 2022, serão realizados fóruns regionais com os entregadores ativos na plataforma como forma de dar continuidade a este movimento de escuta, transparência e melhorias.
Os representantes — dos entregadores e do iFood — presentes no 1º Fórum de Entregadores do Brasil assinam esta carta, reforçando os compromissos compartilhados no evento.