Juiz que soltou agressor de grávida liberta outros suspeitos de violência
O juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos é criticado pelo MP por ter libertado acusados de crimes violentos na região metropolitana e interior de São Paulo
São Paulo|Cesar Sacheto, do R7
O juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos, responsável pela 2ª Vara Criminal de Miracatu, no interior de São Paulo, criticado pelo Ministério Público de São Paulo por mandar soltar um assaltante que agrediu uma mulher grávida de sete meses, decidiu em favor de suspeitos de crimes graves em pelo menos outros três casos neste ano - dois deles envolvendo flagrantes de roubo e outro de tráfico de drogas.
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O mais recente ocorreu no dia 20 de fevereiro, quando um homem foi preso por policiais militares com cerca de mil porções de crack (aproximadamente meio quilo de drogas) em uma mochila e encaminhado para a delegacia da cidade. Oriundo de São Vicente, na Baixada Santista, o suspeito já tinha uma passagem pela polícia por lesão corporal.
Na elaboração do boletim de ocorrência, o delegado lavrou o flagrante e o Ministério Público solicitou a prisão preventiva do suspeito. No entanto, o juiz entendeu que havia uma ilegalidade na elaboração do flagrante e decidiu liberar o acusado, pois avaliou que os elementos não eram suficientemente graves para mantê-lo encarcerado.
O entendimento do juiz causou estranheza ao Ministério Público, pois a quantidade de entorpecentes foi considerada expressiva para os municípios da região do Vale do Ribeira, apesar da venda de drogas em Miracatu ser pequena. Por isso, a Promotoria apresentou um recurso à Justiça no qual solicitava pela prisão do suspeito, mas ainda não houve julgamento da ação.
Flagrante de roubo
Thiago Pedro Pagliuca dos Santos também concedeu liberdade provisória a um homem acusado de participar de outro assalto, desta vez com uso de violência, pois houve tiroteio, ocorrido no dia 20 de abril de 2018, na Rodovia Régis Bittencourt. Um homem foi preso no momento do crime - na época, havia outro juiz na cidade - e os demais foram detidos depois.
Segundo a denúncia feita pelo MP à Justiça, o trio abordou um caminhoneiro para roubar o veículo e o motorista foi levado como refém. Houve perseguição policial em alta velocidade na BR e, após os homens perderem o controle do caminhão, desceram atirando na direção dos policiais - a vítima do roubo foi atingida no braço.
De acordo com explicações do Ministério Público, o caminhoneiro seria ouvido no processo judicial por meio de carta precatória porque mora em outro Estado. Entretanto, tal procedimento é lento e pode demorar meses.
Porém, ao apreciar um recurso da defesa, no fim de janeiro deste ano, o juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos entendeu que a prisão era injustificável sem a conclusão do processo e decidiu pela soltura.
"Friso que o relaxamento da prisão preventiva por excesso de prazo, conforme entendimento pacífico da doutrina e dos Tribunais Superiores, não se confunde com a revogação da prisão em razão de fundamento superveniente que a torne desnecessária", escreveu. O suspeito foi colocado em liberdade.
Outros casos
O juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos também proferiu sentenças favoráveis a suspeitos de crimes com uso de violência em pelo menos outros três casos.
Em uma das situações, o magistrado determinou ao MP que oferecesse um benefício chamado de transação penal, reservado para pessoas sem antecedentes criminais e que tenham cometido delitos de baixa gravidade a um homem que estava preso preventivamente por crime de trânsito e com condenações anteriores cujas penas chegam a 27 anos de reclusão.
Na decisão, o juiz ressaltou que, por não haver trânsito em julgado das condenações, o suspeito deveria deveria ser agraciado com o benefício. No entanto, o MP discordou de tal posicionamento e se recusou a oferecer o benefício.
"Assim, o Ministério Público reitera a impossibilidade de oferecimento de transação penal, conforme anteriormente afirmado. No mais, a decisão proferida afronta os elementos mais comezinhos [triviais] do Direito Penal. Não cabe ao magistrado consignar em decisão judicial a presença dos requisitos da transação penal, uma vez que a medida em tela pressupõe
consenso entre o averiguado e o detentor da ação penal, ou seja, o Ministério Público, desde que cumpridos os requisitos legais", diz parte do documento elaborado pela Promotoria diante da solicitação do juiz.
