Facebook concentrou mais de 50% das denúncias de racismo, segundo levantamento
Expectativa é de que manifestações de ódio aumentem com acirramento da disputa eleitoral
Cidades|Ana Cláudia Barros, do R7
O Facebook, rede social em que jovem mineira Maria das Dores Martins recebeu insultos, concentrou 56,6% das denúncias de racismo levadas à SaferNet Brasil no primeiro semestre deste ano. O site também figurou como o primeiro do ranking em 2013, com 55,6%. Em 2014, o segundo lugar foi ocupado pelo Youtube (5,7%) e o terceiro, pelo Twitter (4,7%).
O presidente da SaferNet, Thiago Tavares, enfatiza que o Facebook “nada mais é do que uma grande caixa de ressonância do que ocorre hoje nas ruas”.
Com avaliação semelhante, a integrante do Núcleo de Pesquisas em Psicologia e Informática da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) Luciana Ruffo acrescenta que “tudo que acontece na rede, de uma maneira geral, é reflexo da população, do meio onde vivemos”.
— Não falamos nada que não seja pertencente a nós mesmos.
Na análise dela, a questão do racismo é muito presente nas redes sociais, especialmente no Brasil.
— Existe uma falsa impressão de que na rede social tudo é seguro e de que a pessoa não vai ser identificada. Então, ela acaba revelando, expondo uma questão que já existe, mas que, de alguma forma, é velada [...] Particularmente, não acredito que a internet nos faça ser diferente do que somos. Acho que ela permite que se exponha mais aquilo que acreditamos, porque nos sentimos mais protegidos. É como se a pessoa se sentisse mais segura, porque está dentro de casa e pode falar o que quer. É como se ninguém fosse vê-la.
Denúncias de racismo na internet crescem 81%
Para a psicóloga, a cumplicidade que é possível encontrar na rede também estimula manifestações de discriminação.
— Pessoalmente, não se pode assumir essas coisas [comportamento racista]. Na internet, a pessoa encontra outras que compartilham da mesma ideia que ela, o que faz com que as coisas se nivelem. A partir do momento em que ela encontra grupos ou pessoas que tenham a mesma opinião, é muito mais fácil expressar aquilo que pensa, porque não ela não se sente tão só e tão acuada. Além disso, tem a possibilidade deste pseudoanonimato.
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Disputa eleitoral
Thiago Tavares considera que o acirramento da disputa eleitoral pode promover manifestações de ódio, o que também deve impactar nas estatísticas de racismo da SaferNet referentes ao segundo semestre.
— É fato que a disputa eleitoral acrescenta um novo ingrediente a um debate que já vem acirrado há muito tempo. As redes sociais hoje se tornaram palco da intolerância. As pessoas, muitas vezes, recorrem, não a argumentos para defender as suas ideias, mas sim, à violência. A partir do momento em que a agressão e a violência passam a ser a linguagem predominante nas redes sociais, a linguagem de interação entre os participantes da rede, a violência motivada por questões raciais é mais um elemento nesse contexto de exacerbação de agressões mútuas. Temos visto isso claramente acontecendo.
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Injúria x racismo
O advogado especialista em direito digital, Alexandre Atheniense explica que, do ponto de vista legal, o crime de racismo se manifesta quando o agressor se revela contra uma determinada etnia, de forma genérica, sem atribuir os atos ofensivos a uma pessoa especificamente.
— Quando isso ocorre contra uma determinada pessoa, como foi o caso do goleiro Aranha ou como foi o caso da jovem de Muriaé, trata-se de injúria racial, porque é focado.
Atheniense enfatiza que quem pratica um dos dois crimes no ambiente digital também está sujeito à punição.
— Não há qualquer diferença. O mundo digital é uma extensão do mundo presencial. E há um agravante: o dano na internet é potencializado, embora a legislação não tenha acolhido essa questão como agravante. No meu ponto de vista, deveria.
Ele completa, destacando que o alcance da agressão na rede é maior, o que pode ter repercussão tanto na área penal quanto na área civil.
— Neste caso, a potencialidade do dano vai ser maior no mundo digital. Com isso, a indenização também pode ser maior.
A pena para quem pratica injúria racial é de reclusão de um a três anos e multa. Já a sanção para racismo é de um a três anos de prisão, além de multa. O crime é inafiançável.