Movimento pede liberdade para as espinhas, mas médicos desaprovam
Dermatologistas afirmam que acne é uma doença e deve ser tratada, mas reconhecem a importância do movimento para promover a autoaceitação
Saúde|Giovanna Borielo, do R7*
Depois de ser rejeitada por agências que a mandavam “limpar a pele” e sofrer de depressão por causa da acne, a modelo britânica Louisa Northcote, 21, deu início ao movimento "liberdade para as espinhas" (#freethepimple).
Finalista de um reality show para modelos, ela abriu o debate sobre a questão nas redes sociais com o intuito de promover a autoaceitação entre as pessoas que sofrem do mesmo problema, estimulando a não-dependência da maquiagem.
O movimento motivou outras garotas, modelos ou não, a postarem fotos expondo as marcas e erupções em seus rostos.
Em seu Instagram, Louisa desabafa que estava cansada de tratamentos ineficazes, como uso de antibióticos, cremes faciais, que provocavam descamação da pele e dor, e da Isotrenoína (Roacutan), medicamento com severos efeitos colaterais.
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Mas o movimento "liberdade para as espinhas" é visto com ressalvas pelos dermatologistas. Eles afirmam, que, embora seja uma poderosa ferramenta a favor da autoestima, há uma "incompreensão da gravidade do quadro".
"A acne é uma doença inflamatória da pele e possui níveis de gravidade, podendo gerar complicações. Ela pode ser ainda um sinal de doenças internas, como a síndrome do ovário policístico, um aumento do tamanho dos ovários com pequenos cistos em sua área externa. É importante não confundir as doenças e tratar como mera questão de aceitação”, afirma a dermatologista Tatiana Gabbi, da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD).
A dermatologista Ursula Metelmann, também da SBD, diz que concorda com o "movimento liberdade para as espinhas" em partes. "Como médica, acredito que qualquer doença que tenha tratamento mereça atenção. No caso particular da acne, as lesões podem deixar manchas escuras e cicatrizes. Postergar ou optar por não tratar pode trazer consequências. Porém, também penso que, acne ou qualquer outra doença na pele, não deve ser motivo para querer esconder a qualquer custo, usar quilos de maquiagem, deixar de sair de casa ou se divertir. Neste sentido, assumir suas espinhas e ser feliz faz todo sentido", ressalta.
Há cinco graus de acne. O primeiro é caracterizado apenas por cravos; o segundo é composto por cravos e espinhas; o terceiro apresenta cravos, espinhas e lesões nódulo-císticas, com pus e odor; o quarto, além das características do terceiro, dispõe de lesões doloridas, que geram deformidades; raro e mais grave, o quinto, além de englobar todos os fatores, gera febre e mal-estar. Segundo Tatiana, todas as pessoas têm acne em algum grau.
Ursula afirma que o grau 2 é o mais comum. "O grau da acne é determinado por questões individuais. Ainda não se sabe por que algumas pessoas têm quadros leves e outras, graves. A acne, acima de tudo, é uma questão genética. Há influência dos hormônios na adolescência, mas o que determina se o indivíduo vai ter ou não é a genética. Quando pai e mãe tiveram acne, há chance de 70% de ter acne. Quando só a mãe ou pai tiveram. 50%", explica.
Além dos hormônios da adolescência e de ovários policísticos, problemas na tireoide e alguns medicamentos, como ingestão de Whey Protein e vitamina B12, podem desencadear ou manter a acne, de acordo com Ursula.
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A dermatologista Milena Fortunato, da Sociedade Brasileira de Dermatologia Clínica Cirúrgica (SBDCC), afirma que todos os graus de acne devem ser tratados e que a agressividade do tratamento varia de acordo com o grau. “Pessoas com o grau 1 podem controlar o quadro apenas com sabonetes específicos e filtro solar, mas, em todos os casos, da acne grau 1 ao grau 5, é preciso que os medicamentos sejam prescritos por um dermatologista”, diz.
Entre os principais tratamentos de acne estão medicamentos de uso tópico, ou seja, aplicados na pele diretamente, como o peróxido de benzoila, adapaleno e tretinoína (ácido retinoico), e os tratamentos sistêmicos, que atuam no organismo, como contraceptivos hormonais, isotretinoína (Roacutan) e tetraciclina.
Ela afirma que os tratamentos são prescritos de maneira individual, ou seja, não há padronização para cada grau de acne, sendo definidos de acordo com a pele e hábitos do paciente. É necessário também indicar quais são os medicamentos utilizados e histórico médico para que seja feito o receituário mais adequado.
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Segundo Tatiana, afirmações de que tratamentos para acne oferecem riscos para a saúde da mulher são mito e que casos malsucedidos, como o mencionado pela modelo, ocorrem devido à automedicação.
"Tratamentos feitos com isotretinoína [Roacutan] apresentam efeitos colaterais que são discutidos com o paciente, de forma a avaliar o custo-benefício", afirma. Entre os efeitos colaterais do remédio, está a malformação de fetos.
*Estagiária do R7 sob supervisão de Deborah Giannini