No segundo caso, uma vítima reconheceu um suspeito de roubo - praticado por dois homens e com uso de arma de fogo -, preso seis meses depois com o telefone celular que havia sido levado na ação criminosa. A vítima também denunciou que um dos assaltantes havia ido até o trabalho dela para "tirar satisfações", segundo a denúncia da Promotoria.
Na sentença, o juiz Thiago diz que o roubo pode ter ocorrido, mas não ficou comprovado acima de "qualquer dúvida razoável", lança questionamentos sobre os fatos descritos pela vítima e diz que o aparelho de celular poderia estar em poder do suspeito por outros meios, até mesmo adquirido do verdadeiro roubado, prática que caracterizaria somente crime de receptação no Código Penal.
"Em um processo penal democrático, a mera contradição no interrogatório do réu não é suficiente para condená-lo pelo crime descrito na denúncia, se o bom senso e as provas produzidas levam a qualquer dúvida razoável no espírito do julgador. Inclusive é compreensível que a proprietária do celular, tendo sido vítima do réu (de furto, apropriação de coisa achada ou mesmo roubo), possua por ele um desejo de vingança, querendo que ele seja punido além do que permite a lei. Assim, suas palavras devem, no caso concreto, ser consideradas com reservas", decidiu o juiz.
Por fim, o Ministério Público estadual também discordou do entendimento do juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos em um processo criminal no qual o suspeito é acusado de um roubo, ocorrido em 2012 na cidade de MIracatu, onde a vítima reconheceu o suspeito como o assaltante na delegacia em que a ocorrência foi registrada e, posteriormente, em juízo.
Mesmo assim, o magistrado decidiu soltar o réu por acreditar que "a despeito de a vítima ter reconhecido o réu pessoalmente no seu estabelecimento comercial, somente consta do inquérito o auto de reconhecimento fotográfico, o que prejudica ainda mais a credibilidade deste meio de prova", conforme escreveu o juiz na sentença, ressaltando a possibilidade de haver confusão da vítima no reconhecimento.
MP questiona decisões
O Ministério Público estadual se mostrou crítico em relação ao entendimento do juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos nos casos citados na reportagem do R7. O órgão tem ajuizado os recursos necessários para reverter as decisões proferidas por ele.
Para promotores envolvidos nos casos citados, o juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos aproveita-se da falta de recursos eficientes de acusação e da demora no julgamento de recursos contra suas sentenças para decidir sempre contra o Ministério Público, libertando autores de crimes graves sem fundamento jurídico para tanto.
A atitude do magistrado, segundo o MP, gera insegurança na população de uma das regiões mais pobres do Estado, que vive como refém do tráfico de drogas e da violência em geral, além de causar descrédito em todas as instituições de defesa da sociedade civil.
Postagem polêmica
O magistrado ficou conhecido por uma publicação polêmica nas redes sociais na qual era apontado como um magistrado que soltaria criminosos. Na postagem, Thiago aparece em um bar, sorrindo e segurando uma placa com a frase "só vim pela comida". No entanto, abaixo da imagem dele, o autor do post escreveu também "só vim ser juiz para soltar todo mundo".
Outro lado
O R7 encaminhou um pedido de entrevista ou resposta aos questionamentos sobre o posicionamento do juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos ao Tribunal de Justiça de São Paulo.
Em nota, a Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo afirma que, por força de sua atribuição regimental, fiscaliza magistrados, servidores e os agentes delegados dos serviços extrajudiciais. O órgão informou ainda que acompanha muito proximamente os magistrados que estão em estágio probatório, pelo período de dois anos, para propor ou não o vitaliciamento.
Em relação ao juiz Thiago Pedro Pagliuca dos Santos, a Corregedoria Geral de Justiça diz que "o magistrado está sendo acompanhado, como todos os demais juízes substitutos. A Corregedoria Geral da Justiça não interfere na atuação jurisdicional do magistrado, que deve ser questionada na via recursal própria. Apenas interfere se constatar atuação temerária, ideológica ou política e contrária à lei, que ofendam a Lei Orgânica da Magistratura Nacional e o Código de Ética. Qualquer cidadão poderá pedir a aspiração de fato que entenda irregular".
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