Mais de 200 mil pessoas apresentam mal de Parkinson no Brasil
Prisão de ventre e pesadelos violentos estão entre os primeiros sintomas da doença; esta quarta (11) é considerada o Dia Mundial do mal de Parkinson
Saúde|Gabriela Lisbôa, do R7
Se estivesse vivo, o médico inglês James Parkinson completaria nesta quarta-feira (11) 263 anos. Por isso, o dia 11 de abril é considerado o Dia Mundial da Doença de Parkinson, ou mal de Parkinson. Ele foi o primeiro especialista a descrever detalhadamente os sintomas e os critérios de diagnóstico da doença que leva seu nome.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde, 1% da população mundial acima de 65 anos tem o mal de Parkinson. No Brasil, a estimativa é de que ela acometa mais de 200 mil pessoas.
Na maioria dos pacientes, os sintomas começam a aparecer a partir dos 50 anos. Mas a doença está diretamente ligada ao tempo de vida. Quanto mais a pessoa vive, maior a chance de ter, sendo que a maior prevalência é entre idosos com mais de 70 anos.
O mal de Parkinson é uma doença degenerativa que ainda não tem causas conhecidas. O que se sabe é que ela é desencadeada por uma série de fatores, que podem variar de um indivíduo para o outro e que envolve diferentes genes, mas especula-se que fatores ambientais também podem desencadear a doença.
Existe, também, uma forma hereditária do mal de Parkinson, mas ela é bem incomum. Nesses casos os primeiros sintomas começam a aparecer por volta dos 20 anos.
A característica comum entre todos os pacientes é a morte das células do cérebro, principalmente dos neurônios que ficam em uma região chamada de substância negra, onde é produzida a dopamina.
Esta substância é um neutrotransmissor produzido em diferentes áreas do cérebro. Ela desempenha funções cognitivas e motoras, como o controle dos movimentos e organização da memória.
Com o passar dos anos e o avanço da doença, neurônios de outras partes do cérebro também morrem, por isso é comum, a longo prazo, o surgimento de sintomas como a demência.
Primeiros sintomas
Parkinson é normalmente associado ao tremor, rigidez muscular e dificuldade de manter a postura ereta. Mas estes sintomas só aparecem quando os neurônios da substância negra estão reduzidos a cerca de 5%. Antes disso acontecer, a doença apresenta uma série de sintomas não motores, mudanças no organismo que nem sempre são identificadas, mas que podem ajudar na confirmação de um diagnóstico precoce.
Segundo o neurologista Antônio Galvão, do Hospital das Clínicas da USP, estes sintomas começam a aparecer cerca de 20 anos antes da doença se manifestar. O primeiro destes sintomas é a prisão de ventre. "Isso acontece porque a primeira área afetada pela morte dos neurônios é a do nervo vago, que entre outras funções, controla os movimentos involuntários do intestino", explica o médico.
Outro sintoma comum que marca as primeiras manifestações do Parkinson é um disturbio na fase REM do sono, aquela fase em sonhamos. A pessoa começa a ter pesadelos muito fortes e muito vívidos. "Alguns pacientes chegam a acordar gritando, desesperados", explica Galvão.
Redução na capacidade de reconhecer cheiros, alterações de humor e depressão são outros sintomas comuns que aparecem antes das dificuldades motoras.
Reconhecer esses sintomas e perceber que eles são um alerta para o mal de Parkinson é um desafio. Por isso, o diagnóstico deve ser feito depois de uma avaliação médica completa, o que o neurologista Henrique Ballalai Ferraz, do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) chama de avaliação em 360 graus.
“O profissional deve acompanhar o paciente de perto e tentar mapear o máximo possível todos os sintomas, mesmo aqueles não motores, para que o tratamento seja o mais assertivo”, explica.
Ferraz alerta que os médicos precisam estar muito atentos, pois a maioria dos sintomas da fase inicial são difíceis de perceber porque são vinculados a várias outras doenças.
Tratamento
O mal de Parkinson não tem cura e, como não mata, pode acontecer de um paciente viver durante décadas com o problema. Segundo o neurologista Henrique Ballalai Ferraz, mesmo assim é possível ter qualidade de vida. “Atualmente existem medicamentos que melhoram o desempenho das funções que o paciente necessita desenvolver, apesar de não impedirem a evolução da doença. Além disso, seguir a orientação do médico e manter uma rotina enérgica, tanto física quanto intelectualmente, favorecerá o sucesso do tratamento”, afirma.
O tratamento costuma ser feito com uma combinação de medicamentos que que ajudam a repor a dopamina, mas existem outras opções.
Um destes tratamentos é a neuromodulação, ou neuroestimulação profunda do encéfalo, que consiste no implante de eletrodos no cérebro. O procedimento ajuda a controlar os movimentos involuntários. Este é um tratamento bem conhecido e usado na área, mas nos últimos anos evoluiu, recebeu atualizações e novas tecnologias.
