Covid: vacina contra variante pode combater outras mutações do vírus
Ensaio com cientista do Brasil mostra que anticorpo produzido por mutação é eficaz contra outras variantes do SARS-CoV-2
Saúde|Carla Canteras, do R7
A revista científica Nature publicou, na segunda-feira (29), um estudo preliminar realizado por um consórcio de laboratórios, universidades e pesquisadores da África do Sul, do qual faz parte o cientista brasileiro Tulio de Oliveira, que mostrou que plasmas sanguíneos coletados de pacientes infectados com a variante sul-africana e a E484K (mutação encontrada no vírus amazônico e africano) neutralizam plasmas de outras linhagens do SARS-CoV-2, responsável pela transmissão da covid-19.
O grupo de cientistas usou amostras da primeira e da segunda ondas da doença no país africano. Nos anticorpos retirados dos plasmas (parte líquida do sangue) coletados no começo da pandemia, não foram encontrados nenhum caso da variante da África do Sul e apenas uma amostra da mutação E484K, que tem aparecido mais na Europa desde fevereiro deste ano. Já, nos retirados na segunda etapa, a nova cepa era predominante.
Em laboratório, os pesquisadores aplicaram os anticorpos da primeira onda nas amostras de plasmas da segunda; e vice-versa. Os anticorpos do vírus original da covid neutralizaram 15 vezes menos a variante africana, se comparada com a eficácia dos plasmas da segunda onda na mutação dominante da África do Sul.
Em compensação, a neutralização cruzada do anticorpo da segunda onda no plasma da primeira teve uma queda de apenas 2 vezes, em relação à eficácia do plasma da primeira onda da pandemia na versão original do SARS-CoV-2.
Já a mutação E484K, que apareceu em amostras na primeira fase da pandemia, neutralizou os vírus predominantes da primeira e da segunda onda. No Twitter, o brasileiro se mostrou surpreso com a descoberta. "Embora tenhamos testado apenas um plasma provocado por E484K sozinho, ele neutralizou potentemente ambas as variantes. É interessante a 1ª onda com E484K neutralizar os dois vírus", publicou e celebrou o ensaio: "Comemorando conquistas essenciais para o bem-estar, saúde mental e enfoque científico", escreveu Oliveira.
Isso significa que a imunidade produzida por variantes é compatível às versões anteriores ou neutraliza efetivamente o vírus do começo da pandemia. Essa é a primeira evidência de que uma vacina projetada especificamente contra uma nova cepa poderia proteger contra linhagens circulantes da covid-19.
Como as variantes mais preocupantes do coronavírus foram semelhantes e surgiram de maneira independente no mundo, os cientistas acreditam que vacinas produzidas a partir de novas cepas tendem a ser mais eficazes no combate à covid-19.
“O estudo sugere coletivamente que existe a possibilidade de obtermos um imunizante amplamente eficaz contra todos os vírus causadores da covid-19 circulantes. Ele só precisaria ser projetado para as variantes atuais; possivelmente a da África do Sul", afirmou o médico Alex Sigal, do Instituto de Pesquisa em Saúde da África (AHRI), ao site do instituto.
De acordo com o AHRI, o próximo passo do grupo de cientistas é apresentar o ensaio aos profissionais de saúde inscritos em um ensaio atual de vacina da Johnson, em KwaZulu-Natal, província na África do Sul, onde foi feita a pesquisa.