Covid-19: 'Dias de febre são tensos', diz médico que se contaminou
Exposto diariamente a grande quantidade de carga viral, o endocrinologista Fábio Moura é um dos 31 mil profissionais de saúde que se infectaram no país
Saúde|Sofia Pilagallo, do R7*
Na linha de frente contra a covid-19, o endocrinologista Fábio Moura, 48, se infectou pelo novo coronavírus no começo de maio. Ele é um dos 31 mil profissionais de saúde que contraíram a doença no país, segundo o Ministério da Saúde (MS). Médicos, técnicos e auxiliares de enfermagem e, enfermeiros são os profissionais mais afetados, segundo o órgão.
Moura atua no Hospital Universitário Oswaldo Cruz, no Recife, referência no tratamento da covid-19 no Estado. Ele afirma que "nunca teve a ilusão de que não iria se infectar". “Eu sempre achei que teria a covid-19. Por maior que seja o nosso cuidado, a probabilidade de infecção é muito grande. Eu só pedi a Deus para não evoluir para um quadro grave”, relata.
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O médico afirma não ter doenças crônicas, mas ressalta que existem, no entanto, outros fatores além de doenças preexistentes que podem contribuir com uma piora do quadro. Uma delas é a carga viral, isto é, a quantidade de vírus à qual o infectado é exposto, ressalta.
Moura explica que, mesmo tomando todos os cuidados, os médicos da linha de frente são expostos diariamente a uma carga viral altíssima. Os especialistas que acabam se contaminando, portanto, têm mais chances de evoluir para quadros graves da covid-19.
Mas esse não foi o caso de Moura. Segundo ele, seu quadro foi de leve a moderado. O médico diz ter tido muita sorte, pois acredita que tenha sido contaminado durante uma intubação que sofreu complicações, ou seja, foi exposto a uma enorme quantidade de vírus.
A intubação foi realizada em 23 de maio. Dez dias depois, ele conta que surgiram os primeiros sintomas. “Nos primeiros cinco dias, tive tosse e outros sintomas de gripe, além de perda do olfato e do paladar, mas não tive falta de ar. Mantive uma saturação de oxigênio boa.”
A parte “mais assustadora” do quadro, segundo ele, se deu no sexto e no sétimo dia, quando teve febre e sentiu calafrios. “Os dias de febre são muito tensos, porque você sempre fica na expectativa do que pode acontecer."
A partir do oitavo dia, ele começou a sentir uma melhora, e no décimo já estava totalmente recuperado.
Durante todo o tempo em que esteve doente, Fábio ficou em casa, mas conta que seguiu um protocolo rígido de cuidados e higiene, para não correr o risco de contaminar alguém da família. “Tinha uma roupa e sapato específicos para ir ao trabalho. Tomava banho para sair do hospital, chegava em casa, botava minha roupa para lavar e tomava outro banho. Minha roupa era lavada separadamente. Além disso, eu dormia em um quarto separado da minha esposa e não compartilhava nada com ninguém. Tinha meus próprios pratos, talheres e copos."
Ele é casado e tem três filhos adolescentes: dois meninos de 13 e 18 anos, e uma menina de 15 anos. Nenhum deles têm doenças preexistentes. “Sabia que se eles pegassem, eles teriam uma chance menor de evoluir para quadros graves, mas a gente fica com medo mesmo assim. Tem muita gente jovem e saudável morrendo por aí.”
A possibilidade de que pudesse morrer foi algo que lhe passou pela cabeça. Ele conta que chegou até a conversar com os filhos sobre isso. “Passei para os meus filhos algumas orientações caso eu viesse a falecer. Eles ficaram um pouco tensos, claro, mas reagiram relativamente bem.”
Em 25 de maio, Moura realizou um teste que confirmou que ele havia desenvolvido anticorpos contra a covid-19. A preocupação, segundo ele, não acabou por aí. “Fiquei mais tranquilo com a notícia, mas sei que ainda assim, é preciso ter muito cuidado.” Ele ressalta à população a importância de usar máscara, lavar as mãos com frequência e respeitar o isolamento social.
Ele acredita que uma vacina será de grande contribuição ao combate da covid-19, mas alerta que a imunização não é o suficiente para impedir que as pessoas se infectem. “Nenhuma vacina tem 100% de eficácia. O que ela faz é reduzir o risco de infecção e o risco de o paciente evoluir para um quadro grave.”
Para ele, o mundo pós-pandemia será muito diferente do mundo que se conhecia até então. “As pessoas terão que rever a forma como se relacionam. Aqui no Brasil, principalmente no Nordeste, a gente tem a mania de se tocar, se abraçar, se beijar. Acredito que esses são alguns dos muitos hábitos que terão que ser abandonados”.
* Estagiária do R7 sob supervisão de Deborah Giannini
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