Notas do Ideb mostram a fragilidade do Ensino Médio em São Paulo
Anos iniciais do ensino fundamental apresentam boas notas, mas desempenho despenca no Ensino Médio. Escola na capital recebeu apenas 2,2
São Paulo|Plínio Aguiar, do R7
Em São Paulo, as escolas de ensino fundamental apresentam notas melhores que as de ensino médio, de acordo com avaliação feita pelo Ideb 2017 (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Para explicar a defasagem de uma etapa para outra e como solucionar esse gargalo na educação pública, a reportagem do R7 conversou com especialistas em ensino, professores e alunos de instituições avaliadas pelo governo.
No ano passado, data da avaliação, o Estado de São Paulo tinha 42,8 bilhões para gastar em educação. Em nota, o governo informou que aplicou toda a quantia no setor.
De maneira geral, as instituições de ensino fundamental têm se saído bem nos exames. Um dos exemplos é a escola estadual Professora Blanca Zwicker Simões, situada no Tatuapé, bairro nobre da zona leste de São Paulo. Com cerca de 915 alunos, a escola atingiu no 5°ano o índice de 8,1 no Ideb — a maior nota do Estado. “A nossa fórmula de sucesso se deve a duas palavras: comprometimento e participação efetiva”, diz a diretora, Solange Soares Ribeiro, que conta que essa é a segunda premiação que a escola recebe. A primeira vez que ganhou o prêmio foi em 2007, ano de lançamento do índice.
Segundo Ribeiro, todas as pessoas que trabalham na escola possuem um papel importante. “O resultado do comprometimento de todos foi divulgado pelo Ideb”, diz. “E, claro, os pais são todos participativos e esse papel no desempenho dos alunos é fundamental.”
“Muitas pessoas não gostam de ir para a escola. Eu gosto porque aprendo coisas novas e que me fazem pensar”, conta Gustavo de Nascimento Brasil, aluno do 5° ano. O estudante relata que a escola possui infraestrutura como merenda diária, professores a postos nas salas de aula todos os dias e material disponível atualizado. “Um dia um professor precisou faltar, mas tinha um substituto em seguida para nos dar aula”, relembra.
Por volta das 18h, horário em que termina as aulas, a pedagoga e mãe de Gustavo, Leite do Nascimento, já estava na saída da escola, pronta para pegar o filho. “Eu busco ele todos os dias e eles não autorizam ele ir com outro senão eu”, diz. “Muita gente tem preconceito contra escola pública, mas aqui eu garanto que não tem disso, porque é uma escola muito boa”, reconhece.
No entanto, um gargalo entre o fundamental e médio é perceptível com base nas avaliações federais. A educação agrava, os alunos entram no ensino médio com conhecimento defasado e o resultado é visível nas notas. A escola que recebeu a melhor nota foi a Martin Luther King ETEC, com 6,6 para o 3° ano — nota que, ainda sim, é abaixo da meta proposta pelo governo.
Na época em que o índice foi lançado, o ministro da Educação, Rossieli Soares, chegou a classificar a etapa como um “desastre”.
De acordo com o principal avaliador de educação do país, a Escola Estadual Professora Zoraide de Campos Helu, localizada no km 22 da Anhanguera, recebeu a pior nota da rede pública, alcançando apenas 2,2. Os problemas relatados por alunos do ensino médio à reportagem do R7 são a constante falta de professores, vandalismo, sujeira e ausência de merenda.
“Pelo menos uma vez por dia nós não temos aula de alguma matéria, ou seja, todos os dias pelo menos um professor falta”, conta a aluna M. E. M., de 16 anos, do 2° ano. “E isso claramente atrapalha o nosso aprendizado.”
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Fezes são vistas em diversos espaços da escola, bem como entulhos como plásticos e papéis. Vidros das salas de aula estão quebrados e grades, destruídas. Segundo a aluna, o problema na escola é antigo. “Quando vamos comer, temos que olhar para cima para ver se algum pombo não irá defecar em cima da gente”, diz.
Para P. S., de 17 anos, aluno do 3º ano do ensino médio, os estudantes também têm participação no “caos em que a escola se encontra”. “Muitos acabam destruindo a escola em que estudam. Mesas riscadas, cadeiras quebradas e lixo no chão são feitos por alunos”, conta.
A dona de casa Patrícia Antônia de Cruz, de 37 anos, possui um filho que estuda na escola que recebeu a pior nota do Ideb. Ela também concorda com os problemas relatados pelos alunos e acrescenta: “toda hora troca de diretor. Teve uma que ficou duas semanas”.
Segundo Patrícia, a dificuldade do colégio de avançar em avaliações públicas se deve também ao governo. “Ele não dá atenção pra escola. Ele não dá atenção para nós, que estamos aqui marginalizados”, diz. “O que eles fazem é insuficiente e aí, não tem jeito, deu essa nota.”
O coordenador do curso de pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Ítalo Francisco Curcio, explica que a defasagem se deve aos anos finais do fundamental, o qual não apresenta boa nota. “Quando a criança vai chegando no 6° até o 9°, é deixado de lado. Aí o aluno chega incompleto no ensino médio, e para fazer uma recuperação desse sujeito não é fácil”, diz.
A solução, segundo Curcio, é dada em uma metáfora. “É como uma pessoa doente que vai para o pronto socorro. É preciso fazer um tratamento de choque senão ela morre. Da mesma forma, os alunos. É necessário colocar o estudante na UTI educacional, porque se não vai morrer no ensino médio”, compara.
Existe uma diferença de infraestrutura nas escolas públicas, em instância municipal e estadual, de acordo com o coordenador. “Não é toda escola que tem laboratório de química, sala de computação bem equipada, professores fixos e substitutos, entre outros fatores”, conta. “E para mudar os níveis não satisfatórios do ensino médio, isso precisa melhorar.”
Questionado sobre a nota da educação no Estado de São Paulo, o coordenador é categórico: 5. “Friamente os indicadores dizem que está bem, mas na prática é bem diferente”, explica.
Secretaria da Educação do Estado
Por meio de nota, a secretaria informou que os resultados do Ideb "evidenciam a necessidade de aperfeiçoar os ensinos". A pasta reconhece resultados importantes, o esforço dos profissionais da rede estadual, porém, "ações como a valorização do professor e o investimento em tecnologia de ponta, com lousas digitais, são fundamentais para avançar a qualidade do ensino".
A partir do ano que vem, alunos da 2° e 3° séries do Ensino Médio irão poder complementar a formação com cursos técnicos a distância por meio do Centro Paula Souza. Para o Ensino Superior, a proposta (daqui a pouco mais de um ano) os alunos que se formam na etapa anterior tenham acesso gratuito a uma vaga na Universidade Virtual do Estado de São Paulo, "sem precisar fazer vestibular".
Disse, ainda, que o governo do Estado enviou um projeto de lei à Assembleia Legislativa autorizando um novo concurso para a contratação de R$ 15 mil PEB II. "Um reajuste já foi concedido este ano e um aumento de 10,15% está em negociação. Além disso, a prova de valorização pelo mérito será retomada depois de dois anos de hiato", comunicou.