EUA: separação das famílias pode gerar trauma nas crianças
Psiquiatras falam sobre situação e avaliam como a separação dos pais pode afetar o desenvolvimento psicológico das crianças
Saúde|Gabriela Lisbôa, do R7
Apesar de um juiz norte-americano ter decidido nesta terça-feira (26) que agentes de imigração dos Estados Unidos não podem mais separar pais imigrantes de seus filhos e que o governo precisa reunir as famílias que foram separadas, os reflexos do tratamento recebido na fronteira do país com o México ainda podem causar danos às crianças que foram separadas dos pais.
Esta é a opinião do psiquiatra Francisco Assumpção, coordenador do Departamento de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Associação Brasileira de Psiquiatria.
Para o médico, trata-se de um processo traumático, que pode afetar o desenvolvimento da criança:
“Pai e mãe são os grandes cuidadores do ponto de vista físico e afetivo, principalmente a mãe, sem ela as espécies não sobrevivem. O filho é frágil e a mãe, além dos vínculos de afeto, passa a sensação de segurança, de sentir acolhido, de não se sentir só”.
A polêmica envolve o governo dos Estados Unidos e famílias que tentam entrar no país sem os documentos necessários.Considerados imigrantes ilegais, pais e filhos são separados na fronteira e as crianças acabam sendo levadas para abrigos e separadas por idade e gênero – mesmo no caso de irmãos.
Segundo o Departamento de Segurança Nacional americano, o governo dos EUA separou mais de 2,3 mil crianças de suas famílias entre o fim de abril e o início de maio. O número de famílias que foram divididas em junho ainda não foi divulgado.
Há pelo menos 51 crianças brasileiras entre elas, segundo o Ministério de Relações Exteriores do Brasil.
Para Assumpção, a separação das famílias é uma violência que pode causar danos ao desenvolvimento psicológico da criança.
“Crianças que têm alterações de vínculo durante a idade precoce têm risco maior de desenvolver quadros depressivos e ansiosos e maior dificuldade de estabelecer relacionamentos com outras pessoas porque elas deixam de confiar nesses vínculos”.
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O médico explica que a criança também pode sofrer de estresse pós-traumático. Ele explica que uma criança é capaz de criar mecanismos de enfrentamento à diversas situações, mas as crianças menores se sentem como se tivessem sido sequestradas: “elas podem desenvolver um medo tão grande que se sentem impedidas até mesmo de sair na rua, de interagir com outras pessoas”.
A situação pode, também, trazer consequências para os pais. Assumpção explica que não necessariamente os adultos vão ficar com sequelas psicológicas, mas, para aqueles que já possuem uma tendência, a situação “pode ser um gatilho” para um quadro depressivo ou alguma outra complicação.
‘Cada caso é um caso’
Para a psicóloga Vera Zimmermann, do Departamento de Psiquiatria Infantil da Unifesp, antes de falar sobre as consequências da separação para as crianças, é preciso entender como era a vida familiar antes da chegada aos Estados Unidos.
“É importante não generalizar. Esta família que foi separada ele tentou entrar ilegalmente no país porque já corria um risco no lugar onde vivia e, por isso, achou que valeria a pena se expor a este novo risco ou é uma família cujos pais não foram capazes de avaliar as consequências do que estavam fazendo?” questiona a psicóloga.
Para Vera, se a família corria algum tipo de risco no lugar onde vivia, então a decisão de se arriscar em uma situação de ilegalidade pode ser justificada.
Se, por outro lado, os pais não foram capazes de avaliar o risco de uma possível situação traumatizante, a psicóloga acredita que existe a possibilidade das crianças já terem enfrentado outras “situações difíceis, decorrentes do descuido desses pais”.
“Se a família corre um risco de vida ou morte, então a decisão de se sujeitar a este novo risco se justifica. Mas se é só por uma questão financeira, a família precisa avaliar se vale a pena se arriscar a passar por uma situação que pode ser muito traumática”.
A especialista destaca que isso pode atrapalhar o desenvolvimento psicológico da criança.
“É uma situação traumática que pode acompanhar essa criança, fazer parte da vida psíquica e, até mesmo, impedir que ela, mais tarde, consiga ter forças para lutar por uma vida social melhor”.
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