O que é o zolpidem, remédio para insônia que se popularizou nos últimos anos
Droga promete encurtar o tempo que você leva para adormecer, aumentar a duração total do sono e melhorar a qualidade dele; efeito adverso mais perigoso é a parassonia, um tipo de estado de sonambulismo.
Saúde|Fernando Mellis, do R7
Desenvolvido na década de 1980, o zolpidem tornou-se nos últimos anos um medicamento substituto dos benzodiazepínicos — categoria que inclui Rivotril (clonazepam), Valium (diazepam) e Frontal (alprazolam) — para indivíduos que se queixam de dificuldade para dormir.
Trata-se de um fármaco sedativo-hipnótico que começou a ser vendido nos Estados Unidos em 1993, sob o nome comercial Ambien, após cinco anos de uso na Europa.
No Brasil, o zolpidem foi autorizado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em 2007.
O medicamento de referência é o Stilnox, produzido pela farmacêutica Sanofi. Mais recentemente, surgiram dezenas de genéricos e similares.
O zolpidem faz parte de uma família de drogas chamadas de Z-hipnóticos, que inclui também outros medicamentos, como o zaleplon e a zopiclona.
Eles entram na categoria de não benzodiazepínicos, por não possuírem em suas formulações anéis de benzeno e diazepina fundidos.
Na prática, essa diferença química faz com que as drogas Z tenham uma particularidade na indução ao sono.
Os benzodiazepínicos causam sonolência, mas também têm propriedades ansiolíticas, relaxantes musculares e anticonvulsivantes, que costumam fazer com que as pessoas acordem grogues pela manhã.
Rivotril, Valium, Frontal e outros, na verdade, são ansiolíticos e não devem ser usados para induzir ao sono. São remédios que se destinam ao alívio de crises agudas de ansiedade ou, em alguns casos, para convulsões.
No caso dos Z-hipnóticos, mantém-se a indução ao sono com quase nenhuma das outras três características dos benzodiazepínicos.
O zolpidem, particularmente, tornou-se popular por fazer a pessoa dormir rapidamente sem causar sonolência no dia seguinte, desde que ela durma ininterruptamente de sete a oito horas. Seu efeito adverso mais perigoso é a parassonia — o indivíduo entra em um estado de sonambulismo.
De acordo com as bulas aprovadas pela Anvisa, o zolpidem "é destinado ao tratamento da insônia (dificuldade para dormir), que pode ser ocasional (eventual), transitória (passageira) ou crônica (que dura há muito tempo)".
Como funciona
O zolpidem atua em áreas do cérebro responsáveis pelo sono. O comprimido ingerido costuma agir dentro de uma hora, mas há versões sublinguais que podem fazer com que a pessoa adormeça ainda mais rápido.
O medicamento promete encurtar o tempo que você leva para pegar no sono, reduzir o número de despertares noturnos, aumentar a duração total do sono e melhorar a qualidade dele.
As apresentações são em comprimidos de 10 mg e de 12,5 mg. Também há versões sublinguais de 5 mg e 10 mg, além de uma versão de 6,25 mg de liberação prolongada, indicada para quem desperta muito durante a noite.
Apenas versões acima de 10 mg, como é o caso do Stilnox de 12,5 mg, são de tarja preta. Todas as demais são em caixas com tarja vermelha e podem ser vendidas mediante apresentação de receita branca em duas vias, que não requerem notificação de receita (uma espécie de boleto de cor azul).
Contraindicações
O NHS (Serviço Nacional de Saúde) do Reino Unido recomenda aos seguintes pacientes que tenham cautela, além de acompanhamento médico, ao tomar zolpidem:
• doentes renais ou hepáticos;
• pessoas diagnosticadas com miastenia grave (doença que causa fraqueza muscular);
• indivíduos que sofrem de apneia do sono;
• pessoas com algum transtorno mental;
• histórico de abuso de álcool ou drogas; e
• quem esteja tentando engravidar, gestante ou lactante.
Além disso, a bula sugere "acompanhamento mais estrito" de idosos que estejam fazendo uso da medicação, devido à possibilidade de apresentarem sensibilidade maior.
Efeitos adversos
O zolpidem pode causar alguns problemas imediatos em certas pessoas, incluindo sonolência no dia seguinte, sobretudo em quem não consegue ter uma noite completa de sono ou associa o medicamento a álcool ou outro depressor do sistema nervoso central.
O risco, nesse caso, envolve a capacidade de dirigir veículos ou operar máquinas, havendo possibilidade de acidentes. No caso dos idosos, por exemplo, existe mais risco de quedas.
Porém, o efeito adverso mais perigoso do zolpidem é a parassonia — o indivíduo entra em um estado de sonambulismo.
Esse efeito adverso é objeto de vários relatos nas redes socais de pessoas que tomaram o medicamento, não dormiram e fizeram coisas das quais não se lembravam no dia seguinte. Há histórias de compras online, gente que limpa a casa, faz comida, envia mensagens a amigos e parentes...
Para especialistas, o sonambulismo causado pelo zolpidem é um perigo e deve ser objeto de discussão com o médico que prescreveu o medicamento.
"Naquele momento de sonambulismo, existe o risco de suicídio, de machucar outra pessoa, de uma série de acidentes", alerta a neurologista Dalva Poyares, professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e integrante do corpo clínico do Instituto do Sono.
Período de uso
O período de uso do zolpidem deve ser o menor possível, afirma a neurologista Giuliana Macedo Mendes, presidente da Regional Centro-Oeste da ABS (Associação Brasileira do Sono).
"[É possível] você usar uma medicação em uma insônia pontual ou circunstancial, aquela insônia que pode acontecer mediante a um sofrimento agudo. Então, é um paciente que perdeu um ente querido, que ficou desempregado, teve uma separação... Algum estresse agudo na vida emocional pode gerar dificuldade para dormir. Isso não é transtorno de insônia", explica.
A própria bula do zolpidem diz que "o uso prolongado do zolpidem não é recomendado e a duração do tratamento, assim como com todos os hipnóticos, não deve ultrapassar quatro semanas".
Segundo Giuliana, muitos médicos das mais diversas especialidades costumam prescrever o zolpidem assim que surge a primeira queixa de que a pessoa tem dificuldade para dormir.
Ela salienta que o tratamento para insônia é baseado em mudanças comportamentais, algo também reforçado em um artigo escrito por pesquisadores dos EUA e disponível na Biblioteca Nacional de Medicina.
"O zolpidem não é recomendado para a população em geral como tratamento de primeira linha devido ao seu alto potencial de abuso", afirmam os autores.
A retirada em casos em que o paciente já toma o zolpidem há bastante tempo deve ser feita sob supervisão médica.
"A interrupção abrupta de um tratamento com hipnóticos em posologia e duração acima das recomendadas pode provocar insônia de rebote transitória (reaparecimento de insônia às vezes mais grave do que aquela que motivou o tratamento) e pode também causar outros sintomas (alterações do humor, ansiedade, agitação). Portanto, a posologia deve ser reduzida gradualmente, e o paciente deve ser informado", diz a bula do zolpidem.