Metade dos pacientes internados apresentam índices de desnutrição
Dado é divulgado pelo Conitec, ligado ao Ministério da Saúde; casos no SUS estão relacionados à falta de comida anterior à doença
Saúde|Carla Canteras, do R7
A desnutrição hospitalar atinge 48,1% dos pacientes da América Latina e do Brasil, de acordo com dados apresentados pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia do SUS - Sistema Único de Saúde). Sendo que 12,5% deles são classificados como desnutridos graves.
Os casos são mais comuns nos hospitais públicos do que nos particulares, mas a nutrologista Melina Gouveia Castro, presidente da Braspen/SNPE (Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral), alerta que o problema já é conhecido no país desde 1970.
"Temos levantamentos na literatura médica sobre a desnutrição hospitalar desde a décado de 1970. Os últimos inquéritos são de 2016, mas o que vemos na prática é que essa realidade segue, tanto na redes pública quanto privada. Talvez tenha mais casos nos SUS, mas está relacionada à privação de alimentos anterior a doença. Os doentes desnutrem por causa da enfermidade, mas também não têm condição de comprar comida. Isso é mais difícil de se encontrar no setor particular", explica a médica.
Além das questões sociais, a nutrologista ressalta que a estrutura no tratamento também influencia no estado físico dos pacientes. "A maior diferença entre hospitais públicos e privados é o que temos de ferramentas para tratar a desnutrição, temos mais suplementação oral e produtos que podem ser usados para melhorar o estado nutricional do paciente", diz ela.
Os meios disponíveis para cuidar das pessoas com déficit nutricional são: alimentação via enteral, feito por meio da introdução de uma sonda no nariz, com a finalidade de levar um líquido contendo nutrientes para algum ponto do sistema digestivo; nutrição parenteral no qual é dado uma fórmula nutricional diretamente na veia; e a suplementação oral, produtos industrializados que são usado para complementar a alimentação, sendo líquido ou pastas, adicionadas às bebidas e aos alimentos.
Das três estratégias, os hospitais só não recebem o reembolso do SUS para a suplementação oral. De acordo com a presidente da Braspen, as outras estratégias são para casos extremos.
"Quando o paciente está desnutrido, às vezes, utilizamos medidas até mais agressivas. Mas muitas vezes, o doente está perdendo peso, força e os hospitais não compram os suplementos orais, porque não receberão o valor do SUS. Então, em relação àqueles pacientes que não conseguem se alimentar direito e acabam comendo menos do que precisam, nada é feito, a não ser vê-lo perdendo peso dia a dia", lamenta Melina.
Com o objetivo de amenizar a desigualdade estrutural entre os setores público e privado e diminuir o alto índice de desnutrição, a Braspen/SNPE entregou à Conitec um pedido para que essa estratégia alimentar passe a ser reembolsada pelo Ministério da Saúde.
"Se pensarmos em prevalência, a desnutrição é normal aos pacientes porque há muitos desnutridos. Mas, se perguntarmos se é algo prevenível, não é normal a desnutrição. Em alguns casos, não têm como evitar, por exemplo um paciente com câncer mais avançado, geralmente vai levar a um certo grau de desnutrição. Porém, conseguimos tratar e usar estratégias para melhorar, mesmo sabendo que é a doença causa o déficit", conta a médica.
A análise técnica do Conitec negou o pedido temporariamente e justificou. "Para determinar a eficácia e a segurança da tecnologia, além de aspectos como o custo-efetividade e impacto orçamentário da incorporação dos SNO no SUS, foi realizada análise das evidências científicas apresentadas pelo demandante. No entanto, a falta de padronização dos dados reduziu a confiança. Também houve divergências nos resultados observados, deixando incerto o efeito da suplementação oral."
Os custos também influenciaram: "A avaliação econômica apontou para um acréscimo de custos. A análise de impacto orçamentário projetou alguns cenários, referentes a um período de cinco anos, para uma população estimada em aproximadamente 3,2 milhões de pacientes internados, anualmente. Para o caso-base, demonstrou-se um incremento total de R$ 571,4 milhões, no período de cinco anos. Para os cenários alternativos apresentados com variação da proporção de população em risco nutricional entre 26,25% e 57% do quantitativo estimado, o impacto oscilou entre R$ 402,7 milhões e R$ 704 milhões, respectivamente."
Porém, a Braspen afirma que é o gasto pode ser visto com um investimento. "Estudos mostram que, quando melhoramos o estado nutricional, a internação do paciente é mais curta, tem menos infecção, fica menos na ventilação mecânica, cicatriza melhor as feridas. Teoricamente, se o SUS reembolsar a alimentação oral suplementar, os custos vão ser mais altos. Mas no custo efetivo, isso é um investimento. Se percebermos que os pacientes estão usando menos recursos ou ficando menos tempo internado, esse custo se paga" ressalta.
O decisão final da Comissão depende de um consulta pública que está sendo feita, para que os técnicos reavaliem o pedido. Os profissionais da saúde e os pacientes ou familiares de doentes podem se manifestar têm até o dia 22 de julho neste site da Comissão.
O estado de desnutrição hospitalar é diagnosticado por meio de critérios subjetivos e objetivos dos médicos, que avaliam perda de peso sem intencão, de força, de massa muscular, falta de apetite e sinais ósseos aparentes.
As causas da desnutrição são multifatorial, mas na maioria dos casos está relacionada com a doença de base, explica a médica. "Os pacientes internam com doenças que são mais inflamatórias e geram perda de apetite, têm longos tempos de jejum para fazer exames e já vai desnutrindo ainda mais. Além dos sintomas digestivos como náuseas, diarreias", observa Melina Castro.