Dinheiro programável: como o Real Digital mudará o ecossistema de negócios
Real "tokenizado" e smart contracts deverão, em breve, fazer parte da rotina dos brasileiros
Tecnologia e Ciência|Do R7 Conteúdo e Marca
Se você é conhecedor ou gosta das novidades em tecnologia e ainda não parou para entender o que significa a introdução do Real Digital na economia, espero que este artigo possa te convencer sobre a necessidade de estar atualizado neste assunto. Temas como blockchain, criptoativos, criptomoedas e tokens já deixaram de ser novidades como conceito.
Porém, silenciosamente, estão cada vez mais sendo utilizadas em ambientes de negócios, muito além do que a mera compra de bitcoins em casas digitais especializadas. Todos eles, no entanto, sempre estiveram conectados essencialmente ao mundo privado. Os países em geral vinham se limitando a monitorar com maior ou menor intensidade o impacto dessa tecnologia na sociedade e na economia por meio da regulação.
Nos últimos anos, no entanto, os ventos mudaram. Vários Bancos Centrais no mundo perceberam que, mais do que espectadores, poderiam ser verdadeiros agentes catalizadores de uma nova tecnologia no ecossistema de pagamentos e, por consequência, de negócios. Daí surgiram várias discussões sobre a possível adoção das chamadas Central Bank Digital Currencies ou, simplesmente, CBDC.
Como o próprio nome indica, são “moedas digitais” emitidas pelos próprios Bancos Centrais, dentro do ambiente blockchain, com todas as características e funcionalidades típicas que esse tipo de tecnologia pode oferecer.
Mas se, no caso brasileiro, já temos contas digitais e o dinheiro físico está cada vez mais escasso nos grandes centros, a pergunta óbvia é: qual a vantagem ou grande mudança que uma CBDC (leia-se Real Digital) poderia trazer no ecossistema de negócios?
A resposta certamente peca pela simplicidade (já que a estrutura e organização de uma CBDC são bastante complexas), mas pode dar uma dimensão clara de que se trata de algo novo e que vai navegar em oceanos desconhecidos: o dinheiro vai passar a ser programável.
No ambiente blockchain, os ativos virtuais são transacionáveis automaticamente por meio dos smart contracts (ou contratos inteligentes). Programa-se previamente quais as consequências de determinado comando que, uma vez verificado, é implementado e devidamente registrado na rede de modo permanente.
O que os Bancos Centrais enxergaram é que um sistema oficial de pagamentos em ambiente blockchain pode lidar não somente com o fluxo financeiro, mas também com a programação de transações (negócios) de forma automática e reconhecida pelo Estado.
Atualmente, por mais que estejamos em ambientes digitais de alta sofisticação, pagamento e transação não se comunicam. Vivem em ambientes separados e dependem de uma segunda checagem, automática ou manual, para que as partes possam reconhecer a ocorrência do pagamento e determinar o fechamento da operação. O Real Digital promete acabar com esse gap.
São inúmeros os exemplos de modernização do ambiente de negócios e os melhores podem ser encontrados no lift challenge, edição especial do LIFT (Laboratório de Inovações Financeiras e Tecnológicas) realizado pela Fenasbac, em parceria com o Banco Central do Brasil (BCB) e que reúne participantes do mercado interessados em desenvolver um produto minimamente viável (MVP) envolvendo o Real Digital. Várias empresas apresentaram projetos que estão sendo analisados pelo BCB, dentre os quais citamos:
• Conversão para o formato digital (“tokenização”) do direito de propriedade de veículos e imóveis e sua negociação, mediante o método de pagamento contra entrega (DvP), no qual o pagamento pelo bem (casa ou automóvel) ocorre no mesmo instante em que seu direito de propriedade é transferido para o comprador;
• Sistema de pagamentos e transferências baseado no Real Digital que pode fazer transações mesmo quando pagador e recebedor estiverem sem acesso à internet (pagamentos dual offline);
• Solução de entrega de encomendas de comércio eletrônico por meio de uma rede de armários programáveis baseada na internet das coisas (IoT), oferecendo uma solução de logística, no qual diferentes plataformas de e-commerce poderão ter acesso a pontos seguros de entrega;
• Facilitar pagamentos e transferências internacionais entre Brasil e Colômbia por meio do uso de método de pagamento contra pagamento (PvP), em que detentores de moedas diferentes – no caso, o Real e o Peso Colombiano – podem trocar essas moedas entre si, e a entrega da moeda para cada um dos envolvidos acontece simultaneamente.
O BCB vem sinalizando que o Real Digital, após sua emissão, será apenas circulável entre Instituições Financeiras e Instituições de Pagamento. Por sua vez, essas instituições criarão unidades de Real “tokenizado”, lastreados em unidades de Real Digital. É no Real “tokenizado” que os diferentes agentes poderão desenvolver as inovações cujos exemplos acima servem apenas de degustação.
Ainda é cedo para saber a extensão desse evento na economia e nos negócios. Mas é impossível ficar indiferente às oportunidades que o Real Digital poderá trazer. Novidades deverão vir em breve a partir dos resultados do projeto piloto que o BCB está desenvolvendo.
Para mais informações sobre o tema, conheça as práticas de Bancos e Serviços financeiros e Criptoativos do Mattos Filho.