Guarda-civil que matou inocentes em posto de SP diz que não errou
Caso aconteceu em outubro de 2019 em Itaquaquecetuba. Em entrevista exclusiva à Record TV, Adriano Borges diz que agiria da mesma forma
São Paulo|Do R7
O guarda-civil Adriano Borges que atirou em três inocentes em um posto de combustível no dia 12 de outubro do ano passado disse em entrevista exclusiva à Record TV que faria tudo novamente.
Naquele dia, os amigos Kauê Oliveira Francisco, Bruno Nascimento Souza e Rodnei Alves dos Reis foram até Aparecida para vender água e sorvete no feriado. Na volta, pararam em um posto em Itaquaquecetuba para reabastecer. Dois guardas civis, Adriano e Emanuel Formagio, e suas mulheres estavam no mesmo posto.
No mesmo instante, dois bandidos apareceram e renderam os guardas para roubar a moto de um deles. Os guardas que trabalhavam em Itapecerica da Serra (SP) reagiram. Na troca de tiros, as duas mulheres foram baleadas. Uma delas, Roberta Franca, morreu.
Adriano achou que os três amigos que estavam no carro também fossem bandidos e atirou contra eles. Bruno, que estava no banco de trás, e Rodnei, que estava ao volante, morreram. Kauê foi baleado e sobreviveu. Ele desceu do carro e foi muito agredido. Os assaltantes fugiram.
O guarda Adriano diz que está muito abalado. desde aquele dia 12 de outubro, faz tratamento psicológico. Ele lamenta muito a morte dos inocentes.
"Isso pesa, eu me sensibilizo com a família”, diz. “Eu não sei o que eu poderia fazer, porque eu imagino a dor da família. Eu imagino a dor que seria a minha se a minha esposa tivesse morrido ali, porque por coisa de dez cm o tiro não pegou na cabeça dela."
Apesar disso, Adriano afirma que agiria da mesma forma novamente.
"Não, não houve erro meu. O que eu fiz ali foi em legítima defesa da minha vida. Porque, qualquer pessoa treinada e sabendo como é esse tipo de situação, que já passou por isso, vai entender que naquele momento ali não tinha o que se fazer."
A dupla de bandidos chegou ao posto na mesma hora que o carro dos amigos. Adriano diz que não tinha dúvida de que todos estavam juntos.
"O que eu vi, a cena que eu vi foi o carro encostando e eu olhei duas pessoas”, afirmou. “No momento, veio na minha cabeça o que: essa duas pessoas desceram do carro, provavelmente pra chamar o frentista pra vir abastecer o carro ou esticar a perna, porque ali é uma rodovia, geralmente todo mundo tá viajando. E depois foi a hora que eu vi, coisa de dois, três segundos depois, que eles já estavam anunciando o assalto. A primeira coisa que veio na minha cabeça foi: poxa, o carro parou pra assaltar a gente."
O guarda também se sentiu ameaçado quando Kauê saiu do carro, mesmo o menino colocando as mãos na cabeça.
"Naquele momento, passou na minha cabeça que ele viria pra cima de mim pra tentar me matar."
Emanuel
O outro guarda civil, Emanuel, enche os olhos de lágrimas ao lembrar da mulher e diz que não consegue superar a morte dela. Segundo ele, os responsáveis foram os verdadeiros assaltantes.
"Ele já estava atirando, ele deu o primeiro tiro. Automaticamente que ele deu o primeiro tiro, ele ficou com o dedo no gatilho, permaneceu com o dedo no gatilho, ele caiu atirando."
Ele diz ter certeza que o disparo atingiu Roberta, a mulher dele.
Emanuel teve o processo arquivado. Já a defesa de Adriano vai insistir na tese de legítima defesa.
Kauê foi preso
Kauê foi preso por suspeita de participação no assalto e ficou quatro dias na cadeia. Só depois da divulgação das imagens os três amigos foram considerados inocentes e Kauê foi liberados.
Para Lilian Mota, advogada dos rapazes assassinados, não há dúvida de que se trata de um caso de racismo. "Não é uma mera coincidência, eles são negros, moram em periferia", diz.
Edna Oliveira, mãe de Kauê, diz que a vida da família nunca mais foi a mesma. “Ele nunca mais foi o mesmo garoto. Depende da mãe para tudo. Mal consegue sair de casa”, diz.
O caso foi investigado pela polícia como duplo homicídio simples. Mas o Ministério Público ofereceu denúncia por dois homicídios qualificados e uma tentativa. O promotor entendeu que o guarda dificultou a defesa das vítimas ao atirar contra os homens que estavam dentro do carro e não tinham como se proteger.
O guarda Adriano, de 41 anos, também deve ser julgado por lesão corporal e abuso de autoridade. A denúncia pede que o GCM saia da rua e passe a desempenhar funções administrativas. Ele ainda pode ser obrigado a ressarcir as despesas com os enterros de Bruno e Rodnei e o conserto do carro. Mas Adriano continua solto. Ele nunca foi preso, responde em liberdade.
Quem está na cadeia são os verdadeiros ladrões da moto do colega de Adriano: Caio Jorge Marques foi detido quando dava entrava num posto de saúde, com um tiro no pé. O outro: Caio Juan Gonçalves de Melo foi identificado mais tarde. Em depoimento caio Caio Juan confessou o crime.
Os laudos periciais comprovam que as balas que mataram Bruno e Rodnei foram da arma do guarda Adriano. No relatório final entregue pela Polícia Civil ao Ministério Público a informação de que foi Adriano que matou os dois rapazes. No carro foram encontrados dinheiro das vendas, os celulares dos amigos e as mercadorias.
Mas, ainda não se sabe de qual arma saiu o tiro que matou a namorada do outro GCM.
Com o guarda Adriano na rua, os parentes dos dois homens assassinados não conseguem retomar a vida normal.
Bruno deixou três filhos. A mais nova tem cinco anos hoje.
A mulher de Rodnei, Luciana Alves, depois de ver o marido ser tratado como bandido, estabeleceu uma única meta na vida. “Eu vou provar sua inocência.”
E Kauê só quer ter uma vida normal de novo: “Sem raiva, misericórdia.”