Sistema Cantareira continua em recuperação após crise hídrica
Luis Moura/Wpp/Estadão Conteúdo/07.01.2017
Em março de 2016, mais de dois anos após o início da crise hídrica no Estado de São Paulo, o governo anunciou que a Grande São Paulo não enfrentava mais problemas de falta de água e que os reservatórios que abastecem a cidade estavam em níveis seguros.
Atualmente, quase um ano após o anúncio do fim da crise, São Paulo vive uma situação de estabilidade, mas especialistas alertam que os cuidados e atenção com o setor precisam continuar para que o cenário de seca dos últimos anos não se repita.
Veja a seguir como está a situação do abastecimento de água em São Paulo:
RESERVATÓRIOS
A Sabesp informa que os sistemas de abastecimento de água da Grande São Paulo “seguem em plena recuperação”. De acordo com atualização da última quinta-feira (12), o índice global dos reservatórios atingiu 51,6% (67% se somadas às duas reservas técnicas). Em setembro, o Sistema Cantareira já havia ultrapassado a marca do mesmo período em 2013, antes da crise.
De acordo com Pedro Luíz Côrtes, geólogo especializado em gestão de recursos hídricos e professor da USP, é possível dizer que a situação está mais tranquila, mas, segundo ele, não há água de sobra no Estado.
— O que acontece é que o sistema de abastecimento da região metropolitana, desde 2005, ele opera muito próximo da capacidade, então não tem flexibilidade para superar eventos críticos como uma estiagem prolongada. A gente vive em uma situação crônica não de falta de água, mas de uma iminência de falta de água. Embora mais tranquila, não é uma situação de excedente de água. A gente ainda tem um nível histórico abaixo do desejável.
CALOR
As altas temperaturas registradas nos últimos dias em São Paulo estão dentro do esperado, de acordo com o geólogo. Segundo ele, nos anos de crise, o verão mais rigoroso que agora.
— Está dentro da normalidade. São meses muito quentes e se formos verificar, a gente teve dias de calor muito forte, mas em dezembro teve frente fria. Na média, estamos em um comportamento normal. O calor faz com que o consumo suba, mas a gente tem um bom comportamento [do clima] e isso dá um alento.
ECONOMIA E NOVOS HÁBITOS
Para o especialista, apesar do risco de aumentar o consumo de água após o anúncio do fim da crise, algumas mudanças nos hábitos vieram para ficar.
— Embora algumas pessoas voltem a um padrão normal, teve muita gente que manteve a economia e medidas como reuso de água. Algumas lições ficaram.
Ele acredita que com consumo 20% menor a qualidade de vida das pessoas é a mesma e a economia de água equivale a um Guarapiranga.
— Se a gente consegue economizar agora a gente poupa um recurso que talvez seja muito mais necessário no futuro.
As medidas implementadas pela Sabesp durante a crise para ajudar na economia de água — como o bônus e a multa na conta – foram encerradas em abril de 2016. O bônus começou a valer em fevereiro de 2014 e a multa passou a ser cobrada em fevereiro de 2015.
FALTA DE ÁGUA
Apesar do anúncio do fim da crise e da melhoria nos sistemas de abastecimento de água, ainda há relatos de moradores que encontram torneiras secas. É o caso de bairros da região da Brasilândia, na zona norte de São Paulo. Henrique Deloste, da associação de moradores da Brasilândia e Cachoeirinha, lembra que os moradores sofreram muito com a falta de água durante a crise e relata que ainda hoje há falta de água.
— Continua tendo falta de água a noite, geralmente a partir das 21h. Às vezes antes. Os bairros mais afetados são o Jardim dos Francos, Jardim Eliza Maria e Jardim Guarani.
Na época da crise, a Sabesp ampliou a redução de pressão de água na rede. Em muitos casos, moradores relataram falta total de água nesses períodos. Segundo a Sabesp, a redução de pressão é uma técnica “adotada desde 1997 para a redução de perdas por vazamentos e ocorre no período noturno, em horários de menor consumo de água”. De acordo com o site da companhia, na região da Brasilândia a redução de pressão começa às 23h.
NOVAS POSSIBILIDADES
Para Gilberto Tiepolo, gerente adjunto de conservação da organização ambiental TNC (The Nature Conservancy), é preciso olhar e investir em outras frentes além da captação de recurso e na ampliação de reservatórios.
— A crise não foi só um evento isolado. A crise não está superada ainda. A gente não pode baixar a guarda. As pessoas precisam continuar tendo uso racional da água e temos que ter um olhar muito carinhoso com a preservação dos recursos hídricos, das bacias e dos mananciais. A sociedade tem que ver que o papel das florestas e da conservação do manancial é muito importante.
Um recente estudo lançado pela TNC, com dados de 4.000 grandes e médias cidades de todo o planeta, mostra que em metade deles a conservação das fontes de água usadas no abastecimento custa até dois dólares por pessoa.
O estudo “Para além do manancial: benefícios ambientais, econômicos e sociais da proteção das fontes de água” mostra como soluções como reflorestamento e boas práticas de manejo agrícola podem influencias na segurança hídrica das cidades.
— Hoje estamos em uma situação que é inevitável investir em outras coisas. Tem que cuidar dessa fonte.
OBRAS HÍDRICAS
A Sabesp informa que, entre as ações para combater a crise, foram realizadas cerca de 500 obras de pequeno, médio e grande porte para aumentar o volume de água reservada, ampliar a capacidade de tratamento e interligar áreas de abastecimento. Para este ano duas grandes obras estão previstas para serem concluídas.
A Interligação Jaguari-Atibainha é a primeira delas, e terá capacidade média de bombeamento de 5.100 litros por segundo de água da represa Jaguari, no Vale do Paraíba, para a Atibainha, no Cantareira. Iniciadas em fevereiro de 2016, as obras estão 46% concluídas. O início da operação está previsto para o segundo semestre de 2017. O investimento total será de R$ 555 milhões e 7,5 milhões de pessoas abastecidas pelo Sistema Cantareira na Região Metropolitana de São Paulo serão diretamente beneficiadas.
A outra obra que deve ser finalizada neste ano é o novo Sistema Produtor São Lourenço, que contribuirá com até 6.400 litros por segundo de água tratada. A obra vai aumentar a capacidade de produção para o extremo oeste da Região Metropolitana de São Paulo, beneficiando até 2 milhões de pessoas nas cidades de Barueri, Carapicuíba, Cotia, Itapevi, Jandira, Santana de Parnaíba e Vargem Grande Paulista. Iniciadas em abril de 2014, as obras estão 54% concluídas. O início de operação está previsto para o fim do ano. A obra é realizada por meio de uma PPP (Parceria Público-Privada) e o investimento total será de R$ 2,21 bilhões.