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Roubos de celular seguidos de extorsão crescem 8 vezes em SP

Impulsionadas por transações de Pix, ocorrências de agosto e setembro equivalem a 54% do total registrado só neste ano

São Paulo|Fabíola Perez, do R7

Impulsionados por transações com Pix, roubos e furtos de celular aumentam em SP
Impulsionados por transações com Pix, roubos e furtos de celular aumentam em SP

Os golpes que envolvem transações com Pix impulsionaram mais uma modalidade criminal em São Paulo. O número de roubos de celular seguidos de extorsão aumentou em todo o estado em agosto e setembro. De acordo com um levantamento realizado pelo Departamento de Pesquisas em Economia do Crime, da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado), o roubo desses aparelhos seguido de ameaças, sequestros e violência equivale a 54% de todos os registros do ano e corresponde a um número oito vezes maior na comparação com o mesmo período no ano passado.

“Os dados demonstram uma mudança no comportamento criminal e sugerem uma relação entre os dois tipos de crime com uma tendência de aumento”, explica Erivaldo Vieira, professor de economia da Fecap.

A pesquisa, elaborada com base em dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, revela que, enquanto foram registrados 38 casos de roubo de celular seguido de extorsão em 2020, ano marcado por medidas de isolamento em decorrência da pandemia do coronavírus, o período de janeiro a setembro de 2021 tem 83 registros. Nos meses de agosto e setembro houve 45 boletins de ocorrência. No mesmo período do ano passado, tinham sido registrados cinco casos.

O coordenador do Departamento de Pesquisas em Economia do Crime da Fecap afirma que esse aumento, além de estar ligado à retomada das atividades, teria relação direta com a popularização do sistema de pagamento por meio de Pix. Com a explosão do número de ocorrências que envolvem esse tipo de transação bancária, as vítimas são obrigadas a ceder senhas de aplicativos de bancos para realizar transferências rapidamente. “Trata-se de um efeito dessa possibilidade de fazer operações instantaneamente. A criminalidade acaba inovando na forma de agir”, diz.


Guaracy Mingardi, analista criminal e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ressalta que as dinâmicas criminais se modificam rapidamente, adotando novas táticas e estratégias de atuação. “No começo do século, explodiu o número de sequestros, a polícia começou a se especializar para coibir [esses crimes]. Depois vieram os roubos a banco, que também se transformaram nos megarrobous”, explica. “Essas modalidades agravadas pelo Pix devem evoluir até que os benefícios sejam inferiores aos custos ou até a polícia chegar aos grandes grupos.”

Em relação aos roubos e furtos de celular, Erivaldo Vieira explica que se trata de crimes sazonais. “Todos os anos, os dados demonstram que a modalidade cresce entre os meses de novembro e março”, afirma. “Nesse período, as pessoas vão mais para as ruas, festas, confraternizações, e o pico desse tipo de registro ocorre no Carnaval. Mas no próximo ano deve haver um crescimento já nos meses de fevereiro e março com o retorno das aulas em universidades.”


Essas modalidades agravadas pelo Pix devem evoluir até que os benefícios sejam inferiores aos custos ou até que a polícia chegue aos grandes grupos

(Guaracy Mingardi, analista criminal e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública)

Já no que se refere aos crimes de extorsão, que ocorrem não somente nos casos de roubos de celular como em outros crimes patrimoniais, o professor de economia afirma que há um elevado índice de subnotificação. “A cada dez ocorrências desse tipo de crime, somente duas são registradas em boletim de ocorrência”, diz Vieira. Isso porque, segundo ele, as pessoas têm medo de sofrer ameaças. “Elas não têm esperança de recuperar o dinheiro, tampouco o aparelho, então não fazem o registro. Daí a subnotificação.”

Além das características específicas que explicam o aumento de cada uma das modalidades criminais, há ainda, segundo o professor, o fator relacionado ao isolamento decorrente da pandemia. “O crescimento no número de roubos de celular [é maior] à medida que a economia volta à normalidade. Os índices vão retornando ao que eram”, afirma. “Os casos de extorsão, porém, tiveram um aumento superior ao dos demais tipos de crime.”


De acordo com a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, a variação do número de ocorrências de crimes patrimoniais ao longo do mês de setembro foi impactada principalmente por casos que envolvem equipamentos eletrônicos e veículos. Segundo o órgão, a atipicidade de 2020 em decorrência das medidas sanitárias e restritivas adotadas em razão da pandemia deve ser levada em consideração. A pasta informou ainda que, na comparação entre o período de janeiro e setembro de 2021 com 2019, houve uma redução de 15% nos casos de roubo de celular na cidade de São Paulo.

