Vagas para carros em calçadão no centro de SP são 'retrocesso', dizem especialistas
Segundo a prefeitura, ação abrirá espaços entre 19h e 2h, a fim de incentivar a circulação de pedestres e público do Theatro Municipal
São Paulo|Do R7
O projeto da Prefeitura de São Paulo (SP) para criar vagas de estacionamento de Zona Azul à noite nos trechos dos calçadões do centro histórico paulistano não foi bem recebido entre especialistas em urbanismo e mobilidade.
Linhas demarcatórias já foram traçadas em endereços da região, como a rua Marconi. Conforme informou a gestão municipal, serão, ao todo, 275 vagas: 200 na alameda Barão de Itapetininga e nas ruas Conselheiro Crispiniano e Marconi e 75 em endereços no entorno da região.
Há uma contradição, na avaliação dos urbanistas, na criação desses espaços para carros, uma vez que um dos objetivos informados pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) é justamente incentivar a circulação dos pedestres no local.
“Me parece uma medida errada, que vai totalmente na contramão de todas as tendências de desenvolvimento urbano contemporâneas em São Paulo, no Brasil e no mundo todo. Não há justificativa plausível para essa medida”, afirma Carlos Leite, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie, que prossegue: “Vai desconfigurar os calçadões e priorizar o carro, o estacionamento, e se complica a vida do pedestre”.
O urbanista ainda cita o fato de que, recentemente, a própria prefeitura havia anunciado um programa de recuperação do centro histórico paulistano, o que revela a incompatibilidade do projeto das vagas de estacionamento.
Para ele, a argumentação sobre facilitar o acesso do público ao Theatro Municipal não se justifica, uma vez que o entorno do local é uma das regiões de melhor acessibilidade de transporte público na capital paulista, com opções de linhas de ônibus e metrô.
Grandes metrópoles do mundo todo, comenta o professor, estão indo na contramão de medidas como essa. “Paris recentemente tem vetado e despriorizado de maneira robusta essas taxações, pagamentos para estacionamento”, destaca Leite, ao citar Nova York e Londres na mesma direção.
Se a intenção da prefeitura é facilitar o acesso para visitantes do teatro, sugere o urbanista, a gestão de Ricardo Nunes (MDB) poderia até fazer parcerias com estacionamentos próximos: “Tudo menos essa medida que foi anunciada agora, que realmente não tem nenhuma pertinência. Não tem nenhum cabimento”.
'Retrocesso'
“Só a ideia já seria surreal, mas eles estão realmente implementando. Precisamos judicializar esse absurdo”, afirmou nas redes sociais Daniel Guth, pesquisador em políticas de mobilidade urbana, que qualificou a gestão como um retrocesso.
A ideia da prefeitura, prossegue ele, fará com que, a partir das 19h, o espaço dos calçadões se torne “um imenso estacionamento de shopping, com carros entrando e saindo”.
Coordenador de mobilidade do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), Rafael Calabria também considera a medida retrógrada e avalia que não haverá benefícios a nenhuma parcela da população.
“Incentiva o carro, o trânsito, a poluição! Ignora pedestres e pessoas com deficiência”, escreveu.
A reportagem procurou a prefeitura para se posicionar sobre a medida e aguarda o retorno da gestão.