Logística para repor oxigênio em SP vira desafio com escalada da covid
Abastecimento de cilindros era feito uma vez por semana, mas agora é diário; 21 mil não resistiram à doença na capital
Saúde|Bruna Vichi, do R7
Nas últimas semanas, o colapso do sistema de saúde público deixou de ser um risco e virou realidade em vários estados brasileiros. Com o aumento de casos de covid-19, faltam insumos e leitos para os doentes, enquanto os profissionais de saúde se esforçam para evitar a superlotação - ou ao menos dar um atendimento adequado a quem precisa.
Nos casos mais críticos, os hospitais superlotados puseram em risco até mesmo o fornecimento de oxigênio - o caso mais emblemático foi Manaus (AM) no início do ano. Na prática, ainda que com flexibilização da legislação pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e o impulso dos fabricantes em produzir o insumo, a luz amarela está acesa por todo o país.
O oxigênio hospitalar é usado em muitos tipos internação, não apenas em casos de covid-19. Segundo o coordenador do centro cirúrgico do HSPM (Hospital do Servidor Público Municipal), de São Paulo, o médico anestesiologista José Caruso, a intubação traqueal é utilizada em situações diversas para “pacientes que são submetidos à anestesia geral e, nos casos graves, de indivíduos que estão severamente enfermos, com sepses, infartos, traumas severos, que são portadores de infecções respiratórias graves etc".
Esses pacientes, portanto, não necessariamente infectados pelo coronavírus, continuam seus tratamentos nos hospitais ao mesmo tempo em que a pandemia alcança seu pior estágio no Brasil, completa Caruso.
A demanda por oxigênio e outros gases medicinais continua crescendo. Segundo a SMS-SP (Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo), em condições de normalidade e sem a pandemia, hospitais, postos de saúde, clínicas e demais centros médicos são abastecidos uma vez por semana com o insumo.
No entanto, por causa do aumento da demanda, impulsionado pela escalada de contaminação e infecções provocadas pelo vírus, o reabastecimento passou a ser diário e a logística se tornou desafiadora em uma cidade tão grande quanto a capital paulista.
O que antes acontecia apenas uma vez por semana, agora acontece mais de uma vez ao dia em dezenas de unidades espalhadas por São Paulo, não só em hospitais públicos, mas também nos privados.
Em São Paulo (SP), os hospitais públicos são abastecidos por empresas distintas segundo cronograma estipulado previamente, de acordo com as necessidades de cada um deles. Os tanques estacionários de oxigênio líquido são abastecidos, bem como os cilindros, que são aliados na luta pela sobrevivência na pandemia e oferecem consumo móvel.
Com as UTIs (unidades de terapia intensiva) superlotadas em todo o país, muitos pacientes estão internados em alas que não possuem a estrutura necessária para intubação e estão dependentes da oxigenação via cilindro.
De acordo com Caruso, em condições normais na atmosfera, o homem consome aproximadamente 21% de oxigênio, mas, em situações de doença grave, concentrações mais altas (40%, 50%, 70% e até 100%) podem ser necessárias.
O médico explica que é possível melhorar a oferta do insumo por meio de dispositivos não invasivos (cateteres, máscaras com reservatórios, máscaras de ventilação não-invasiva), mas a manobra pode não ser suficiente. “Nessas ocasiões, recorremos à intubação traqueal com oferta de altos valores de oxigênio, bem como o controle total da ‘respiração’ do paciente”, diz o especialista.
Independentemente da necessidade do paciente, o oxigênio é demandado e é parte fundamental da manutenção da vida dos pacientes. Caruso explica que, no caso de pacientes com covid-19, pode existir o comprometimento das funções pulmonares, situação na qual a oferta de oxigênio é primordial para a recuperação do doente.
O tempo que ele permanecerá na dependência do insumo é imprevisível, o que agrava ainda mais a situação do combate à pandemia. “A dependência de oxigênio vai depender não só da gravidade do quadro, como também da resposta individual ao tratamento e da condição clínica do indivíduo. Ao final, ainda devemos analisar se a doença deixou algum tipo de sequela que poderá, inclusive, torna-lo um pneumopata crônico e dependente de oxigênio suplementar para o resto da vida”, explica o médico.
Ele ainda reitera a importância do cumprimento das regras sanitárias para que o número de infectados não acelere o colapso do sistema de saúde, já sobrecarregado. No fechamento desta matéria, segundo o Boletim do Seade, o Estado de São Paulo registrava mais de 90% dos leitos de UTI e 81,8% dos leitos de enfermaria ocupados. Até agora, mais de 72 mil pessoas perderam a vida no Estado. Destas, mais de 21 mil na capital paulista.