O que pode acontecer com homem que tomou 4 doses de vacinas?
Empresário de Viçosa tomou duas doses de CoronaVac, uma de AstraZeneca e uma de Pfizer; efeitos podem ser graves
Saúde|Carla Canteras, do R7
No meio à escassez de vacinas contra a covid-19, nesta semana, o empresário e professor aposentado José Lúcio dos Santos, de 61 anos, é acusado pela prefeitura de Viçosa, cidade a 230 km de Belo Horizonte, de tomar quatro doses de imunizantes, de três produtores diferentes. Agora, o Ministério Público analisa o caso para determinar uma possível punição para ele. Mas, quais podem ser as reações no corpo após essa mistura? Especialistas ouvidos pelo R7 explicam.
Ele recebeu duas doses da CoronaVac, em Minas Gerais, uma da AstraZeneca, no Rio de Janeiro, e a última da Pfizer, de volta a Minas. Os imunizantes produzidos pelo Butantan foram os primeiros aplicados e as duas doses foram recebidas no intervalo indicado pelos produtores, de 28 dias. Dois meses depois e sem necessidade, ele recebeu a AstraZeneca e oito dias após, recebeu a Pfizer.
Para o virologista Flavio Guimarães Fonseca, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e presidente da SBV (Sociedade Brasileira de Virologia), a ação dele foi equivocada. "Ele fez tudo errado. Primeiro, não sabemos se há sinergia imunológica usando a CoronaVac e AstraZeneca ou Pfizer, porque a estrutura antigênica é diferente. Enquanto uma é de vírus atenuado, então, têm várias proteínas de vírus, inclusive a S. As outras, tanto a Pfizer quanto a AstraZeneca, produzem no organismo apenas a proteína S", explica Fonseca.
"É difícil dizer a miscelânia que pode acontecer no corpo dele. Como ainda não se detectou se essas vacinas podem apresentar efeitos colaterais graves frequentes após um período da imunização, os efeitos relatados são nos dias logo após vacinação. Eu acho que para a saúde dele não consigo enxergar um problema mais grave", completa.
Já a infectologista da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Raquel Stuchi, alerta que não se sabe os efeitos que podem acontecer na mistura de vacinas com tecnologias diferentes. "Em vez de ter uma proteção maior, ele pode estar procurando reações que conheceremos agora, que podem levar uma resposta do organismo, em relação à imunidade, exacerbada, fora de controle, e reações que podem ser graves por tantos estímulos repetidos. Podem trazer reações graves, não só as tromboses, mas alguma célula do organismo dele estimulada pode afetar o próprio organismo", diz ela.
A diretora da Sbim (Sociedade Brasileira de Imunizações), Flávia Bravo, ainda, acrescenta: "Ele estimulou o organismo com antígenos e, no final, não saberemos se ele terá algum ganho ou prejuízo. Ele está mexendo com o sistema imune e não sabemos se ele tem alguma comorbidade, se tem alguma propensão a ter doenças autoimunes", observa Bravo.
O aposentado tem de ser acompanhado para verificar quais reações mais graves ele pode apresentar. Com relação às questões éticas, os três especialistas reprovam a ação de José Lúcio dos Santos.
"Na minha opinião, é uma pessoa sem ética nenhuma e sem conceito de cidadão nenhum, porque essas vacinas extras estão tirando as vacinas de outras pessoas. Isso não poderia ter acontecido e nem sei como ele conseguiu fazer", diz Flávia.
Raquel concorda: "É absolutamente antiético o que esse senhor fez."
"O ponto central é que ele desperdiçou duas doses de vacina. Porque não haveria necessidade de tomar tanta vacina, porque o ganho de resposta imune com esse uso é irrelevante", completa Fonseca.