Como é usar o Vision Pro, óculos de realidade aumentada da Apple que custam R$ 17 mil
Dispositivo caríssimo ainda não tem utilidade clara e tentará desbravar mercado em que concorrentes não alcançaram sucesso
Tecnologia e Ciência|Brian X. Chen, do The New York Times
Na semana passada, tive a oportunidade de testar a visão da Apple para o futuro da computação. Durante cerca de meia hora, usei o Vision Pro, de 3.500 dólares (cerca de R$ 17 mil), os primeiros óculos de alta tecnologia da empresa, que serão lançados no ano que vem.
Saí com sentimentos contraditórios, incluindo um ceticismo incômodo. Por um lado, fiquei impressionado com a qualidade do aparelho, que a Apple classifica como o início de uma era de "computação espacial", na qual dados digitais se misturam ao mundo físico para criar recursos. Imagine usar óculos especiais para montar móveis, com as instruções projetadas digitalmente nas peças, por exemplo, ou preparar um prato enquanto a receita é exibida no canto do seu campo de visão.
O dispositivo da Apple tem vídeo de alta resolução, controles intuitivos e um ajuste confortável, parecendo superior às minhas experiências com os headsets produzidos na década passada pela Meta, pela Magic Leap, pela Sony e por outras empresas.
Mas, depois de usá-lo para ver fotos e interagir com um dinossauro virtual, também senti que não havia muita novidade. A experiência também provocou certo desconforto que eu nunca tive com um produto da Apple. Mais sobre isso adiante.
Ajuste e controle
Vamos começar pelo princípio. Depois que a Apple apresentou o dispositivo, na semana passada, seu primeiro grande lançamento desde o Apple Watch, em 2015, pude experimentar o modelo de pré-produção do Vision Pro. A equipe me levou a uma sala privada na sede da empresa, no Vale do Silício, para uma demonstração.
O Vision Pro, que se parece com óculos de esqui, tem um cabo USB branco que se conecta a uma bateria prateada que guardei no bolso da calça. Para colocá-lo no rosto, virei um botão na lateral do aparelho para um ajuste e prendi uma alça de velcro no topo da cabeça.
Apertei um botão de metal do dispositivo para ligá-lo. Em seguida, passei por um processo de configuração, que se resumia a mirar um ponto em movimento para que os óculos pudessem acompanhar o olhar.
O Vision Pro tem uma série de sensores para rastrear os movimentos dos olhos, os gestos das mãos e os comandos de voz, que são as principais maneiras de controlá-lo. Olhar para um ícone equivale a passar o cursor do mouse sobre ele; para apertar um botão, basta tocar os dedos polegar e indicador juntos, que é equivalente ao clique no mouse.
Muitos usos?
Então chegou a hora de o aplicativo demonstrar como o dispositivo pode enriquecer nosso dia a dia e nos ajudar a nos conectar uns com os outros.
A Apple primeiro me mostrou fotos e um vídeo de uma festa de aniversário no headset. Eu poderia girar um botão do Vision Pro no sentido anti-horário para deixar o fundo das fotos mais transparente e ver o mundo real, incluindo os funcionários ao meu redor, ou girá-lo no sentido horário para tornar a foto mais opaca e aumentar a imersão.
Depois, pediu que eu abrisse um aplicativo de meditação que mostrava animações 3D enquanto uma música suave tocava e uma voz me instruía a respirar. Mas a meditação não me preparou para o que estava por vir: uma chamada de vídeo.
Uma pequena janela apareceu — uma notificação de uma chamada do FaceTime vinda de uma funcionária da Apple que usava outro dispositivo. Olhei para o botão de resposta para atender à chamada. Ela estava usando uma "persona", um avatar 3D animado de si mesma que o headset criou escaneando seu rosto. A Apple considera que a videoconferência com personas é uma forma mais íntima de comunicação e colaboração no espaço virtual.
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As expressões faciais da funcionária da Apple pareciam realistas, e seus movimentos labiais estavam sincronizados com sua fala. Mas, por causa da maneira como seu avatar foi renderizado digitalmente, com a textura uniforme de seu rosto e a falta de sombras, o resultado me pareceu falso. Parecia um holograma que eu já tinha visto em filmes de ficção científica como Minority Report.
Na sessão do FaceTime, a funcionária e eu deveríamos colaborar na criação de um modelo 3D em um aplicativo chamado Freeform. Mas eu olhava para ele fixamente, pensando no que estava vendo.
Depois de três anos praticamente isolado durante a pandemia, a Apple queria que eu me envolvesse com o que era essencialmente um vídeo deepfake de uma pessoa real. Eu podia sentir que estava me fechando. Minha sensação de desconforto foi provavelmente o que os tecnólogos há muito descrevem como "vale da estranheza": a sensação desagradável quando alguém vê uma criação de máquina que parece humana demais.
Um feito tecnológico? Sim. Um recurso que eu realmente gostaria de usar com outras pessoas todo dia? Provavelmente não tão cedo.
Pessoas reais
Depois da demonstração, processei a experiência no trânsito, durante a hora do rush.
Ao longo do jantar, conversei com minha esposa sobre o Vision Pro. Disse a ela que os óculos da Apple pareciam melhores que os dos concorrentes. Mas não tinha certeza se isso era importante.
Outros headsets da Meta e do Sony PlayStation eram bem mais baratos e já bastante potentes e divertidos, sobretudo para jogar videogame. Mas sempre que recebíamos amigos para jantar e eles experimentavam os óculos, perdiam o interesse em menos de meia hora, porque a experiência era exaustiva e eles se sentiam socialmente desconectados do grupo.
Adiantaria alguma coisa se esse amigo girasse o mostrador na frente do headset para ver o mundo real enquanto o usava? Acho que continuaria a se sentir isolado, porque provavelmente seria a única pessoa na sala usando um.
Mais importante para mim, no entanto, foi a ideia de me conectar com outras pessoas, incluindo familiares e colegas, por meio do Vision Pro.
Eu disse à minha esposa: "Sua mãe está ficando velha. Quando está falando com ela pelo FaceTiming, você acha melhor ver seu avatar digital deepfake ou uma chamada de vídeo em que ela segura a câmera muito perto do rosto em um ângulo pouco lisonjeiro?".
"A última. Isso é real. Embora eu prefira vê-la pessoalmente", respondeu ela, sem hesitar.
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c. 2023 The New York Times Company