Justiça determina reintegração de terreno ocupado no Jaraguá
A pedido da construtora, índios poderão ser expulsos do local. Juíza considera que ocupação já cumpriu seu propósito e que construção foi autorizada
São Paulo|Guilherme Padin e Gabriel Croquer*, do R7
A Justiça determinou nesta quarta-feira (5) a reintegração de posse do terreno ocupado no Jaraguá, zona norte de São Paulo, a pedido da construtora Tenda, para expulsar os índios que ocupavam o local. Eles estão no terreno desde o dia 30, em protesto contra o desmatamento promovido pelas obras de um condomínio na região. Os indígenas guaranis afirmam que seguirão no local, apesar da determinação.
Em sua decisão, a juíza Maria Cláudia Bedotti afirma que os índios não poderiam permanecer no imóvel indefinidamente, considerando que o propósito da ocupação ("realizar uma cerimônia fúnebre"), já havia sido cumprido. No último domingo (2), grupos fizeram um plantio simbólico de 200 árvores, em protesto contra as árvores já derrubadas no local.
Segundo habitantes da comunidade, a construtora havia afirmado em reunião que mais de 4.000 árvores – na região de Mata Atlântica – seriam derrubadas. A empresa nega e informa que a autorização da prefeitura determina o corte de 528 árvores, o replantio de outras 549 no local e a doação de 1.099 mudas para o município.
Além da derrubada de árvores, a morte de animais do local e a perda de colônias de abelhas também compõem as reclamações dos habitantes das aldeias ao redor da área.
A área na qual a construtora quer realizar as obras pertence à RBCV (Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo), certificado conferido pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) a áreas que compreendem ecossistemas terrestres, marinhos e costeiros, onde deve-se promover soluções que conciliem a conservação da biodiversidade ao uso sustentável.
Na intimação, Bedotti argumentou que a construtora já obteve o alvará para a remoção das árvores e que a área ocupada não é reivindicação fundiária indígena, o que poderia configurar como transgressão ao Estatuto do Índio. Segundo a prefeitura, o processo já foi aprovado junto à SVMA (Secretaria do Verde e do Meio Ambiente) e ao Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico Artístico e Turístico).
Segundo relatos dos ocupantes, a polícia e os advogados da empreiteira chegaram armados ao local com o pedido de reintegração de posse. Os indígenas seguem no terreno, se recusando a sair.
A ideia do movimento é, com apoio de outras entidades, baixar uma liminar deste pedido através da Defensoria Pública da União.
Construção
A incorporadora iniciou recentemente, nas imediações do terreno ao lado da Aldeia Ytu, em frente à Aldeia Pyau e no entorno da Aldeia Yvy Porã, as obras de construção de um empreendimento imobiliário com de cinco prédios para 800 pessoas. A prefeitura aprovou a construção em 10 de janeiro de 2020.
Em nota, a gestão municipal informou que o perímetro objeto da aprovação é classificado como "ZEIS (Zona Especial de Interesse Social) - com vegetação já demarcada como bosque - e não está sobre área indígena, não sendo necessária consulta a órgão de defesa de direitos indígenas".
A prefeitura diz que a recompensação pelos danos ambientais já foram firmadas junto à SVMA (Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente), mas que mesmo assim optou por suspender por sete dias a obra, a partir do dia 31. Neste período a comunidade poderá provar irregularidades nas obras.
Em nota, a Tenda afirmou que "respeita os questionamentos da comunidade indígena local" e que segue à disposição das autoridades e da sociedade civil para qualquer esclarecimento. A construtora também reiterou que o projeto prevê preservação de 50% da área.
Veja a resposta da construtora na íntegra:
A Construtora Tenda esclarece que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu liminar para a reintegração de posse do terreno que abrigará empreendimento imobiliário destinado exclusivamente à moradia popular. A companhia respeita os questionamentos da comunidade indígena local e reitera que o projeto prevê preservação de 50% da área. A empresa ressalta, ainda, que o empreendimento irá levar infraestrutura e saneamento à região, além de beneficiar até 2 mil famílias de baixa renda, por meio do programa MCMV (Minha Casa, Minha Vida). A primeira fase do projeto favorece 880 famílias e atende a todos os procedimentos necessários para a legalização do empreendimento nas três esferas do Executivo, incluindo autorização para o manejo arbóreo, que prevê a supressão de 528 árvores, o replantio de outras 549 no local e a doação de 1.099 mudas para o município. A Tenda segue à disposição das autoridades e da sociedade civil para qualquer esclarecimento
*Estagiário do R7, sob supervisão de Ana Vinhas