Investigações insuficientes

Para coibir essa modalidade criminal, o analista Guaracy Mingardi afirma que é necessário modificar as estratégias de policiamento e investigação. “É preciso ir atrás de grupos mais organizados e trabalhar com a investigação sobre a receptação de roubos de celular”, diz. “A polícia precisa investigar com profundidade, levantar antecedentes criminais dos receptadores antes que sejam levados à Justiça.” Mingardi ressalta, entretanto, que nos últimos anos a Polícia Civil vem enfrentando obstáculos cada vez mais frequentes às investigações. “É uma questão nacional porque a maior parte dos governos está preocupada em investir nas polícias militares como uma forma de manter a ordem. As equipes da Civil têm diminuído e se burocratizado cada vez mais."

Os dados demonstram que a modalidade cresce entre novembro e março. Nesse período as pessoas vão mais para as ruas%2C festas%2C confraternizações

(Erivaldo Vieira, professor de economia da Fecap)

Uma investigação mais eficiente sobre crimes patrimoniais, segundo o analista, está vinculada à existência de um banco de dados completo e de fácil acesso. “Outro caminho são os informantes. Mas, para que os investigadores tenham informantes, é preciso estar nas ruas percorrendo as fronteiras entre legalidades e ilegalidades”, afirma. No caso dos crimes que envolvem Pix, Mingardi diz que as investigações devem ocorrer com a ajuda da Justiça para que se obtenha a quebra de sigilo das contas e assim se chegue aos autores dos crimes.

Um levantamento realizado pelo Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo mostra que existiam até outubro deste ano 15.150 cargos vagos na corporação. Somente para as funções de delegado e investigador são 924 e 3.688 vagas sem profissionais, respectivamente. “A falta de estrutura do Estado não permite que a gente trabalhe com a nossa potencialidade. A polícia tenta antecipar os passos da criminalidade, mas com esse déficit há uma limitação”, afirma a delegada Raquel Kobashi, presidente do sindicato. Segundo ela, os investigadores atuam com sobrecarga de trabalho e, muitas vezes, deixam a instituição em decorrência de problemas psicológicos.

Analista criminal afirma que polícia deve investigar receptadores de celular em SP
Analista criminal afirma que polícia deve investigar receptadores de celular em SP

De acordo com a delegada, o aumento dos crimes de roubo de celular seguido de extorsão em São Paulo está ligado às possibilidades oferecidas pelo aparelho. “O interesse está no montante permitido pela transferência por meio dos celulares”, explica ela, que também acredita que com a proximidade do fim do ano a modalidade criminosa pode aumentar.

Cidades com mais roubos e furtos de celular

A pesquisa da Fecap apontou ainda as dez cidades com maior número de roubos e furtos de celular do estado. No topo da lista, a capital paulista registrou 7.836 roubos e 6.048 furtos em setembro. Também em setembro deste ano, foram registradas 23.706 ocorrências envolvendo os aparelhos celulares, das quais 13.097 de roubos e 10.609 de furtos, em todo o estado. Em comparação a agosto, houve uma queda de 3,8% nos roubos e um aumento de 13,62% nos furtos.

No entanto, na comparação dos dados de setembro com o mesmo período de 2020, o número de ocorrências aumentou 5,51% em relação aos roubos e 52,08% no que se refere aos furtos. O resultado, segundo Erivaldo Vieira, indica os efeitos do aumento da circulação de pessoas com a redução de restrições sanitárias no estado.

A polícia tenta antecipar os passos da criminalidade%2C mas há um déficit de mais de 15 mil vagas na instituição%2C o que impõe limitações em nossa atuação

(Raquel Kobashi, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo)

Na capital paulista, os dez bairros com maior número de roubos reúnem 2.050 ocorrências em setembro, o que representa 26,1% dos casos registrados no município. Entre eles estão a região do centro, Capão Redondo, República, Campo Limpo, Grajaú, Jardim Ângela, Cidade Ademar, São Mateus, Cidade Tiradentes e Sapopemba. “O centro se destaca por ter uma significativa população flutuante em relação aos demais bairros”, explica o professor Vieira. Nos demais bairros periféricos, ele destaca que existem áreas e terrenos abandonados, sem câmeras e policiamento, em que pessoas circulam e ficam mais expostas aos roubos e furtos.

Segundo o professor de economia, com a retomada das atividades e a aproximação das festas de fim de ano nos próximos meses, essas modalidades criminais devem ganhar força. Entre as dez cidades com maior taxa de roubo, foram registradas 10.337 ocorrências. Guarulhos, por exemplo, teve um crescimento de 10,42% nos registros. Santo André, Itaquaquecetuba e São Bernardo do Campo tiverem reduções de ocorrências de 17%, 16% e 6,5% respectivamente.

“Todas essas cidades têm alta densidade demográfica, o que se relaciona com o número de ocorrências”, diz Vieira. De acordo com ele, espera-se que nos próximos meses ocorra um crescimento dessas dinâmicas criminais também em cidades litorâneas.

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