'Pode não parecer, mas as coisas estão indo bem', diz prefeito de São Paulo sobre Cracolândia
Ricardo Nunes (MDB) diz que operações apostam na dispersão de usuários e que, após prisão de traficantes, procura por serviços sociais e de saúde cresceu
São Paulo|Fabíola Perez, do R7
A região da Cracolândia, no centro da cidade de São Paulo, é palco de conflitos entre usuários de drogas e agentes de segurança pública há décadas. A cada nova administração no município, prefeitos tentam resolver o problema histórico de diferentes formas, sem sucesso.
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirma que a concentração de usuários na região central da capital é um problema social, mas também de segurança pública. “A cidade de São Paulo não vai aceitar que se tenha uma feira livre de venda e de consumo de drogas a céu aberto como se fosse algo normal”, disse ao R7, em entrevista exclusiva.
Nunes, que assumiu a prefeitura da cidade em maio do ano passado, após a morte do então prefeito Bruno Covas (PSDB), diz que “pode não parecer, mas as coisas estão indo bem”. Em frente a um conjunto de telas de onde pode observar quadrantes da cidade com registros de confrontos ou tumultos, Nunes afirma que “não há mais turismo do crack em São Paulo após as últimas operações policiais.
“Na praça do Cachimbo eles entravam com lonas, tinha 80 GCMs, passei para 160. Falei que só poderiam entrar lá fazendo revista, e compramos câmeras para a gravação. Quando a gente desidratou o tráfico, isso nos ajudou muito.”
A cidade de São Paulo não vai aceitar que se tenha uma feira livre de venda e de consumo de drogas a céu aberto como se fosse algo normal
As políticas voltadas para a região, segundo o prefeito, se destinam a usuários e ao combate do tráfico de drogas. “Temos duas frentes, a do usuário e a do traficante. Não é possível atenuar essa situação sem focar as duas questões”, diz. “Vimos o problema, e não vamos deixar embaixo do tapete.”
O plano de ação montado pela administração municipal para a região é, de acordo com Nunes, coibir o comércio de drogas e oferecer atendimento de saúde. Para isso, o prefeito afirma que as ações são pensadas de forma conjunta por distintas pastas e instituições: Secretaria de Saúde, Assistência Social, Direitos Humanos e Guarda Civil Metropolitana.
Ao governo do estado, Nunes pediu apoio das polícias Militar e Civil. “Aumentamos bastante o policiamento de militares e da Civil”, diz Nunes. Segundo o prefeito, o delegado Osvaldo Nico Gonçalves, indicado pelo governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), como novo delegado-geral da Polícia Civil, disponibilizou o Dope (Departamento de Operações Policiais Estratégicas) para acompanhar as ações na região.
Na Operação Delegada, realizada por meio de um convênio entre a prefeitura e o governo, na qual agentes voluntários da PM reforçam o policiamento da cidade durante suas folgas, o número de agentes foi de 1.200 para 2.400, segundo Nunes.
Pessoas apontadas como traficantes, explica o prefeito, utilizam usuários como escudo. “Foi necessário diminuir a força do tráfico para entrar com ações de assistência e saúde”, afirma. Segundo a administração municipal, foram realizadas mais de 120 prisões. “Ao quebrarmos esse elo, deixamos o usuário mais suscetível à nossa abordagem social e de saúde.” Hoje, segundo a prefeitura, existem entre 800 e 820 usuários de drogas no centro.
“Os traficantes criaram esse conceito de [a Cracolândia] ser um lugar com uma qualidade de drogas altíssima”, diz. “Quando se dá dinheiro aos usuários, cria-se um ambiente com uma disputa enorme. Virou um mercado interessante, e as grandes facções tomaram conta desse negócio. O Brasil inteiro sabia que tinha uma feira, hoje não tem mais turismo do crack em São Paulo.”
Ao quebrar o elo com os traficantes%2C deixamos o usuário mais suscetível à nossa abordagem social e de saúde
Em março, o esvaziamento das ruas da Cracolândia chamou a atenção de quem passava pela região. A concentração de usuários, conhecida como “fluxo”, se aglomerou em outros espaços, como a praça Princesa Isabel. As ações fizeram partes da Operação Caronte, deflagrada em junho do ano passado para prender pessoas suspeitas de tráfico.
Nunes afirmou ao R7 que as condições financeiras da cidade permitiram maior investimento. “Fizemos um trabalho forte de sanear a saúde financeira, que é o que eu mais entendo, e isso possibilita à prefeitura fazer ações que antes não poderiam [ser feitas]”, disse ele, que explicou ainda que a administração municipal se baseou em modelos de dispersão de cidades como Bogotá, na Colômbia, e Nova York, nos Estados Unidos.
À reportagem, Nunes apresentou o sistema de monitoramento das quadras de São Paulo e disse que tem participado pessoalmente das decisões de segurança, iluminação, assistência social e saúde. “Estou muito consciente do desgaste político que posso ter, mas estou disposto a enfrentar”, afirmou. Nunes diz que existem ainda 30 pessoas apontadas como traficantes procuradas pela Justiça.
Em relação aos usuários, o prefeito afirmou que a prefeitura realizou no sábado (4) uma ação na rua Helvétia para realizar exames de espirometria, que medem a quantidade de ar que uma pessoa consegue inspirar ou expirar, para mensurar os impactos do crack nessa população. Segundo o prefeito, os usuários serão encaminhados para tratamentos.
Após a dispersão dos usuários para a praça princesa Isabel, muitos moradores do local se queixaram do novo fluxo que havia sido criado. Em relação a isso, Nunes mostra o esvaziamento da praça por meio das câmeras que monitoram a cidade.
“Não é aceitável que as pessoas não tenham acesso às praças. A prefeitura tem que cuidar para que todos que moram e trabalham em São Paulo tenham acesso ao espaço público.” Segundo ele, moradores da região agora podem caminhar com filhos e animais de estimação naquela região. “Temos a polícia prendendo traficantes e o serviço social fazendo o acolhimento dos usuários.”