Coberturas vacinais estão melhores que em 2021 e 2022, diz SBIm
Especialistas estão reunidos na Jornada Nacional de Imunizações
Saúde|Da Agência Brasil
Novidades como as vacinas para a dengue e para o vírus sincicial respiratório, além dos obstáculos já conhecidos do PNI (Programa Nacional de Imunizações), como o antivacinismo e a hesitação vacinal, serão temas de discussão entre especialistas que vão se reunir de quarta-feira (20) a sábado (23) em Florianópolis, capital de Santa Catarina, na Jornada Nacional de Imunizações.
Em entrevista à Agência Brasil, a presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), Mônica Levi, diz estar otimista em relação à retomada das coberturas vacinais, cuja queda já começou a ser revertida.
“É um trabalho bem árduo, porque quando você consegue causar medo e desconfiança, é muito difícil retomar isso. Mas sou uma pessoa otimista, acho que estamos caminhando. As coberturas vacinais já estão melhores que em 2021 e 2022. Acho que vamos conseguir, mas recuperar todo o estrago demora um pouco, demora para voltarmos a ser um exemplo”, avalia.
A sociedade científica é a organizadora da jornada que será realizada no ano em que o PNI completa meio século de vida. Para além de celebrar o feito, o evento vai contar com um fórum especial de saúde pública, em que representantes do Ministério da Saúde, da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), da Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) e de secretarias municipais e estaduais de saúde discutirão os próximos passos para a retomada das coberturas vacinais.
Confira a entrevista completa:
Agência Brasil: Nos últimos anos, a jornada foi realizada no contexto de queda das coberturas vacinais, pandemia de Covid-19, aumento do antivacinismo e, agora, com a vacinação de volta às prioridades do Ministério da Saúde. Esses temas deixaram o evento mais "quente", com discussões que despertaram maior interesse? Se, sim, como essa expectativa impactou a própria organização?
Mônica Levi: Eu não tenho essa percepção. Inclusive estamos com um número de inscritos menor que o habitual, mas tem a questão da localização, de ser no Costão do Santinho [em Florianópolis], em um lugar de mais difícil acesso, principalmente para o Norte e Nordeste, e um lugar mais caro. Então, o número de participantes vai ser menor. Agora, para os profissionais da saúde, esse tema é quente. Nós estamos sempre discutindo e, inclusive, organizando um fórum de saúde pública, que é a última atividade do evento, um fórum interativo com PNI, Unicef, Opas, Conass, Conasems, para dar um fechamento na jornada sobre muitos temas. Um fechamento que não é teórico, mas sobre o que podemos nos unir para fazer e que não estamos fazendo até agora. Agora, acho que saturou esse tema na mídia geral. Quando vejo postagem sobre o risco de retorno das doenças controladas no passado pelas baixas coberturas, a minha impressão é de que não tem dado mais ibope na população em geral. Acho que quem se interessa já foi contemplado e já leu, mas a gente ainda não reverteu esse cenário, e o tema tem que continuar a ser falado, temos que continuar vendo os obstáculos. E para os profissionais de saúde interessados o tema é quente, como sempre. As dificuldades na vacinação da Covid, a nova variante, o aumento do número de casos. Tudo isso continua sendo assunto atual.
Agência Brasil: Nesse cenário de desgaste do tema que você menciona, a comunicação fica ainda mais complicada. É preciso discutir uma inovação na comunicação?
Mônica Levi: Sem dúvida. É preciso inovar para sensibilizar de outra forma, ir a pessoas que não estão se importando e achando que a informação não é com elas. As estratégias todas têm que ser repensadas. Estamos em um momento em que a comunicação tem que ser diferente, não tem como fazer como era antes, quando dava certo.
Agência Brasil: A jornada também vai ser um momento de avaliar os obstáculos e os primeiros resultados dessas ações de microplanejamento e multivacinação lideradas pelo Ministério da Saúde?
Mônica Levi: Tem bastante espaço dentro da jornada para a saúde pública. Nos 50 anos do PNI e nos 25 da SBIm, estamos de mãos dadas. Então, essas temáticas vão ser muito discutidas. Esse microplanejamento já vem acontecendo, com ações pontuais em locais pontuais, diferenciados, e entendendo que o Brasil tem diversas realidades e que é necessário o microplanejamento para atender a todas as demandas e obstáculos, que são diferentes de uma região para outra.
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Agência Brasil: Sendo essa a primeira jornada desde a decretação do fim da pandemia de Covid-19, já vai ser possível fazer uma avaliação mais conclusiva sobre a pandemia e o papel da vacinação no controle dela?
