Teimosia pode acabar com o casamento e é quase impossível de ser tratada

Cabeça dura, inflexível, teimoso. Qual família não tem alguém com essas características dentro de casa? Só que o que pode parecer apenas uma mania é, na verdade, muito mais do que isso. A teimosia é um traço de personalidade que, segundo os psicólogos, tem tratamento, sim, mas só depois de muito trabalho no consultório e ajuda de quem convive com o paciente.

E esta é talvez a parte mais complicada do processo. Por não reconhecerem que têm um problema, os teimosos precisam que aqueles que estão próximos a ele sinalizem que há uma questão a ser resolvida, o que, muitas vezes, pode demorar a acontecer, já que é aos familiares e amigos que as pessoas intransigentes mais causam sofrimento no dia-a-dia.

Teimosa é aquela pessoa com ideias muito rígidas, com posições muito firmes a respeito de tudo, e que, por isso, tem dificuldade em ouvir quem está ao seu lado. Para o psicólogo Alexandre Bez, o nascimento desta característica tem origem na infância.

— O que faz alguém ser assim é o tipo de criação que ele teve em relação à formação de ser caráter na vertente rigidez. Provavelmente foi uma criança com educação muito rígida, o que acabou modelando um comportamento, uma estrutura de atitudes e ações desta maneira. Foi alguém que teve que obedecer a regras estritas, sem qualquer possibilidade de flexibilização.

O resultado é alguém que entende que, ao se levar em conta ideias de outras pessoas além das suas, seu pensamento se desorganizará de tal maneira que seu objetivo jamais poderá ser alcançado, de acordo com o que explica a coordenadora do curso de psicologia da Universidade Cruzeiro do Sul, Simone Domingues.

— Ela já imagina como vai chegar naquele objetivo, o caminho que precisa fazer, já tem tudo traçado. Por isso, não ouve mais ninguém, não consegue avaliar outros pensamentos, outras ideias.

E, mesmo que siga firme em suas ideias, sem levar em consideração as sugestões de qualquer outra pessoa, e ainda assim não consiga o sucesso que desejava e previa, o teimoso não consegue admitir que a responsabilidade pelo fracasso é apenas sua.

— Quando não dá certo, ela culpa os outros. Ela nunca tem culpa. Não é porque a estratégia dela não estava correta, mas porque um fator externo atrapalhou tudo.

Simone explica que não é só a rigidez que comanda o teimoso, mas também o medo do novo. E, tanto para ela quanto para Alexandre Bez, pessoas inflexíveis geralmente também apresentam traços de autoritarismo.

Bez aponta que a teimosia remete a uma percepção de soberania.

— Há ali uma questão de egocentrismo acentuado. A pessoa trava naquilo e não aceita de jeito nenhum que sua opinião seja contrariada. Ela é superior a tudo. São pessoas que se refugiam no seu próprio mundo porque são donos da verdade. Isso revela uma pobreza intelectual muito grande, porque a pessoa teimosa não é humilde.

Um bom exemplo disto é o personagem Ramsés, da novela Os Dez Mandamentos, da Rede Record, vivido pelo ator Sergio Marone. Na trama, o faraó, que não cede ao pedido de Moisés para que ele liberte o povo hebreu da escravidão, sofre dez terríveis pragas como consequência, incluindo a morte de seu próprio filho, e nem assim modifica seu pensamento.

Para Marone, obviamente trata-se de um comportamento que abrange um largo contexto e obedece a elementos variados de pensamento, mas o ator acredita que, entre eles, esteja também a teimosia.

— Estamos falando de uma história fantástica, em que este personagem foi criado acreditando nos deuses dele, então há o ponto da fé, da crença, e não apenas a teimosia. Mas, sim, ele não dá ouvidos às outras pessoas que tentam alertá-lo, não deu até agora. Acho que ele só vai ter essa consciência no final de sua participação na novela.

No caso de Ramsés, surge algo também bem comum em teimosos, que é o poder.

Simone Domingues explica que indivíduos inflexíveis podem procurar ocupar posições boas no trabalho, que permitam que eles sejam sempre aceitos e nunca contraditos.

— Quando o teimoso é confrontado, ele sente muita raiva. Dependendo da posição de poder que ocupa, seja no trabalho ou na própria família, ele pode ficar agressivo ou, simplesmente, não querer mais contato com aquela pessoa e passar a ignorá-la. Por isso, vai sempre tentar conviver com pessoas que aceitem sempre seu ponto de vista.

E a convivência é o ponto mais complicado. Bez avalia que relacionamentos amorosos com pessoas extremamente rígidas e teimosas tendem, infelizmente, ao naufrágio.

— Quando se fala em teimosia, se falando em ponderação. Se não houver ponderação, não tem relacionamento. Relacionamentos significam ser maleável na questão do gosto e na questão de respeito, você tem que ter isso. E, como em um caráter rígido não entra ponderação, a relação vira unicamente ditatorial. É composta de um desejo unilateral, onde não entra o desejo do outro. Não existe bilateralidade relacional. E por isso a relação acaba.

Outro prejuízo de personalidades como esta são, para o psicólogo, transtornos de aprendizagem e intelectualidade empobrecida, já que o teimoso não se permite dividir nem compartilhar informações. Para Bez, a pessoa inflexível “já sabe de tudo”.

Mesmo com resultados tão complexos, Simone e Bez esclarecem que os teimosos não sofrem por serem do jeito que são. Por terem um ego elevado, não enxergariam o próprio problema — e, sem reconhecer que há algo a ser tratado, não existe como resolver a questão.

Ainda assim, Simone acredita que haja uma luz no fim do túnel.

— Para tudo no ser humano temos condição de um prognóstico positivo. Mas, para que esta pessoa possa aprender e começar a ouvir os outros, ela vai ter que se abrir para isso. Vai ter que ter alguém que insista em ajudar. E digo insistir porque são pessoas que não ouvem, já que são sempre melhores. É alguém com dificuldades em ter relacionamentos sociais, não tem muita empatia por nada, então tudo fica mais difícil para ela. Por isso, é preciso ter alguém que tolere isso e ajude, mostrando os resultados da sua inflexibilidade.

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