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Tecnologia e Ciência

‘Cocaína dos mares’: como uma comida de luxo pode destruir o ecossistema marinho

A crescente demanda pela ‘bexiga natatória’ está ameaçando espécies e comunidades em regiões remotas, e especialistas alertam para um ciclo de devastação ambiental

Tecnologia e Ciência|André Naef, do R7

A bexiga natatória é utilizada em comidas com um custo muito alto devido a dificuldade da pesca e preparo Reprodução/X/@fpexport6Angel

De acordo com uma reportagem da revista Nature, a luxuosa iguaria conhecida como “bexiga natatória” ou “fish maw” como é conhecida mundialmente, amplamente consumida como símbolo de status e usada na medicina tradicional em algumas culturas asiáticas, está causando uma crise ecológica em regiões vulneráveis, especialmente no sul da Papua Nova Guiné.

A bexiga natatória é um órgão interno presente na maioria dos peixes ósseos, e é responsável por ajudar esses animais a controlar sua flutuabilidade na água. Funcionando quase que como um “balão” interno, a bexiga permite que o peixe ajuste a quantidade de gás no órgão, para subir ou descer na água sem gastar muita energia.

Em pouco tempo, a caça por esse órgão transformou a economia local da Papua Nova Guiné e de países próximos. Pescadores trocaram suas tradicionais canoas e anzóis por barcos motorizados e redes comerciais, impulsionados pelo alto valor da bexiga natatória, que pode alcançar preços de até R$ 89.100 por quilo. Essa escalada de preços fez com que o fish maw fosse apelidado de “cocaína dos mares”, devido à sua lucratividade, atraindo até o interesse de redes criminosas organizadas.

Para as comunidades locais, os lucros da pesca de fish maw representaram uma mudança exponencial, trazendo recursos que permitiram aos moradores se afastarem de áreas costeiras ameaçadas pelo aumento do nível do mar e construir novas, e melhores, moradias. No entanto, o uso de redes de pesca indiscriminadas, fornecidas por empresas do setor, tem causado impactos devastadores na biodiversidade local. Essas redes capturam todos os tipos de animais presentes no ecossistema, incluindo espécies que não possuem a bexiga natatória, como golfinhos, tartarugas e até tubarões, muitos deles classificados como vulneráveis ou em perigo crítico de extinção.


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Regulamentação

A necessidade de monitoramento e regulamentação tem se tornado cada vez mais evidente com a submissão de um relatório por pesquisadores ao SPREP (Programa de Meio Ambiente Regional do Pacífico) em 2022. Apesar das preocupações, as discussões sobre a sustentabilidade da pesca ainda são delicadas, pois o comércio de fish maw é uma das principais fontes de renda para essas comunidades. Apesar de muitos pescadores locais já estarem cientes sobre os problemas ambientais causados, eles ainda dependem do comércio da bexiga natatória para sobreviverem.

A ausência de regulamentação específica sobre a comercialização de fish maw tem dificultado o controle e a preservação de espécies marinhas. Hong Kong, epicentro do comércio global da bexiga natatória, só começou a registrar os dados de forma independente em 2015. Desde então, as importações de bexiga natatória alcançam milhares de toneladas anualmente, trazendo um alerta para o impacto devastador dessa indústria. Pesquisadores defendem que uma padronização global de monitoramento poderia beneficiar tanto as comunidades locais quanto a biodiversidade.

Embora o comércio de bexiga natatória tenha aliviado problemas financeiros imediatos em áreas com menos com poucos recursos, especialistas ressaltam que o modelo atual de pesca predatória, sem gestão ambiental, ameaça transformar esses locais em zonas de colapso ecológico o que, eventualmente, poderá afetar a população em uma escala global.

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