Mônica Levi: Não é um tema que eu diria ser o principal. Tem muitas outras coisas, estratégias para a eliminação de meningococos, de HPV e câncer de colo do útero, novas vacinas e novos agentes infecciosos, como o vírus sincicial respiratório, que foi o vírus que causou mais casos de doenças graves e internações de crianças no pós-pandemia. Tem nova vacina de pneumonia, o herpes zoster, que tem vacina no privado, a dengue, com o lançamento de uma nova vacina. Temos novas vacinas incorporadas no calendário da SBIm e no PNI, mudanças de recomendações nos CRIE [Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais]. O programa da jornada está muito completo, com tudo isso incorporado. Não é só Covid. No ano passado já tivemos uma jornada presencial, e acho que não mudou muita coisa. O que mudou foi que a OMS decretou o fim da emergência em saúde pública, mas não mudou muita coisa. Mas é claro que vai ter. A primeira mesa já é sobre a Covid e o que esperar. A Covid não é o foco.
Agência Brasil: E qual tema você destacaria como um dos focos?
Mônica Levi: Um assunto muito importante que vai ser tratado é a hesitação — esse obstáculo que não é novo mas foi superlativado na pandemia, principalmente quando chegaram as vacinas de Covid-19. A gente começou a ter recusa de vacinação e hesitação com essas plataformas novas e tudo o que veio como questão política, que interferiu muito e deixou o Brasil superdividido. É um trabalho bem árduo, porque, quando você consegue causar medo e desconfiança, é muito difícil reverter isso. Mas sou uma pessoa otimista, acho que estamos caminhando. As coberturas vacinais já estão melhores que em 2021 e 2022. Acho que vamos conseguir, mas recuperar todo o estrago demora um pouco, demora para voltarmos a ser um exemplo.
Agência Brasil: Esse antivacinismo que chegou contra as vacinas de Covid já atingiu outras vacinas do PNI?
Mônica Levi: Com certeza já respingou. As pessoas começaram a desconfiar de onde vem a matéria-prima, os insumos, desconfiar politicamente. Respingou, sim.
Agência Brasil: Nestes 50 anos de PNI, o Zé Gotinha é um dos protagonistas e voltou a ser tratado como um símbolo nacional. Como vocês têm visto o resgate desse personagem?
Mônica Levi: Eu vejo de uma maneira muito positiva, porque ele é um ícone. Todo mundo quer tirar foto com o Zé Gotinha, por mais que de certa forma ele possa ser démodé para uma outra geração. Não sei quanto um adolescente se sente estimulado a se vacinar contra o HPV com o Zé Gotinha chamando. A gente também tem que pensar nisso, as vacinas não são só de crianças. Temos para todas as faixas etárias, e temos que ter uma maneira de conversar com todas as idades. Mas o Zé Gotinha é um ícone, e a presença dele nos eventos é fundamental.
Agência Brasil: Em relação às novidades, os avanços nas vacinas contra arboviroses como a dengue e a chikungunya estão entre as principais novidades?
Mônica Levi: Vai haver esse tema, principalmente sobre a dengue, porque a vacina já está aí. Mas também falando de zika e chikungunya. Mas essas não são as principais. Temos a vacina do vírus sincicial respiratório, HPV nonavalente, pneumocócica-15. São temas que serão bastante abordados.
Agência Brasil: As clínicas privadas estão perto de receber vacinas contra o vírus sincicial respiratório?
Mônica Levi: Ainda não tem previsão, mas está prestes a chegar. Ela já está sendo liberada pela FDA [agência reguladora de medicamentos e alimentos dos Estados Unidos], e alguns países já estão utilizando a vacinação materna para proteger o bebê, a vacinação com anticorpo monoclonal para o bebê, em dose única, e para o idoso. Então, têm coisas novas chegando.
Agência Brasil: E a SBIm já está discutindo como recomendar essa vacina em seus calendários?
Mônica Levi: É só quando estiver mais próximo que a gente vai começar a discutir tecnicamente e definir as nossas posições. Ainda não estamos fazendo isso, estamos lendo e acompanhando o passo a passo. Mas, por exemplo, a pneumo-15 já estava no calendário da SBIm antes de a vacina estar disponível.
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Agência Brasil: O antivacinismo também tem sido percebido nas clínicas privadas? Há menos procura? Mais dúvidas?
Mônica Levi: Com certeza. As clínicas do Brasil, as que não fecharam, estão com o movimento bastante reduzido comparativamente a antes da pandemia. Muitas clínicas fecharam, e outras estão tentando se manter, mas o movimento das clínicas no Brasil inteiro diminuiu muito.
Agência Brasil: Então, há uma crise nas clínicas privadas de vacinação?
Mônica Levi: Sim, com certeza.