A percepção de violência entre professores que dão aulas em escolas de periferia no estado de São Paulo é siginificativamente maior do que a observada entre aqueles que lecionam em unidades do centro, de acordo com levantamento realizado pelo Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) e pelo Instituto Locomotiva, divulgado na manhã desta quarta-feira (29). Os dados revelam que o número de docentes que se sentem, de alguma forma, ameaçados dentro dos colégios localizados em ambientes periféricos é o dobro do observado entre aqueles que dão aulas em bairros considerados melhor para viver: 89% contra 38%, respectivamente. O ataque ocorrido na região da Vila Sônia na última segunda-feira (26), quando um aluno atacou e matou uma professora a facadas, reflete esse dado. Inclusive, uma das funcionárias que foram vítimas dos golpes de faca dados pelo adolescente diz que "não consegue mais se ver em uma sala de aula". Outras ocorrências de ataques ou ameaças em unidades de ensino que ficam em regiões periféricas do estado também colaboram para que professores tenham essa compreensão, como os ocorridos no bairro Parque Jane, em Embu das Artes, Nova Petrópolis, em São Bernardo do Campo, e até o massacre de Suzano, em 2019, que teve repercussão internacional. Já a percepção de violência entre alunos que estudam em unidades de ensino localizadas em favelas é 10% maior que a observada entre os estudantes de outras regiões. Além disso, 80% de familiares de jovens que estudam em escolas de periferia também têm essa sensação, contra 68% do centro. "A comunidade escolar na periferia tem uma percepção de violência significativamente maior do que nas escolas de centro. Esse dado é relevante porque não existem políticas públicas eficientes específicas para essas regiões", opiniou Renato Meirelles, fundador do Instituto Locomotiva, que ressalta a diferença de públicos e classes de uma unidade de estudo para outra. Para o levantamento, o sindicato e o instituto ouviram 1.250 estudantes, 1.250 familiares e 1.100 professores. O objetivo, segundo Meirelles, é justamente "desenvolver políticas públicas de combate à violência nas escolas". A pesquisa revelou também que 19% dos professores sofreram violência nas escolas estaduais. Em números absolutos, são cerca de 40 mil docentes, de acordo com as estimativas do levantamento divulgado hoje. O bullying — com frequência, identificado nas unidades de ensino — pode ser um gatilho para motivar esse tipo de ataque, conforme apontam especialistas. Para a delegada e diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, Raquel Gallinati, os adolescentes que praticam tais atos "foram agredidos ou têm a intenção de agredir por algum motivo inexplicado" e, por isso, a "história se repete". "Os pais enviam os filhos para a escola acreditando que eles estão em um lugar seguro, mas não é isso que estamos vendo. De tempos em tempos, massacres em escolas são noticiados, mas nada de forma efetiva tem sido feito ou solucionado", afirmou. Quase metade (48%) dos alunos que estudam na rede estadual de São Paulo afirma ter sofrido algum tipo de violência nas escolas, ainda segundo o levantamento. Isso significa que cerca de 1,1 milhão de crianças e adolescentes foram agredidos nas dependências dos colégios. "Quando temos alunos estimulados a resolver divergências com violência ao invés do diálogo, isso deixa a população mais sucetível a ataques como o que ocorreu na última segunda. Isso tem relação direta com a cultura de ódio empregada na nossa sociedade", explicou Meirelles.