Uma das principais mudanças é a bateria, que agora chega a durar sete ou oito anos e evita que o paciente tenha que passar por procedimentos cirúrgicos frequentes para ajustar o equipamento. A bateria é colocada dentro da caixa torácica e ligada aos eletrodos por um fio.
De acordo com o neurocirurgião Cláudio Corrêa, coordenador do Centro da Dor e Neurocirurgia Funcional do Hospital 9 de Julho, a cirurgia é bastante simples e, em apenas dois dias, o paciente tem alta. "Um ponto importante é que a melhora dos sintomas pode ser sentida muito rapidamente”.
O neurocirurgião também explica que o procedimento que pode ser realizado com anestesia local e com baixo índice de complicação. No pós-operatório, após alguns dias, o neurologista acompanha o paciente ambulatoriamente, programando o eletrodo implantado e ajustando o tratamento com medicamentos, quando for o caso.
O médico lembra que há um ganho importante para a qualidade de vida do paciente. "Com isso, além de diminuirmos a quantidade de medicamentos, os pacientes voltam a fazer atividades mais básicas do dia a dia, como abotoar a camisa ou alimentar-se sem a ajuda de outras pessoas”, afirma.
Este tipo de tratamento é indicado para pacientes que não respondem satisfatoriamente à medicação e estão com os movimentos muito comprometidos.
A vida com Parkinson
Aos 48 anos, psicóloga Carmen Galluzzi descobriu que tinha mal de Parkinson. Chegar a esta conclusão foi difícil.
Ela passou três anos marcando consultas com os mais diversos profissionais da saúde, ninguém conseguia dizer por que ela estava tão fraca e cansada.
Foi uma amiga que percebeu que ela também estava lenta na realização dos movimentos e acendeu uma luz na busca pelo diagnóstico.
A confirmação só veio quando Carmen encontrou um neurologista especializado em problemas motores. Com o início do tratamento, ela viu a vida mudar. A seguir ela conta como é viver com o mal Parkinson.
"Meu nome é Carmen Sílvia Penha Galluzzi, tenho 57 anos. Atuei 33 anos na área educacional como psicóloga e psicopedagoga. Atualmente sou aposentada. Sou casada, mãe, avó e também parkinsoniana.
Fui diagnosticada com Parkinson há 9 anos.
Antes do diagnóstico, os sintomas não motores começaram a fazer parte da minha rotina como cansaço, fraqueza, rigidez muscular, depressão, intestino preso, alterações da fala, das expressões faciais, do sono, perda de apetite.
Os sintomas motores também eram presentes como lentificação, instabilidade postural, dificuldade na marcha e pouca movimentação com o corpo.
Entrar em contato com o diagnóstico e aceitá-lo foi uma longa caminhada, até porque toda doença vem carregada de estigmas, ideias generalizadas e conclusões precipitadas.
Receber o diagnóstico de uma doença que não tem cura é um divisor de águas, o antes e o depois.
A princípio vivi uma fase de luto acompanhada de medo, insegurança e ansiedade. Ir ao médico era uma tortura porque estava sempre esperando o pior.
Com o apoio da minha família resolvi lutar pela vida, acreditando que grandes mudanças são possíveis.
Elegi profissionais de minha confiança para poder seguir adiante e ser feliz com Parkinson. Optei por uma estratégia terapêutica multidisciplinar, aliando tratamento medicamentoso a fisioterapia, fonoaudiologia e suporte psicológico. O empenho foi tão grande que os resultados logo começaram a aparecer. Com o incentivo das pessoas a motivação foi se tornando cada vez maior para superar os obstáculos.
O suporte psicológico me ajudou a entender o que era meu, o que era da doença e assim maximizar os ganhos e minimizar as perdas.
Há dois anos frequento Associação Brasil Parkinson e Isso mudou a minha vida. Entrei em contato com outras pessoas que também passaram por momentos parecidos e percebi como cada um lida com que acontece em sua vida. O acompanhamento realizado por profissionais especializados em Parkinson trouxe um novo olhar e uma consequente melhoria na minha saúde.
Há um ano assumi pessoalmente e publicamente o que tenho. Além dos desafios trazidos pela própria doença temos que vencer os pessoais. Posso dizer que o enfrentamento da doença é libertador.
A doença de Parkinson é progressiva, degenerativa, mas é tratável. As pesquisas estão cada vez mais otimistas no tratamento dos sintomas e o impedimento da evolução da doença.
Hoje sei que o nome da doença é mais impactante do que a doença em si. A vida é muito maior que um diagnóstico.
Após 9 anos me sinto uma pessoa melhor no sentido de ser humana, humilde, paciente. A cada etapa vencida me fortaleço para iniciar a próxima.
A vida é dinâmica, estamos em constante estado de transformação. Somos autores da nossa vida e podemos escrever a nossa história. À medida que melhoramos, o mundo também melhora.
Nesse dia que comemoramos o Dia Internacional da doença de Parkinson, gostaria de deixar o meu recado: supere a doença e viva plenamente."