Modelo negra presa estava a 85 km longe do local do crime, diz defesa
Jovem foi condenada a 5 anos de prisão. Família de Bárbara Querino organiza ato unificado com outras famílias de presos com indícios de inocência
São Paulo|Plínio Aguiar e Kaique Dalapola, do R7
A estudante e modelo Bárbara Querino, conhecida como Babiy, 20 anos, foi condenada a cinco anos e quatro meses de prisão pelo TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), no dia 10 de agosto deste ano. Ela é acusada de ter participado, junto com outros quatro rapazes, de um roubo que aconteceu na tarde de 10 de setembro do ano passado no Morumbi, zonal sul de São Paulo.
A favor de Bárbara, a defesa apresentou à Justiça imagens e mensagens que mostram que ela estaria na cidade de Guarujá, no litoral paulista, a cerca de 85 km de distância, no mesmo dia e horário do crime. Também há o depoimento de seu irmão que teria confessado ter participado do roubo, mas afirma que ela não estava junto. Ele também foi condenado pelo crime.
Contra a modelo, o reconhecimento da vítima. Para o juiz Klaus Marouelli Arroyo, o reconhecimento é o suficiente e os indícios apresentados pela defesa mostram "imprecisão quanto às datas e horários nos quais Bárbara estaria no litoral, acompanhada de terceiros".
Desde o dia 16 de janeiro, Bárbara divide a cela com outras detentas no CPP (Centro de Progressão Penitenciária) de Franco da Rocha, na Grande São Paulo. A unidade está 33% acima da capacidade — 2.314 mulheres presas para 1.738 vagas. “Ela está muito abalada. Chora todos os dias. Já até emagreceu”, diz Fernanda Querino, mãe da modelo.
Primeiro contato com a polícia
Segundo uma amiga da acusada, a assistente social Mayara Vieira, de 23 anos, a primeira vez que Bárbara foi levada à delegacia foi por outro possível caso de roubo, em 4 de novembro do ano passado. Ela estava na rua próxima à casa onde moracom um grupo de amigas quando seu irmão, junto com outro rapaz, estacionou na via um veículo de luxo.
“Ele disse que tinha roubado o carro e pediu ajuda para um amigo para pegar os pertences”, afirma a amiga da modelo. Mayara era uma das amigas que estava no dia e viu o irmão da modelo chegando.
À reportagem, Mayara ainda conta que, em seguida, o irmão de Bárbara e outros dois rapazes teriam ido para uma rua debaixo guardar todos os objetos roubados em um “cativeiro”. Depois disso, policiais militares chegaram no local para verificar a denúncia de roubo ao carro de luxo.
Segundo o boletim de ocorrência, os PMs chegaram ao local que o carro roubado estava e, próximo do veículo, estava Bárbara, Mayara e um primo da modelo. De acordo com a assistente social, os policiais questionaram onde estariam os responsáveis pelo carro roubado e teriam dito que se elas indicassem os suspeitos, seriam liberadas.
Ainda conforme a assistente social, uma vizinha, com medo de represálias, teria indicado onde os suspeitos estavam. Para a Polícia Civil, os PMs disseram que as indicações foram feitas espontaneamente.
Os policiais teriam colocado Bárbara e os demais dentro do carro da polícia e foram até o suposto cativeiro. No local, encontraram o trio. No final da abordagem, todo o grupo foi levado ao 98° DP (Jardim Miriam). Nesta ocorrência, o irmão, o primo da modelo e outros dois rapazes foram indiciados, enquanto ela fora ouvida apenas como “partes”.
Na delegacia, Bárbara e os demais teriam ficado ao todo 16 horas dentro do veículo policial “esperando o delegado”, segundo Mayara. A modelo e uma outra amiga foram liberadas e os quatro jovens, detidos. “A Bárbara saiu no dia seguinte e foi direto prestar a prova do Enem”, conta assitente social. O sonho da modelo é ser jornalista.
Durante o período na delegacia, segundo a amiga, “o policial tirou foto das meninas, mandou para grupos de WhatsApp e de Facebook”. Ainda de acordo com Mayara, essas fotografias começaram a se espalhar pelas redes sociais e a Bárbara começou a ser apontada por internautas como responsável por outro crime.
Procurada pela reportagem, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) disse que "os supostos fatos citados à reportagem e qualquer denúncia a respeito de eventual irregularidade cometida por policiais devem ser formalizadas às Corregedorias das polícias Civil e Militar".
Exposição
Nos dias seguintes à essa abordagem e supostas fotografias tiradas por PMs, Mayara afirma que blogs e páginas em redes sociais expuseram fotos da modelo como suposta autora de roubos e estava foragida.
A assistente social conta que quando a modelo viu uma notícia sobre sua falsa fuga da delegacia, escreveu para os conhecidos em uma rede social que não tinha envolvimento com o assalto.
Dias se passaram e “a sensação era de que tudo tinha voltado ao normal”, relembra Mayara. No entanto, no dia 16 de janeiro deste ano, Bárbara recebeu a ordem de policiais para que fosse até a delegacia prestar um novo depoimento.
No DP, ela foi acusada de ter participado de um novo crime. Segundo a polícia, ela teria participado, juntamente com o irmão, um primo e um outro rapaz, de um roubo a outro carro de luxo e objetos de valor de uma família, na tarde de 10 de setembro de 2017. Ela ficou presa preventivamente.
De acordo com o processo, duas vítimas do assalto reconheceram a imagem de Bárbara como sendo uma das pessoas que cometeram o crime. Mensagens de WhatsApp e Facebook, fotos e vídeos foram apresentadas pela defesa à Justiça apontando que a modelo estava no Guarujá no dia 10 de setembro, quando aconteceu o crime.
A notícia sobre a prisão de Bárbara pegou de surpresa a família da jovem. “É algo que eu não esperava, porque ela não fez nada para ir para a cadeia. Ver a minha filha atrás das grades é pior do que colocar uma faca no meu coração”, diz Fernanda Querino, mãe da modelo.
No dia em que recebeu a informação de que sua filha tinha sido levada para o presídio, Fernanda estava no hospital recebendo atendimento médico por causa de uma tendinite. “Pensei que ia morrer”, diz.
Já Mayara afirma que os policiais apresentaram à Justiça apenas partes de imagens de câmera de segurança do dia que ela foi detida. A filmagem seria apenas o momento que a Bárbara e os demais estavam próximos ao veículo roubado. “Por que eles não mostraram toda a cena?”, indaga Mayara.
Segundo a SSP-SP, "o caso foi investigado e as provas testemunhais e períciais foram anexadas ao inquérito que foi relatado. A análise e a posterior condenação cabe ao Poder Judiciário".
Em juízo, os policiais civis que apuraram o caso disseram que participavam de várias investigações parecidas na região e, por isso, não se lembram se tinham as imagens de câmeras de segurança desse caso específico.