Greenpeace sobre reserva: governo prefere falar com os empresários
Gestão Temer extinguiu área nacional para liberar extração de minérios
Brasil|Diego Junqueira, do R7
O governo do presidente Michel Temer prefere negociar com empresários ao invés de falar com a população. Essa é a avaliação do diretor de campanhas do Greenpeace Brasil, Nilo D’Avila, sobre a extinção da Reserva Nacional do Cobre e Associados, a Renca.
O território de mais de 4 milhões de hectares foi extinto no último dia 23 por decreto presidencial, que também liberou a área para a mineração.
A decisão do governo pegou ambientalistas e pesquisadores de surpresa, que alertam para o risco da alta do desmatamento na região. Mas o ministro de Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho Filho, já tinha comunicado os planos do governo a empresários da mineração, em março, durante a maior feira do setor no mundo, a PDAC (Prospectors and Developers Association of Canada), realizada neste ano em Toronto, no Canadá.
“É um governo ruralista, com um diálogo travado com a sociedade”, diz o diretor do Greenpeace Brasil.
Após as críticas que recebeu, inclusive de artistas com milhões de seguidores em redes sociais, como a cantora Ivete Sangalo, o governo federal revogou o decreto anterior e publicou um novo texto na segunda-feira (28).
O novo decreto mantém a extinção da Renca e decide que as atividades de pesquisa e mineração não poderão ocorrer em áreas de preservação, reservas ecológicas e territórios indígenas que estejam situadas dentro da reserva nacional, como o Parque Nacional das Montanhas do Tucumaque e as terras indígenas Rio Paru D’Este e Waiãpi, entre outras.
Apesar de parecer um recuo, D’Avila afirma que nada muda com o novo decreto. O risco já está instalado, diz: a migração massiva de garimpeiros para a região.
— Com ou sem a Renca, o Estado brasileiro tem que garantir a proteção das terras indígenas. O que ele fez foi criar uma fofoca de ouro.
Leia a entrevista a seguir:
R7 - De que forma a extinção da Renca piora as condições de proteção na região?
Nilo D’Avila - Cerca de 500 mil hectares (quase 10% da reserva) eram protegidos pela Renca, onde você não podia ter grilagem e nenhum tipo de legalização de terras. De imediato, o fim da Renca, junto com o fim da lei de grilagem, já permite que qualquer um possa grilar uma terra ali, legalizar essa terra. Além disso, o governo falou que vai acabar com a área porque ela é rica em ouro, então você cria uma fofoca de garimpeiros enorme. Não tenho dúvidas de que, antes de qualquer mineração, vamos ver ali muitos problemas de invasão de garimpeiros.
O ministro de Minas e Energia tratou do assunto na maior feira de mineração do mundo, onde comunicou a extinção da Renca a empresários cinco meses antes do decreto. Como você avalia essa postura?
Isso mostra uma incapacidade enorme que esse governo tem de falar com as pessoas. Ele só fala com negociantes. É um governo ruralista, com um diálogo travado com a sociedade e que só sai por aí para negociar as riquezas do País.
A regularização da atividade econômica como inibidor da atividade ilegal é um dos argumentos do decreto. Você concorda?
A fofoca de garimpeiro não tem data e não tem hora. Você tem ali [na região] várias operações [de exploração], com garimpeiros na área da BR-163. O que a gente vai ver, e eu tenho certeza absoluta, é todo mundo procurando a pepita da sorte.
As áreas de proteção ambiental e as reservas indígenas ficarão livres da exploração?
O governo federal já está alterando limites de unidades de conservação. Recentemente mandou uma MP, depois convertida em lei (PLV 04/2017), que altera os limites de unidades de conservação. Essa MP diminuiu os limites da Flona do Jamanxin. Outros interesses apareceram e mexeram na Serra do Cachimbo. Nada impede que os mesmos interesses que fizeram o governo acabar com a Renca “obriguem”, entre aspas, o governo a diminuir as unidades de proteção.
O novo decreto do presidente Temer traz alguma mudança?
Não tem nenhuma mudança. Ele nao está fazendo um grande favor a ninguém. Com ou sem a Renca, o Estado brasileiro tem que garantir a proteção das terras indígenas. O que ele fez foi criar uma fofoca de ouro. O maior temor é que a gente tenha uma migração maciça de garimpeiros para a região.
O governo cita o Projeto Carajás como exemplo de preservação ligado à mineração.
Não acho que esse governo tem condições de planejar nada, nem dialogar com ninguém. Muito mais de fazer uma avaliação de Carajás, que produziu bolsões de pobreza no seu entorno, uma sangrenta história de destruição das florestas que não está resolvido até hoje. Tivemos massacre recentemente em Parauapebas (PA). Então não vejo com um exemplo, nem vejo o governo com condições de garantir nem mudanças nos limites das unidades de conservação, nem invasão de terras indígenas, nem a diminuição de uma invasão garimpeira nem que a exploração mineral seja sustentável.
E você tem uma questão que a gente vai continuar vendendo a Amazônia em pedacinhos. Vai continuar sem agregar valor numa produção minerária brasileira, só exportando, gerando mais desmatamento para produzir minerais que serão processados em outros países.