Seguranças que agrediram jovem negro em Metrô de SP são afastados
Imagens mostram funcionários torcendo braços e aplicando golpe mata-leão para imobilizar adolescente. Polícia abriu inquérito para apurar o caso
São Paulo|Fabíola Perez, do R7
Os três seguranças do Metrô de São Paulo que abordaram um jovem negro de 14 anos na estação Tamanduateí, no domingo (8), foram afastados de suas atividades, segundo a Companhia do Metropolitano de São Paulo. O caso em que o adolescente foi levado para uma sala, onde teria sofrido agressões para confessar que não havia sido ameaçado e que teria praticado roubo, foi registrado em vídeo por testemunhas que passavam pela estação.
Segundo a advogada que acompanha o caso, Ana Paula Freitas, o afastamento dos funcionários é necessário, mas, para ela, a companhia não cumpre as obrigações e não ameniza os danos causados ao adolescente e a sua família. "Os fatos são graves, os seguranças exibiram a falta de preparo e de conhecimento das leis, principalmente no que concerne a proteção com a infância", afirma.
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A advogada afirma ainda que o Metrô deveria auxiliar na investigação e entregar as gravações do dia da abordagem, uma vez que as testemunhas apontam que as agressões ocorreram perto das câmeras de segurança.
"É importante que o Metrô tenha reconhecido a atuação abusiva de seus seguranças. Que não seja uma ação apenas de marketing diante da repercussão do caso", afirma Ariel de Castro Alves, advogado especialista no direito de crianças e adolescentes. "Que possa servir de exemplo para evitar outros casos como esse. O padrão de conduta dos seguranças precisa ser modificado."
Para o especialista em Direitos Humanos, o Metrô deveria fazer convênios e parcerias com entidades sociais e órgãos públicos para ter profissionais capacitados para realizarem abordagens adequadas de crianças, adolescentes e adultos em situação de rua, trabalho infantil, mendicância e vendedores. "Não deveriam promover limpeza social por meio da violência de seus seguranças."
Aboragem e agressão
O jovem foi agredido com tapas na cabeça e pressionado a fazer uma confissão de roubo. "Ele estava muito assustado nos momentos em que ficou lá dentro", afirma Ítalo Cardoso, membro da Comissão de Direitos Humanos e do Grupo de Ações Emergenciais da OAB, que acompanhou o caso.
O jovem permaneceu na sala do Metrô por mais de uma hora na presença de agentes de segurança. "Os usuários só puderam acompanhar a abordagem do lado de fora da sala", diz o advogado. "Deram tapas na cabeça dele. Um dos agentes mostrou o celular que estaria gravando e disse que ele tinha que confessar que teria cometido roubo", diz.
De acordo com a advogada que acompanha o caso do jovem, Ana Paula Freitas, os seguranças foram hostis ao detê-lo. "Ele levou muitos socos na cabeça, estava com muita dor", afirma. "Ele contou que, com um celular vermelho, foi obrigado a gravar um vídeo negando que tivesse apanhado", diz. Depois, segundo ela, teriam o obrigado a confessar o roubo. "O que mais o impressionou foi a presença de uma policial militar de folga que entrou na sala com eles, tomou um café, não ajudou e se omitiu."
O decreto nº 15.012, que aprova o regulamento de transporte, tráfego e segurança do Metrô, estabelce que o Metrô deve prestar assistência ao público e considerar, como sua principal tarefa, a segurança do usuário, dedicando todo o esforço em manter a regularidade e a rápida realização do serviço de transporte. "O discurso dos seguranças do metrô é que eles têm poder de polícia, mas essa lei é para regular o serviço de transportes", afirma Freitas. "O que eles podem fazer é conduzir a pessoa para fora da estação, mas não fazer uso de violência pura."
Segundo Cardoso, o Metrô alegou que as câmeras estavam desligadas e, por isso, não teria condições de apresentar as imagens. "Foi uma ação orquestrada. Não é um caso isolado, é uma constante. Em novembro, recebemos pelo menos cinco denúncias de pessoas agredidas por seguranças do Metrô."
Segundo o advogado, o jovem realizou exame de corpo de delito e voltou para a casa do avô, José Américo Vieira, onde vive. "O Metrô queria conduzir o menino até o IML (Instituto Médico Legal), mas não pode fazer isso porque é parte do processo", afirmou. "Além disso, eles não tem poder de polícia."
A OAB deverá acompanhar o inquérito policial e pedir providências ao Ministério Público. "A abordagem foi totalmente irregular, ele foi agredido, torturado. No final, ele estava tão cansado que só queria poder voltar para casa", diz Cardoso.
Em relação ao caso, a assessoria de imprensa do Metrô afirmou que a abordagem foi feita após a equipe de segurança ter sido alertada por uma passageira "sobre um menor com atitude suspeita". O órgão disse ainda que "ao ser abordado o menor reagiu e os agentes precisaram contê-lo. Uma PM, que desembarcava no local, tomou conhecimento do fato e prestou auxílio aos agentes de segurança."
O Metrô disse que ao receber uma denúncia "sobre qualquer ato suspeito, cabe aos agentes de segurança do Metrô a averiguação e condução à autoridade policial." Em relação ao vídeo que mostra funcionários torcendo os braços do menino e aplicando um golpe mata-leão para forçar uma imobilização, o Metrô afirmou que "está verificando se houve excesso e colabora com a investigação."
A reportagem entrou em contato com o 56º DP, da Vila Alpina, onde foi registrado o caso, mas não obteve retorno. O caso foi registrado como tentativa de furto, lesão corporal, abuso de autoridade. Por meio de nota, a SSP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo), afirmou que os seguranças e o adolescente foram ouvidos e liberadas.
"A unidade solicitou as imagens das câmeras de segurança e encaminhou o jovem para realizar exame de corpo de delito. As investigações prosseguem para esclarecer os fatos", declarou a pasta. Na filmagem, é possível ouvir usuários do Metrô dizendo que o jovem "não roubou ninguém" e que os agentes iriam machucá-lo.