Você se sente triste e cansado em época de frio? Pode ser depressão sazonal; entenda
Especialistas explicam como a estações mais frias podem impactar a saúde mental a ponto de desencadear um quadro depressivo
Saúde|Hysa Conrado, do R7
Nos dias frios, a vontade de ficar um pouco mais na cama, acompanhada da falta de energia para realizar as atividades cotidianas e uma tristeza sem motivo... Essas sensações podem não representar um comprometimento da saúde mental se aparecerem vez ou outra, mas, e se persistirem?
Caso se estendam por pelo menos duas semanas durante as estações mais frias, como outono e inverno, esses sintomas podem caracterizar um quadro de depressão sazonal, transtorno reconhecido pela psiquiatria que pode impactar diretamente a qualidade de vida das pessoas, segundo o neuropsiquiatra Marco Abud, fundador do canal Saúde da Mente no YouTube.
“É normal nos sentirmos menos animados, às vezes até mais tristes, querendo ficar mais isolados quando o inverno chega. Algumas pessoas são mais sensíveis que outras às alterações de clima, e para algumas a queda de humor pode vir junto com uma diminuição importante de energia, com aumento de horas de sono, com excesso de apetite e com dificuldades importantes de memória e de concentração”, explica o especialista.
Mas como o frio afeta a saúde mental?
A condição está diretamente associada a uma menor exposição à luz solar, o que desencadeia alterações fisiológicas importantes.
Abud explica que os olhos têm células nas retinas que funcionam como sensores de luz e que desempenham papel significativo na liberação de serotonina, neurotransmissor conhecido como o hormônio da felicidade.
“Quando existe esse estímulo da luz solar, os receptores da retina ativam o hipotálamo, que é uma parte do cérebro que ajuda a controlar o nosso relógio biológico e o nosso ritmo circadiano. Quando estamos no outono e no inverno, existe uma diminuição da luminosidade durante o dia, e isso faz com que a produção de serotonina seja reduzida e aumente a produção de melatonina, o hormônio do sono”, ressalta o neuropsiquiatra.
Apesar de a depressão sazonal ser mais comum em regiões que enfrentam inverno mais rigoroso e dias mais curtos nesse período, a forma como as pessoas costumam se comportar nas estações mais frias também pode ser um agravante para o problema, segundo Abud.
“Aqui no Brasil nós temos luz do sol na maior parte do país no ano inteiro, mas por causa do frio temos a tendência de ficar em ambientes mais fechados, com menos contato com a luz do sol. O olho percebe essa luz através de muitas barreiras, como óculos e vidros, mas muitas pessoas acabam deixando as cortinas fechadas e não se expondo o suficiente à luz do sol”, explica.
Segundo o Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos, a depressão sazonal é mais comum especialmente em pessoas com transtorno bipolar associado a episódios depressivos e hipomaníacos recorrentes.
Além disso, as pessoas com essa condição também podem ter comorbidades mentais associadas, como transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtorno alimentar, transtorno de ansiedade ou transtorno do pânico.
O psicólogo Ricardo Milito destaca que o histórico familiar de depressão também pode ser determinante nesses casos, já que a predisposição aliada aos fatores fisiológicos pode contribuir para uma piora da saúde mental.
“Se a pessoa já sabe que tem um histórico familiar, então é importante ficar um pouquinho mais atenta aos sintomas. Praticar atividade física e o cuidado com a alimentação são fundamentais para a saúde mental não só durante o inverno”, ressalta.
Sintomas da depressão sazonal
A falta de energia é um dos primeiros sintomas da depressão sazonal, segundo o neuropsiquiatra Marco Abud, o que pode vir acompanhado de sono excessivo e aumento de apetite, principalmente com preferência por doces e outros carboidratos de alto valor calórico.
“Normalmente as pessoas ficam mais sensíveis a críticas, dormem muito mais horas e, mesmo assim, se sentem sem energia física e começam a se sentir mentalmente lentas. Uma característica importante da depressão sazonal é que as pessoas podem ter dificuldade de recordar informações que acabaram de ser ditas a elas, às vezes elas têm até dificuldade para lembrar de palavras para se comunicar”, destaca o especialista.
O psicólogo Ricardo Milito ressalta que em casos mais graves, em que os sintomas se apresentam de forma mais acentuada, pode ocorrer um comprometimento da capacidade funcional do indivíduo. “Vai ter um impacto no trabalho, na escola, no convívio social e nas tarefas domésticas.”
Tratamento
Mesmo que a depressão sazonal seja caracterizada por quadros em determinados períodos do ano, se não tratada pode piorar ou evoluir para uma condição crônica. Segundo Abud, as estratégias de tratamento vão além do uso de medicações e têm como meta regular o relógio biológico e ajustar os níveis de serotonina e melatonina.
“O primeiro passo é reservar pelo menos meia hora do dia para estar em um ambiente ao ar livre, onde seja possível a exposição à luz do sol de forma direta. O melhor momento para fazer isso é entre 9 e 11 horas da manhã, porque esse é um horário em que, na maioria das pessoas, existe uma otimização da produção de melatonina, que tende a ser convertida em serotonina mediante a exposição à luz do sol”, explica o neuropsiquiatra.
Vale destacar que, caso não seja possível nesse horário específico, qualquer momento de contato com a luminosidade solar é bem-vindo, seja em uma caminhada ao ar livre, seja na saída para comer fora, ou mesmo encontrar um cantinho dentro de casa onde o sol consiga refletir a luz com mais amplitude e reservar aquele espaço para fazer alguma atividade, como ler um livro ou apenas receber a claridade.
“Se for possível caminhar ou ter contato com uma vegetação é muito importante, porque as cores da natureza também estimulam a liberação de serotonina, noradrenalina e de dopamina. Isso leva a uma melhora da concentração e da energia, além de diminuir a sensação de mau humor e de irritabilidade”, ressalta Abud.
Para quem trabalha em casa, a dica do neuropsiquiatra é organizar um espaço de home office em que a recepção da luz do sol seja constante, com a possibilidade de a luminosidade incidir sobre a retina com mais frequência.
“Atividades ao ar livre, principalmente quando existe luminosidade, são fundamentais para todo ser humano conseguir manter os níveis de energia, de disposição e de concentração”, destaca o especialista. O acompanhamento de um profissional da saúde especializado também é fundamental.